As recentes revelações divulgadas pelo portal The Intercept comprovam antigas suspeitas de que a Operação Lava Jato atuava enquanto um partido político, servindo a um projeto de poder que possuía inclusive horizontes de ação de nível extranacional. Para além da atuação de cunho político-partidário dos agentes da operação, as últimas mensagens expostas pela “Vaza-jato” indicam que a força-tarefa agia como uma quadrilha, com práticas criminosas, inclusive para enriquecimento pessoal de alguns de seus integrantes (1). O dano desferido pela operação já está consumado. A Lava Jato forneceu subsídios a um golpe de Estado, desmantelou setores inteiros da economia brasileira e pavimentou a chegada do fascismo ao poder.
No segmento da indústria da construção, os efeitos da Lava Jato foram devastadores. Sob o pretexto de “combater a corrupção”, a operação paralisou empresas, consumiu milhares de empregos e atrofiou a cadeia produtiva do ramo econômico a uma fração ínfima do que subsistia anteriormente. As maiores construtoras do país – Odebrecht, Andrade Gutierrez, Camargo Corrêa, Queiroz Galvão, Galvão Engenharia, UTC e Constran – tiveram perdas de 85% de sua receita entre 2015 e 2018, passando de um faturamento conjunto de R$ 71 bilhões para apenas R$ 10,8 bilhões. Mais graves são as estatísticas de desemprego. Nesse mesmo período, a construção pesada fechou um milhão A agenda internacional anticorrupção, a operação Lava Jato e os impactos sobre as empreiteiras brasileiras de postos de trabalho no país, o equivalente a 40% das vagas de emprego perdidas na economia.
A maior empresa brasileira de engenharia, a Odebrecht, entrou em recuperação judicial, acumulando uma dívida total de R$ 98 bilhões. Só nesse grupo as vagas de trabalho retrocederam de 274 mil para 48 mil postos entre 2015 e 2019. A OAS, que atualmente está em recuperação judicial e em possível caminho para a falência, outrora teve 127 mil empregados e hoje contabiliza apenas 19 mil. (2)
As obras de infraestrutura constituem mecanismo comum para geração de empregos, formação de demanda e ampliação dos investimentos, o que é conduzido historicamente no Brasil por agências e recursos estatais. Hoje o que se vê no país são obras paradas, com os efeitos sociais negativos gerados pelo desemprego elevado.
Não é possível compreender a desmobilização da engenharia brasileira e a operação Lava Jato apenas como uma iniciativa isolada de procuradores e juízes do Paraná guiados por projetos próprios de varrer a corrupção e moralizar o país. A luta contra a corrupção se configurou enquanto uma agenda internacional nas últimas décadas.
As origens dessa pauta global remontam ao Foreign Corrupt Pratices Act (FCPA) – fundado em 1977 nos EUA e reformulado em 1988 –, que internacionalizou a bandeira do combate à corrupção. Peter Bratsis indica como o tema ganhou força no período pós-Guerra Fria, abraçado por organismos internacionais como Transparência Internacional, The Open Society Institute, Bird, FMI, OCDE e OEA. Esse autor sinaliza a diretriz do Banco Mundial sobre a questão:
“Combater a corrupção tornou-se prioridade política para a comunidade internacional em desenvolvimento ao longo das últimas duas décadas e extensos esforços de reforma nesse sentido foram empreendidos. Tais reformas apoiam-se na ideia de que a corrupção é uma disfunção da administração pública que surge na presença do monopólio e do sigilo, o que, por sua vez, pode ser controlado promovendo-se prestação de contas e transparência” (3).
