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Resposta ao executivo da logística sobre ociosidade do parque de refinarias da Petrobrás

Nossa Associação tem apontado as consequências lesivas, ao país e à Petrobrás, da política de preços inaugurada desde outubro de 2016.

Publicado em 14/06/2018
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Em resumo, foram praticados preços superiores aos internacionais, a importação de combustíveis por companhias privadas se tornou lucrativa, concorrentes ocuparam mercado da Petrobrás, a ociosidade das refinarias alcançou 28% no primeiro trimestre de 2018, a exportação de petróleo cru bateu recordes e a importação de diesel dos EUA disparou. Leia nota da AEPET.


No último dia 11 de junho, os funcionários da Petrobrás receberam carta do gerente executivo Mastella, da Logística, da diretoria de Refino e Gás Natural, para “esclarecer o assunto e explicar quando é melhor aumentar o processamento ou vender petróleo cru”.
O executivo afirma:


"Essa afirmação (que a opção por exportar um produto mais barato, o petróleo bruto, e importar combustíveis mais caros estaria prejudicando a Petrobrás e o país) parte de um raciocínio tentador, mas equivocado: quanto mais eu refino, mais eu ganho. Sabemos que, em muitas indústrias, quanto mais se produz, melhor é o resultado.  Isso não se aplica ao processo de refino, onde, a partir da mesma matéria-prima - o petróleo - produzimos diferentes produtos, alguns com alto valor comercial, como o diesel e a gasolina, e outros que, se comercializados, valem menos que o petróleo bruto, como o óleo combustível."


Não afirmamos que quanto mais se refina mais se ganha, estamos dizendo que praticar preços altos possibilita que a cadeia de importação por agentes privados se torne lucrativa e ocupem o mercado da Petrobrás, vendendo combustíveis mais baratos.


Quando o diesel produzido pelas refinarias da Petrobrás encalha a companhia precisa reduzir a carga das suas refinarias. Continua arcando com os custos fixos e se vê obrigada a exportar petróleo cru enquanto deixa de produzir derivados refinados no Brasil. A própria companhia registra em seus balanços as perdas de receitas de vendas decorrentes da entrada de concorrentes. A estatal também pratica ajustes no cálculo dos preços e diz que visa recuperar mercado. Ocorre que até o último balanço publicado os ajustes têm sido ineficazes.


O executivo prossegue:


"Neste ponto é importante falar da capacidade instalada nas nossas refinarias, e de como definimos o ponto ideal de processamento. Para isso, é preciso compreender um pouco sobre o nosso processo. Temos três tipos principais de unidades nas nossas refinarias: as de destilação; as de conversão; e as de tratamento. A destilação é a primeira e mais simples etapa do processo. Na destilação, o petróleo bruto é separado em frações leves e médias - incluindo cerca de 30 a 35% de diesel - e em frações pesadas, com baixo valor comercial, que podem chegar a cerca de 60% (são proporções aproximadas, pois elas variam de acordo com a natureza do petróleo, que pode ser mais leve ou mais pesado)".


Não temos comentário sobre este parágrafo, sigamos.


"A capacidade e a utilização da destilação são normalmente o que divulgamos como capacidade e uso do refino, o que pode gerar interpretações distorcidas.
Se o processo parasse na destilação, para cada barril de petróleo, teríamos aproximadamente um terço de diesel.  A maior parte viraria óleo combustível, cujo valor de venda é menor que o do petróleo. Para melhorar o resultado, as refinarias dispõem de unidades de conversão: as de Coqueamento, que geram diesel, e as de Craqueamento Catalítico (FCC), que geram gasolina. Essas unidades também geram frações mais pesadas, mas aumentam significativamente o rendimento de diesel e gasolina da refinaria. Por fim, os produtos passam pelas unidades de tratamento, para garantir a qualidade e adequação ao uso final (motores, fornos, turbinas...)."


Nada de novo para os petroleiros, vamos em frente.


"Mas, no nosso parque de refino, temos uma capacidade de destilação maior que a capacidade de conversão e tratamento. O que quer dizer que a rentabilidade da nossa produção é limitada pela capacidade de conversão, pois, como já vimos, se usássemos apenas o processo de destilação, geraríamos uma quantidade grande de produtos com baixo valor comercial. Esse é um dos motivos pelos quais é incorreto afirmar que operar com as refinarias a plena carga traria sempre melhores resultados."


A ociosidade das refinarias da Petrobrás não se restringe às unidades de destilação, também unidades de conversão e tratamento estão ociosas.

A ociosidade das unidades de craqueamento e coqueamento, para produção de gasolina e diesel, apresentam ociosidade similar à destilação.


Nunca afirmamos que operar em plena carga necessariamente gera os melhores resultados. Afirmamos que a política de preços limitou o mercado da Petrobrás e foi a causa do aumento da ociosidade do refino, favoreceu a importação por terceiros e prejudicou a Petrobrás e o Brasil.


