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Pedro Henrique Pedreira Campos

O pré-sal e as empresas de engenharia

a produção tem se mostrado altamente satisfatória, contrariando os que consideravam a exploração dessas reservas tecnicamente inviável ou d

Publicado em 20/12/2018
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a produção tem se mostrado altamente satisfatória, contrariando os que consideravam a exploração dessas reservas tecnicamente inviável ou de custo muito elevado. Deu-se o oposto. O petróleo está sendo extraído no pré-sal ao custo aproximado de US$ 7 o barril, sendo que os preços internacionais atualmente giram em torno de US$ 80, o que torna a sua exploração altamente rentável para as empresas envolvidas. Hoje, 54% produção brasileira de petróleo é originária da camada pré-sal. De acordo com a Agência Nacional do Petróleo, a produção nacional de óleo era de 1,83 milhão de barris diários em 2007 e alcançou o índice de 3,23 milhões em março de 2018, havendo a expectativa de que, em 2035, alcance os 6 milhões de barris/dia [1].

A descoberta das reservas do pré-sal, no final de 2006, poderia ser um mecanismo para gerar recursos para a melhora das condições de vida da população brasileira e ampliação da apropriação da renda petroleira na economia nacional, criando uma cadeia produtiva no país, com geração de empregos e domínio tecnológico. Políticas como a do conteúdo nacional e o regime de partilha, que definia a Petrobrás como operadora exclusiva do pré-sal, permitiam que a empresa liderasse os consórcios exploradores e indicasse os fornecedores, nacionalizando os serviços e a indústria de equipamentos para exploração do petróleo. No entanto, não é isso que tem ocorrido.

Historicamente, a Petrobrás foi uma estatal que impulsionou as atividades e domínio de experiência técnica de empresas privadas fornecedoras e prestadoras de serviços. O suporte para formação de firmas com controle tecnológico na indústria do petróleo corresponde a uma diretriz da estatal que remonta às suas raízes. Assim, parece reveladora a entrevista feita por Marilena Chaves junto a um empresário em sua dissertação de mestrado: “Não houve, vamos dizer assim, uma pré-determinação por parte do Governo, mas naturalmente houve a ‘benção’; alguns membros do Governo que acompanhavam essa idéia. Por exemplo, um homem que ajudou muito dentro do governo foi o Juracy Magalhães (…) O Juracy começou esse processo de ajudar as firmas nacionais; o processo aí ampliou e tornou-se ativo ao longo da vida da Petrobrás. (…) A Petrobrás sempre deu a oportunidade para as empresas se habilitassem a novos campos da técnica… se ‘encostassem’ numa firma estrangeira para absorver a tecnologia” [2]. Ou seja, desde sua fundação, a Petrobrás ajudou a fomentar uma cadeia industrial de fornecedoras e prestadoras de serviço.

Um caso emblemático desse padrão é o da construtora Odebrecht. Constando até pouco tempo como maior firma de engenharia do país e uma das maiores multinacionais brasileiras, a Odebrecht tem uma trajetória estreitamente associada à Petrobrás. Como as outras empreiteiras nordestinas, a empresa teve muitas encomendas das agências federais com atuação na região, como a Superintendência de Desenvolvimento do Nordeste (Sudene), o Departamento Nacional de Obras Contra a Seca (DNOCS), o Banco do Nordeste (BNB), a Companhia Hidrelétrica do Vale do São Francisco (Chesf) e a Petrobrás, que, apesar de ter sede no Rio, possuía inicialmente atividades centradas na região, sobretudo na Bahia, onde foram feitas algumas das primeiras explorações de petróleo em terra. Em sua memória, a Odebrecht sinaliza a importância da Petrobrás, que teve contrato com a empreiteira baiana já no seu primeiro ano de atividade, em 1953. A primeira obra da empreiteira fora do Nordeste foi o edifício-sede da estatal no Rio, na Avenida Chile, durante a ditadura. Por fim, a construtora fez aquisições, ramificações e até a sua internacionalização esteve relacionada à Petrobrás: em 1986, a empreiteira adquiriu a Tenenge, importante empresa de engenharia industrial que tinha como cliente fundamental a Petrobrás; a Odebrecht realizou uma diversificação que privilegiou a área da petroquímica, com a compra de ativos desde 1979, o que resultaria na formação posterior da Braskem; a Odebrecht chegou a Angola em 1983 com a obra da hidrelétrica de Capanda, em negócio com intermediação da Petrobrás [3].