Algumas mensagens divulgadas por Glenn Greenwald e sua equipe dão conta de estreitas relações mantidas entre promotores da Lava Jato e agentes da Transparência Internacional4. A bandeira do combate à corrupção foi canalizada por essa e outras organizações globais, com a prescrição de práticas e regras, particularmente em países periféricos. O governo brasileiro subscreveu tratados e aprovou leis defendidas por esses organismos. Alguns desses regulamentos proporcionaram instrumentos de ação para a Lava Jato. Antes disso, integrantes da operação, como SergioMoro, fizeram cursos sobre o assunto oferecidos por agências do governo norte-americano na sua embaixada no Brasil. (5)
No que tange ao segmento de obras de infraestrutura, a operação cumpriu o papel de fragilizar as maiores construtoras nacionais do setor, abrindo o mercado doméstico para empresas estrangeiras. Assim, a bandeira do combate à corrupção foi conveniente para desbaratar grupos econômicos brasileiros, abrindo ao capital externo setores como o de petróleo e gás, eletricidade, construção e administração de rodovias, aeroportos e outros equipamentos de infraestrutura. Walfrido Warde alerta para os males derivados de certo enfrentamento da corrupção, criticando a criminalização da política, a espetacularização e a desmoralização das instituições. Nos seus aspectos econômicos, o autor aponta que “o combate à corrupção é um negócio, talvez uma técnica de demolição de economias nacionais e de desestabilização política, uma estratégia concorrencial, um meio, jamais um fim.” (6)
Historicamente a denúncia da corrupção no Brasil tem sido instrumentalizada para finalidades políticas, geralmente de forma seletiva. A polissemia e imprecisão do termo auxiliam na sua exploração pela mídia, de maneira novelizada, sem a problematização das origens e dos aspectos estruturais que resultam na “corrupção”. (7)
O seu sentido atual é derivado de uma concepção ideológica liberal de separação do público e do privado, típica do Estado capitalista, servindo para omitir o viés de classe do Estado. (8)
A forma como grupos empresariais de comunicação trata a questão serve à produção de um discurso que assimila a “corrupção” ao Estado e o mercado ao não-corrupto, apoiando a causa da privatização. Sua difusão no senso comum se dá de forma simplificada, omitindo-se outras práticas ilegais que poderiam ser consideradas “corruptas”, como a sonegação de impostos, que envolve valores bem superiores aos “escândalos” explorados pela imprensa. De forma similar, mecanismos legais, mas eticamente questionáveis e injustos como os salários dos agentes do sistema judicial, nossa estrutura tributária ou a administração da dívida pública não são identificados com a “corrupção”. Resta que a temática é explorada com certas finalidades, o que faz secundarizar outras questões mais graves. Como afirma o especialista Marcos Bezerra:
“[...] o combate à corrupção tem servido para diferentes fins que não estritamente o controle das práticas tidas como de corrupção. Dito de outro modo, ele tem se prestado a usos sociais distintos: regulamentação de relações políticas e comerciais, deslegitimação de governos e governantes, mobilizações sociais, lutas políticas etc.” (9)
O uso da agenda anticorrupção parece constituir forma atualizada e sofisticada de romper barreiras protecionistas e abrir espaço para o avanço do grande capital internacional sobre mercados promissores antes restritos a grupos econômicos específicos.
Dessa forma, a Lava Jato parece ter sido um rotundo êxito, por ter rompido a proteção que garantia às empresas domésticas a exploração do mercado de infraestrutura nacional e, no cenário de uma disputa intercapitalista de ordem global, ter ajudado a promover o enquadramento do capitalismo brasileiro, desmantelando algumas das suas principais empresas e neutralizando alguns dos seus principais líderes.
* Pedro Henrique Pedreira Campos é professor do Departamento de História da UFRRJ.
1 Folha de S. Paulo. Deltan fez plano de lucrar com imagem da Lava Jato. Ediçãode 14/7/2019.
2 Valor Econômico. Edição de 1/7/19, página C5.
3 Citado por BRATSIS, Peter. “A corrupção política na era do capital transnacional”. Crítica Marxista. Campinas, n. 44, 2017, p. 21.
4 The Intercept. “Caraaaca”. Disponível em: https://theintercept.com/2019/ 07/07/lava-jato-vazamento-delacao-venezuela/ publicado em 7/7/19.
5 KANAAN, Gabriel Lecznieski. O Brasil na mira do tio Sam: a atuação da embaixada dos EUA durante o governo Lula. Dissertação de mestrado em História. Florianópolis: UFSC, 2019.