Como dissemos, a própria Petrobrás reconheceu a necessidade de ajustes nos preços para recuperar mercado. Qualquer modelo, inclusive o de preços, precisa ser testado, não pode ser aceito como o melhor independentemente dos resultados que apresenta. Reduzir preços e aumentar mercado, recuperando a inédita fração perdida para terceiros, assim como pelo aquecimento da demanda permitido por preços mais moderados têm potencial de aumentar a geração de caixa da Petrobrás, além de favorecer os brasileiros e a economia nacional.


Seguindo a carta:


"O que fazemos para decidir qual a melhor alternativa para a companhia é comparar as alternativas disponíveis, em especial duas possibilidades: aumentar o processamento ou vender o petróleo cru. Quando a venda do petróleo traz melhor retorno financeiro do que o aumento do processamento, é melhor exportar o nosso petróleo. Se, por outro lado, o mercado de derivados está aquecido, com maior demanda e mais valor para os nossos produtos, é o momento de aumentar a carga das refinarias.  É assim que fazemos o tempo todo, reavaliando permanentemente e buscando o máximo ganho para a Petrobrás e com uma visão integrada da companhia."


Esta decisão de alocação ótima depende dos preços estabelecidos pela política de preços. O modelo, além da função objetivo, tem premissas de preços e de mercado. A mudança na premissa de preços pode aumentar o mercado da Petrobrás e alterar a distribuição ótima entre processamento e exportação de petróleo. Favorecendo o processamento nas refinarias da Petrobrás, diminuindo a exportação de petróleo cru e melhorando o resultado operacional da companhia com diluição dos custos fixos.


O raciocínio, apresentado em tese, seria aceitável para um executivo, mas as condições atuais não são aquelas apresentadas em tese. Além disso, não é adequado para a direção de uma empresa estatal cujos objetivos não se restringem a maximização dos lucros no curto prazo.


Ainda assim, não está evidente nos balanços da empresa os ganhos desta política. A companhia que em 2015 obteve uma receita bruta de R$ 401 bilhões, em 2017 foi reduzida em R$ 39 bilhões, para R$ 362 bilhões.


É inusitado que mesmo com aumento de produção e inflação, ocorra uma queda na receita bruta nominal.


Reconhecemos que cada vez fica mais difícil comparar resultados da Petrobrás em diversos períodos, depois de todas as vendas de ativos produtivos, desintegração e redução significativa de investimentos.


Mas a queda da receita poderia ser justificada se viesse acompanhada de um aumento no lucro bruto (receita descontada do custo dos produtos vendidos). Mas isto também não ocorreu. O lucro bruto que em 2015 foi de R$ 99 bilhões caiu para R$ 92 bilhões em 2017.


Entretanto o importante é que fique bem claro que as responsabilidades da alta direção de uma empresa como a Petrobrás estão muito além da simples administração instantânea e conjuntural para maximização dos lucros. A greve dos caminhoneiros e suas consequências para a economia brasileira foi a mais recente lição didática da importância estratégica dos combustíveis e da Petrobrás.


O gerente prossegue:


"Mas vocês podem perguntar: o que poderia ser feito para aumentar, ao mesmo tempo, a nossa utilização do refino e os resultados econômicos da empresa? Há mercado para isso?
A recuperação da economia brasileira trará, naturalmente, mais demanda por combustíveis, que induzirá maior uso econômico de nosso parque de refino. Numa visão de longo prazo, contudo, precisamos discutir investimentos em competitividade, traduzidos em melhores alternativas logísticas e operacionais, bem como aumento de nossa capacidade de conversão e tratamento. Sabemos que o Brasil passou por momentos de recessão econômica, e isso tem como consequência direta a desaceleração do crescimento da demanda por combustíveis. Mas todas as projeções apontam para um mercado em expansão e será necessário, sim, aumentar investimentos no refino e em logística. Estes investimentos, para serem implementados, deverão disputar recursos com todo o portfólio de opções da empresa, num processo de escolha econômica e de posicionamento estratégico, usando para isso capital próprio ou atraindo parceiros."


A esperança de aumento da demanda por combustíveis da Petrobrás pode ser frustrada com a manutenção, ou aumento, da participação dos concorrentes no mercado brasileiro, assim como pela elevação das participações dos biocombustíveis, etanol e biodiesel, em função do programa Renovabio.


A política de preços da Petrobrás entrega o mercado aos concorrentes e a decisão de abandonar os biocombustíveis alija a companhia da disputa pelo mercado crescente do biodiesel e do etanol que deslocam, respectivamente, o diesel e a gasolina.


