A morte de Kadafi, dez anos depois
A queda do ditador líbio, celebrada pelos Estados Unidos, aprofundou o caos social
Hillary Clinton estava em Cabul, no Afeganistão, quando soube da morte de Muammar Kadafi. "Nós viemos, nós vimos, ele morreu!". Encontrado e abatido dentro de um canal de esgoto, o todo-poderoso ditador líbio foi capturado na cidade de Sirte e linchado por combatentes rebeldes. A declaração completou dez anos na última quarta-feira 20. A década que veio a seguir, contudo, mostrou que não havia motivos para comemoração.
As esperanças associadas à queda do ditador, de construir uma sociedade livre e democrática, não foram cumpridas. Ao contrário: a Líbia está afundada no caos.
Dono de grandes reservas petrolíferas, o País figurou entre os 40 maiores IDHs do mundo nos anos de 1990. Hoje, amarga o 105º lugar. Espremido sob um governo oficial enfraquecido, forte influência de milícias aliadas a monarquias do Golfo e a concessão de privilégios a empresas de petróleo e gás do Ocidente, o país se esforça para realizar eleições em 24 de dezembro, sob mediação das ONU.
"O caos acabou beneficiando as multinacionais do ramo petrolífero", avalia Issam Rabih Menem, pesquisador na UFRGS e um dos autores do estudo Imperialismo, petróleo e o intervencionismo estatal: análise da guerra civil na Líbia, publicado neste ano.
"Após a queda de Kadafi, muitas multinacionais estrangeiras, sobretudo francesas, britânicas e estadunidenses, hoje exploram esse hidrocarboneto líbio sem qualquer tipo de regulamentação", completa Menem. "Apesar de todo esse cenário socioeconômico hoje na Líbia, grandes transnacionais petrolíferas continuam atuando normalmente e negociam com quem forem os administradores das refinarias, sobretudo os grupos não-estatais."
Antes da era, registra a pesquisa, sete multinacionais sediadas nos Estados Unidos e no Reino Unido controlavam o petróleo líbio. Ele, que tomou o poder por meio de um golpe militar em 69, viria a nacionalizar mais de 50% dos bancos e das redes de petróleo, redistribuindo a renda petroleira em investimentos sociais.
Para Menem, a postura de Kadafi passou a incomodar o Ocidente. Nos anos 2000, quando George W. Bush entrava com toda a força no Oriente Médio com sua agenda de regime change, em busca de novas fontes de petróleo, a Líbia entrou na mira de Washington e acabou vítima de uma intervenção em 2011.
Nos últimos anos, a organização United World Data mostrou que quatro empresas dominam ⅓ da produção de petróleo no país: a italiana ENI, a francesa Total, a espanhola Repsol e a austríaca OMV. O restante diz respeito a empreendimentos conjuntos e complexos junto à National Oil Corporation, estatal líbia que trabalha com pelo menos 20 empresas estrangeiras, com participações americanas e inglesas.
Fonte: Carta Capital
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