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Stefano Ungaro

O Pacto de Estabilidade prende os países europeus na jaula da austeridade

Austeridade: flexibilidade mínima e apenas para gastos militares.

Publicado em 02/01/2024
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Idealmente, o Pacto de Estabilidade poderia ter sido utilizado para levar a integração a um nível mais profundo, estabelecendo uma política fiscal comum, com receitas e despesas compartilhadas e uma política industrial comum. A Europa certamente precisaria de uma agência de investimento com um grande orçamento para apoiar investimentos estratégicos nas transições energética e digital. Alternativamente, o pacto revisado poderia ter servido pelo menos para dar aos Estados-membros um pouco mais de folga, inclusive vinculando a emissão de nova dívida a investimentos estratégicos (a chamada “dívida boa”) para desencorajar gastos improdutivos.

Mas, ao invés disso, essa oportunidade foi perdida, e tudo por culpa dos chamados países “austeros”, liderados pela Alemanha. E não serão apenas os países “latinos” – França, Espanha, Itália (cujo governo mostra uma timidez incrível a esse respeito) – que sofrerão as consequências, mas também a Alemanha, os Países Baixos e outros países que optaram por se sacrificar no altar da austeridade.

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O que é o Pacto de Estabilidade? O Pacto de Estabilidade e Crescimento é o sistema de normas que limita os gastos públicos dos estados da União Europeia. O pacto, suspenso devido à pandemia, voltará a entrar em vigor em 1º de janeiro de 2024, se nenhuma modificação for acordada até então. Como muitas outras normas europeias, este pacto foi moldado de acordo com os princípios de austeridade e neoliberalismo. Não é por acaso que todos o chamam de “Pacto de Estabilidade”, omitindo o “crescimento” que também deveria estar no cerne das políticas fiscais da União e de seus Estados-membros. Além disso, o Pacto tem efeitos pró-cíclicos, o que significa que adiciona o ônus da austeridade a um clima econômico negativo, como ocorreu durante a crise financeira de 2010, com consequências muito graves para os povos da Europa.

Como muitos países ainda não reembolsaram a dívida contraída para combater os efeitos econômicos da pandemia e têm necessidade de realizar fortes investimentos para financiar as transições energética e digital, a Comissão Europeia apresentou em abril uma proposta de reforma do Pacto. Para esta proposta também teve importância a pressão para aumentar os gastos militares dos países-membros no contexto da guerra entre Rússia e Ucrânia. Embora mantendo o quadro de normas consagrado nos Tratados, a proposta da Comissão pretende abandonar a abordagem atual, única para todos os estados-membros, e passar para outra que leve em consideração as circunstâncias nacionais específicas.

Bruxelas propôs uma “trajetória de ajuste fiscal” de quatro anos para cada Estado-membro que não cumprir algum dos critérios de Maastricht. A trajetória de ajuste poderá ser estendida por mais três anos se estiver atrelada a reformas estruturais ou investimentos estratégicos para estimular o crescimento.

A Alemanha se mostrou hostil a essa reforma desde o início, argumentando que a personalização por país minaria a “disciplina fiscal”, pois seria resultado de negociações bilaterais entre o Estado-membro e a Comissão. No final de abril, a ministra alemã da Economia, Lindner, já estava pedindo “regras mais vinculativas”.

Desde então, o texto legislativo foi revisado várias vezes, caminhando cada vez mais para restrições maiores. Os países “latinos”, com a França à frente, cederam em muitos pontos, aceitando, por exemplo, reintroduzir normas automáticas de redução da dívida e do déficit. No entanto, hoje, a Alemanha quer que qualquer país sujeito ao procedimento de déficit excessivo não tenha flexibilidade alguma, mesmo que invista em defesa ou na transição ecológica.

Em resumo: a austeridade como agenda política para a Europa foi a questão polêmica na reunião de oito de dezembro de 2023. Os franceses estavam pouco dispostos a ceder nesse último ponto. A Alemanha sabe que tem a faca e o queijo na mão. Se não houver acordo dentro de um mês, o antigo pacto pró-austeridade e anti-investimento, que a Alemanha tanto gosta, voltará a vigorar.

Se houver acordo, o novo pacto poderá ser apresentado ao Parlamento antes das eleições previstas para junho e entrar em vigor em 2025. E neste caso, as normas vigentes já iriam sendo ajustadas tendo em vista as novas regras em 2025. No entanto, nesta altura, está claro que o compromisso final não afetará de forma alguma o cerne do pacto – ou seja, a austeridade – e provavelmente apenas dará aos estados uma flexibilidade mínima para a única área em que todos estão focados no momento, seja Alemanha, França ou Itália: os gastos militares.

Publicado no Il manifesto global, 12/12/2023)

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