6 WARDE, Walfrido. Espetáculo da Corrupção: como um sistema corrupto e o modo de combatê-lo estão destruindo o país. São Paulo: Leya, 2018, p. 10.
7 Conforme SOUZA, Jessé. Radiografia do Golpe. Rio de Janeiro: Leya, 2016. Ver também PINTO, Eduardo Costa et al. “A guerra de todos contra todos: a crise brasileira”. Texto para discussão IE-UFRJ. Rio de Janeiro: UFRJ, 2017.
8 Ver BOITO Júnior, Armado. “A corrupção como ideologia”. Crítica Marxista. Campinas, n. 44, p. 9-19, 2017.
9 BEZERRA, Marcos Otávio. Corrupção: um estudo sobre poder político e relações pessoais no Brasil. 2ª ed. Rio de Janeiro: Papeis Selvagens, 2018, p. 16.
Fonte: Jornal do Corecon-RJ
Comentários
Para sua informação o Estado Brasileiro é liberal. Desde Collor, passando por FHC, Lula, Dilma, Temer e agora Bolsonaro (leia-se Guedes), a política econômica SEMPRE foi liberal.
Quando o PT assumiu a presidência em 2002, Lula fez a Carta aos brasileiros dizendo que não mexeria no sistema financeiro, e cumpriu. Pergunte aos banqueiros se eles tem queixas dele. Não têm.
Até o monopólio do petróleo no Brasil foi quebrado em 1997. Quer montar sua refinaria? Vá em frente, ninguém proíbe.
Sinceramente Roldão, não sei qual seu propósito aqui. Você mesmo já disse que não sabe de economia, de petróleo, de Petrobras.
Mas se arvora a insistir em comentários falaciosos que eu não me canso de contestar.
O aporte de capital rentista não tem nada a ver com a corrupção e sim com a remuneração dada ao capital pela política econômica do governo, que remunera muito mais o capital especulativo do que o capital produtivo. O ministro Guedes é rentista. E isto não vai mudar.
Quanto à investimentos externos na produção, há uma grave desconfiança na segurança jurídica do país, fruto da infindável quantidade de besteiras que sai da boca do Bolsonaro: nepotismo, revisionismo, aparelhamento das instituições, perseguição à jornalistas, a minorias, a opositores, a membros do STF, a técnicos e gestores dos órgãos de informação e estatísticas, das comissões de investigação de crimes do regime militar, propondo violações flagrantes da constituição, incitando ao ódio, ao descrédito das instituições e negando acintosamente dados e fatos gerados por técnicos de seu próprio governo.
MENTIRA
Segundo o “Corruption Perceptions Index (CPI)” que é um índice divulgado anualmente pela “Transparency International” desde 1995, o Brasil ocupa atualmente (dados de 2018) a posição 105 em uma lista de 180 países menos corruptos. Portanto estamos em torno da média mundial. Note-se que até 2016 estávamos em posição MELHOR do que a de hoje (79).
"..."os fins justificam os meios" visto que na luta contra a corrupção vale..."
ABSURDO!
Estamos em um estado de direito, não é aceitável que agentes da lei passem por cima da lei mesmo para pegar um culpado. Quem defende o contrário disto não é um democrata, é um fascista. Hoje pegam um culpado, amanhã pegam um inocente, um opositor ou um dissidente arrependido, até mesmo você Roldão.
A Lava Jato está derretendo pelas violações à lei que Moro e Dallagnol fizeram.
Não dê atenção ou responda ao Esquerdofrênicos de plantão!
Essa turma não vale nada, hipócritas e babacas!
Primeiramente, quanto à sua insinuação de “anonimato covarde”, é muito fácil para um ex-militar aposentado, que não tem nada a perder surfando na onda proto-fascista do governo Bolsonaro, desafiar seu oponente a se revelar para ser marcado como alvo futuro em um regime autoritário. Já sabemos de colegas aqui na PB que estão sendo punidos sem motivação nenhuma além de suas posições políticas. Não serei o trouxa que o senhor deseja.