No entanto, desde o golpe de 2016, a política da Petrobrás foi revertida. Os graves casos de corrupção evidenciados envolvendo empreiteiras e a estatal serviram de justificativa para a retirada da Petrobrás como operadora do pré-sal, a privatização de ativos da empresa e a aceleração da venda dos campos de petróleo, com atenuação da política de conteúdo nacional. O resultado dos últimos leilões do pré-sal tem favorecido grandes grupos estrangeiros, como Shell, Exxon-Mobil, Chevron e empresas chinesas. Além disso, a administração Pedro Parente manteve ociosa a capacidade instalada das refinarias, importando diesel e exportando óleo cru. Aproximadamente um quarto do combustível consumido hoje no país é importado, o que fez elevar e oscilar seu preço [4].

Em paralelo a isso, a operação Lava-Jato tem desmantelado a cadeia de fornecedores da Petrobrás. O impacto negativo estimado da Lava-Jato sobre a economia brasileira é de R$ 187,2 bilhões, com perda de aproximadamente um milhão de postos de trabalho [5]. O epicentro dessa crise se dá no estado do Rio de Janeiro, que sofre com índices de desemprego e perda da atividade econômica maiores que o resto do país. A chegada das petroleiras estrangeiras e a desmontagem das empresas brasileiras de engenharia tendem a levar para o exterior a cadeia da indústria do petróleo, como era comum no período FHC.

Todo esse processo parece comprovar a tendência de um novo padrão de acumulação na economia brasileira e também uma nova inserção do país na divisão internacional do trabalho. O processo de acumulação de capital na esfera financeira parece estar cada vez mais acentuado, favorecido por medidas tomadas no governo Temer – como a PEC95 –, o que ocorre no compasso da desindustrialização e reprimarização da economia brasileira. A perda da capacidade industrial não é algo verificado somente na cadeia do petróleo. Em 1990, o Brasil dispunha de 3,43% da produção industrial global, índice então similar ao da China. Em 2017, a economia brasileira foi responsável por apenas 1,98% da produção industrial do planeta, ao passo que a chinesa pulou para 24,83%. O peso da indústria no PIB brasileiro era de 45,97% em 1985 e 24,98% em 2013. Na indústria de transformação, a queda é ainda mais acentuada, passando de 35,88% em 1985 para apenas 11,8% em 2017. Enquanto a economia brasileira tem se expandido moderadamente nos últimos 20 anos, a produção de soja tem crescido no mesmo período a uma taxa média anual de 13,4% [6].

Todo esse processo é condicionado por fortes pressões externas, mas não constitui uma fatalidade, podendo ser revertido a partir de decisões políticas. Assim, a cadeia de fornecedores da indústria do petróleo pode ser recomposta por um governo democrático e que privilegie os interesses da população. A própria Petrobrás ou empresas estatais podem cumprir a função de fornecer equipamentos e serviços, em substituição à produção estrangeira e às empreiteiras privadas lideradas por empresários corruptos, em uma administração que valorize não só o lucro, mas o equilíbrio financeiro e a efetivação de uma política pública que atenda aos pleitos da sociedade brasileira, visando gerar empregos e reduzir desigualdades.

[1] Portal eletrônico da ANP. Endereço: http://www.anp.gov.br/noticias/anp-e-p/4454-pre-sal-ja-responde-por-54-da-producao-brasileira-de-petroleo-e-gas Acesso em 19/10/2018.

[2] CHAVES, Marilena. Indústria da Construção no Brasil: desenvolvimento, estrutura e dinâmica. Dissertação de Mestrado em Economia Industrial. Rio de Janeiro: UFRJ, 1985, p. 118.

[3] Sobre isso, ver CAMPOS, Pedro Henrique Pedreira. Estranhas Catedrais: as empreiteiras brasileiras e a ditadura civil-militar, 1964-1988. Niterói: Eduff, 2014.

[4] Dados retirados do portal eletrônico da Associação de Engenheiros da Petrobrás. Endereço: http://www.aepet.org.br/ Acessado em 19/10/2018.

[5] WARDE, Walfrido. Espetáculo da Corrupção: como um sistema corrupto e o modo de combatê-lo estão destruindo o país. São Paulo: Leya, 2018.

[6] CAMPOS, Pedro Henrique Pedreira; BRANDÃO, Rafael Vaz da Motta. O lugar do governo Temer na história do capitalismo brasileiro: reforço do padrão de acumulação baseado na valorização financeira. Portal Passapalavra. Endereço: http://passapalavra.info/2018/05/119815.

Fonte: Clube de Engenharia

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