A Revolução Mexicana, iniciada em 1910, foi a primeira revolução de grande porte na América Latina após as guerras de independência. A história do México no século XX foi, em essência, o desenrolar do processo revolucionário, encerrado, na prática, em 1982 com a eleição do neoliberal Miguel de la Madrid.
O que desencadeou seu estopim foram, basicamente, as contradições do desenvolvimento econômico ocorrido no governo de Porfirio Diaz (1884–1911), baseado na atração de capital estrangeiro e na alta exploração da força de trabalho mexicana. O México industrializou-se, integrou-se nacionalmente por meio de uma extensa malha ferroviária e conheceu uma estratificação social mais complexa, mas as desigualdades sociais aumentaram, e grande parte da população não se beneficiava com o aumento das riquezas produzidas. Além disso, a política externa de Diaz, muitas vezes contrárias aos interesses dos EUA, levou o vizinho do norte a apoiar a Revolução em seus estágios iniciais.
De 1910 a 1917, o Estado mexicano desintegrou-se sob a pressão de várias forças que se insurgiam, dentre as quais se destacam os exércitos de Pancho Villa, ao norte, e de Emiliano Zapata, ao sul, ambas de caráter popular, e várias outras de caráter oligárquico e localista.
A Constituição de 1917, anterior à Revolução Russa, operou uma grande aliança nacional que restabeleceu a unidade do Estado, reformulando-o completamente. Fortaleceu o poder presidencial e assegurou a primazia do governo central ante os estados. Também fundou os arcabouços do Estado nacionalista e social, garantindo a soberania nacional sobre os recursos naturais e incorporando os setores populares à plena cidadania. Os recursos hídricos e do subsolo, como petróleo e minérios, foram estatizados.
Foi a primeira constituição do mundo a estabelecer a reforma agrária e direitos trabalhistas como salário mínimo, jornada de trabalho de 8 horas diárias, descanso semanal remunerado, férias remuneradas obrigatórias e regras de segurança do trabalho.
O período seguinte foi bastante turbulento e marcado por lideranças individuais sem um partido forte e estruturado. Essas lideranças, notadamente Álvaro Obregón (1920–1924) e Plutarco Elías Calles (1924–1928) lutaram para recompor na prática a autoridade federal, dando realidade à Constituição. Para isso, constituíram um arco de aliança entre os trabalhadores urbanos, os camponeses e o Exército.
Foram realizadas importantes medidas em termos de nacionalização do setor bancário, com a criação do Banco do México em 1925, esforços de reforma agrária e políticas educacionais e culturais de erradicação do analfabetismo e valorização da nacionalidade. No plano externo, os EUA impuseram uma severa oposição em retaliação à nacionalização do petróleo.
No final da década de 1920, as elites revolucionárias criaram o Partido Nacional Revolucionário (PNR), partido de massas que buscava representar todo o país e que consistia em quatro setores: trabalho organizado, união camponesa, Exército e setor popular. O PNR tornaria-se o Partido da Revolução Mexicana (PRM) em 1938, transformado, em 1946, em Partido da Revolução Institucionalizada (PRI).
Essa estrutura partidária representativa de amplos setores sociais foi fundamental para consolidar a Revolução e unificar a Nação, tendo liderado o processo revolucionário a partir de então. O PRI manteve-se ininterruptamente no governo até 2000, em um processo peculiar onde a estrutura partidária sobrepunha-se aos presidentes que, proibidos de se reelegerem, apoiavam, com êxito, os seus sucessores.
Com Lázaro Cárdenas (1934–1940), o mais destacado líder revolucionário individual, a autoridade presidencial foi sacramentada pela destruição do poder dos chefes locais. Suas principais realizações foram a nacionalização das ferrovias e da indústria de petróleo e o avanço significativo da reforma agrária em bases comunitárias e cooperativas, com estímulo à mecanização agrícola por meio da Nacional Financiera, banco público criado em 1934.
Cárdenas apoiou a indicação do seu sucessor, Ávila Camacho (1940–46), que adotou uma política nacionalista centrista de aproximação da revolução mexicana com os empresários. A partir de então, o PRI passou a incorporar, em sua organização interna e em suas políticas, também os representantes do capital nacional. Isso consolidou o partido como representante de toda a Nação e o viabilizou como fiador da unidade mexicana e condutor do nacional-desenvolvimentismo que seria adotado a partir de então.
O pacto sociopolítico firmado foi chamado então de Desenvolvimento Estabilizado, em que o Estado logrou combinar rápido crescimento econômico com preços estáveis por meio do planejamento governamental. Além de subsídios e tarifas de importação, foram criadas e expandidas diversas empresas estatais em setores de alta complexidade: em 1947, foi criada uma indústria estatal de fibras sintéticas; em 1948, uma indústria de motores elétricos; em 1954, o Estado começou a fabricar vagões de trens; em 1959, a Pemex (estatal de petróleo fundada por Cárdenas) iniciou a indústria petroquímica. Em 1960, o setor elétrico foi nacionalizado. O aprofundamento da reforma agrária levou à distribuição de cerca de 42 milhões de hectares para 802 mil famílias camponesas entre 1958 e 1976.
Contudo, nas décadas de 1960 e 1970, passou a haver uma crescente contestação ao PRI, principalmente devido ao lamentável evento do massacre de estudantes na Praça das Três Culturas, na Cidade do México, em 1968. A desaceleração econômica na década de 1970, em razão de um contexto internacional desfavorável, fortaleceu as vozes oposicionistas.
Com a crise da dívida, no início da década de 1980, a pressão internacional pela adoção do neoliberalismo tornou-se implacável. A nacionalização do setor financeiro, em 1982, por José López Portillo (1976–1982), logo foi revertida pelo seu sucessor, Miguel de La Madrid (1982–1988) que, mesmo sendo do PRI, adotou o receituário do FMI e encerrou, na prática, o processo revolucionário iniciado em 1910. A partir de então, o PRI descaracterizou-se como liderança nacionalista, aproximando-se cada vez mais da direita liberal, onde inapelavelmente se encontra hoje.
Felipe Quintas é Doutorando em Ciência Política na Universidade Federal Fluminense.
Fonte: Monitor Mercantil