“..maior operação anticorrupção da História da Humanidade..”, “Não há precedentes”, “..paradigma mundial de combate à corrupção nas diversas esferas do Poder Civil”
ERRADO! Você não lê história mesmo. A Operação Mãos Limpas, investigação ocorrida de 1992 a 1996, que visava esclarecer casos de corrupção na política italiana foi muito amior.
*s://pt.*pedia.org/*/Opera%C3%A7%C3%A3o_M%C3%A3os_Limpas
Teve tamanha relevância que marcou uma mudança de ciclo na Itália. As revelações da operação levaram ao fim a chamada Primeira República Italiana, que durava desde o fim do governo fascista de Benito Mussolini.
Foram investigados no total 6.059 pessoas - 872 empresários, 1.978 administradores, 434 parlamentares e 4 ex-primeiros-ministros. Foram expedidos 2.993 mandados de prisão contra acusados. A Lava Jato não chegou nem aos pés dela.
ERRADO! Não garante nada em termos de melhoria da economia ou mesmo da própria corrupção. Se bem aplicada, DENTRO DOS LIMITES DA LEI, pode levar a punição de corruptos sim, mas não evita o surgimento de novos dentro do próprio poder.
Com o fim da Operação Mãos Limpas e a mudança no quadro político, empresários, comunicadores e até mesmo magistrados começaram a surgir como lideranças políticas. Berlusconi foi um deles, virou 1° ministro e chefiou um dos maiores esquemas de corrupção da Itália nos anos seguintes.
Leia História!
ESTÁ ATRASADO NA LEITURA DE JORNAIS! Já estão evidentes, pelas mensagens da Vaza Jato, as motivações políticas e de cunho pessoais, inclusive financeiras (palestras remuneradas com se fossem aulas, empresa de fachada para disfarçar estes pagamentos), de Moro e Dallagnol, a serviço de um projeto de poder.
Leia jornais!
“..vale tudo para combate-la. Vale até atropelar o estado de direito.”
ERRADO! E de longe a maior BESTEIRA dita pelo senhor nestas mensagens. Só em um regime FASCISTA esta premissa pode ser tolerada, jamais em uma democracia. É uma prova inequívoca do que o senhor é na verdade. Fascista.
Leia a Constituição!!!
CORRETO! Incluo aqui também os corruptos do próprio sistema encarregado das investigações, Moro e Dallagnol, por práticas ilegais de conluio, coação de testemunhas, investigações não autorizadas de membros do judiciário (Gilmar Mendes, Toffoli, Raquel Dodge) e da imprensa (Glen Greenwalld) e tentativa de destruir provas (material apreendido com os “hackers”).
“Somos alvos de chacotas no exterior. Ninguém acredita no Brasil.”
CORRETO! E uma parte desta vergonha são o que a Vaza Jato já revelou das práticas ilícitas de agentes da Lei, como Moro e Dallagnol, e a parte maior da vergonha deve-se às frases e proposições inconstitucionais, ilegais, imorais, aéticas e ridículas, que saem diariamente da boca do presidente Bolsonaro.
Continue insistindo nesta mentira, quem sabe você consiga a vaga de “Goebbels” no “reich” de Bolsonaro.
“..79º lugar para o atual 105º lugar, graças à revelação dos malfeitos na PeTrobras no bojo da Operação Lava Jato.”
Que piada. Mais provável é que a população já tenha se desencantado com o governo, removida a venda que lhe cobria os olhos e se dado conta de que o motivo verdadeiro da operação não era combater a corrupção, mas interferir no processo eleitoral, promover a ascensão pessoal e financeira de Moro e Dallagnol, com prática ampla e descarada de atos ilegais.
“Pela recuperação da credibilidade do Brasil:"
APOIADO!! EXONERAÇÃO E INDICIAMENTO JÁ DE MORO E DALLAGNOL! IMPEACHMENT JÁ DE BOLSONARO!
BRASIL PARA TODOS OS BRASILEIROS! ESTADO DE DIREITO E LAICO!
CONSTITUIÇÃO ACIMA DE TUDO!
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