O executivo conclui sua mensagem:


"É importante lembrar que já houve momentos em que nossas refinarias funcionaram com elevado fator de utilização, processando no limite da capacidade das unidades de destilação, mas com resultados econômicos piores que os atuais. Hoje, combinando uma prática de preços competitivos e uma avaliação técnica e econômica permanente da nossa atividade de refino, conseguimos, nos últimos anos, melhorar muito nossos resultados. Estamos contribuindo para a recuperação financeira da nossa empresa. E, certamente, com finanças equilibradas, capacidade de investir e operando em um mercado mais maduro e competitivo, contribuiremos também para o desenvolvimento do país. "


Como dissemos anteriormente, a suposta melhora nos resultados não se traduz nos dados apresentados nos balanços. Destacamos a queda da receita e do lucro brutos na comparação entre 2015 e 2017. É preciso apresentar evidências do que se diz para um debate franco, transparente e produtivo.


Precisamos registrar que a direção da empresa precisa ter consciência e ser coerente ao que estabelece a Constituição Federal no seu artigo 173 que diz que o Estado só pode atuar no mercado em face de “relevante interesse coletivo” ou “imperativo de segurança nacional”
A criação da Petrobrás objetivou a garantia da segurança energética do país. Este objetivo pode ser muitas vezes antagônico à maximização dos lucros de curto prazo, mesmo que não nos pareça que seja este o caso.


A defesa da atual política da Petrobrás é contraditória ao que preconiza a CF que no seu artigo 177 onde se determina que devem ser monopolistas todas as atividades na área de petróleo, tais como: lavra, refino, transporte marítimo ou via oleoduto e importação de derivados. Privados só podem exercer estes tipos de atividades por delegação do Governo Federal. A lógica da gestão privada aplicada a alta direção da estatal confronta os objetivos da própria existência da Petrobrás e suas atribuições constitucionais.


Estabelecer preços acima do mercado internacional penaliza os brasileiros, contraria a CF e só beneficia as refinarias dos EUA, os “traders” estrangeiros e distribuidoras privadas que ocupam o mercado da Petrobrás.


Em recente artigo o advogado e professor da Universidade Federal Fluminense, Cláudio Pereira de Souza Neto, esclarece:


“O propósito de o Constituinte de 1988 ter mantido o monopólio estatal – que remonta no Brasil à década de 1950 – é justamente reduzir a vinculação do mercado interno à volatilidade da geopolítica internacional do petróleo, responsável pela fixação dos preços. O fornecimento seguro e estável de petróleo, por valores adequados, não pode ser garantido pelo mecanismo de mercado. O preço do barril de petróleo é fixado internacionalmente, em grande parte, por um cartel, integrado por países produtores – a Opep. Interferem ainda na fixação dos preços internacionais as guerras e intervenções que frequentemente acontecem em países produtores.
A rigor, não há mercado internacional, mas geopolítica, dominada pelos Estados nacionais. Acoplar a política de preços da Petrobrás aos preços praticados no exterior, em última análise, significa importar instabilidade política, que hoje caracteriza importantes centros produtores, como o Oriente Medio e a Venezuela. ”


É obrigação da direção da companhia ser transparente quando divulga seus resultados financeiros, sejam eles negativos ou positivos.
Recentemente assistimos um verdadeiro festival de apelações enganosas como as seguintes:


Informações falaciosas como do Fatos e Dados (15/03/2018) sobre o resultado de 2017 “registramos o menor prejuízo dos últimos quatro anos” sem dizer que registraram o menor impairment dos últimos quatro anos. Informar que o prejuízo seria revertido em lucro de R$ 7 bilhões não fosse a antecipação da indenização aos acionistas nos EUA que causaram perdas de R$ 10 bilhões, sem citar outro evento não recorrente que foi a venda da malha de gasodutos do Sudeste (NTS) que gerou resultado contábil de R$ 6 bilhões é manipulação irresponsável dos resultados para autopromoção injustificada dos executivos.


Ou do Fatos e Dados (08/05/2018) sobre o resultado do 1º trimestre de 2018 “Obtivemos o melhor resultado trimestral dos últimos 5 anos”, sem dizer que a venda de Iara, Lapa e Carcará elevavam o resultado em R$ 3,2 bilhões e que os resultados de períodos anteriores precisam ser ponderados pois estão carregados de impairments.


Corromper a natureza da empresa integrada, transformando-a em “exportadora líquida” de petróleo cru, com o objetivo de fazer o ajuste cambial sobre a dívida com a prática de hedge account deve ser muito bem esclarecido a respeito de qual seria o resultado sem a referida prática.


Antecipar pagamentos trimestrais de juros sobre capital próprio e distribuir 95% dos lucros no pagamento de dividendos (como ocorreu na BR Distribuidora) são práticas incompatíveis com uma companhia integrada de petróleo e energia de natureza Estatal que precisa priorizar a utilização do caixa gerado para aplicar no desenvolvimento e agregação de valor ao pré-sal.


Prudência, transparência e patriotismo são indispensáveis para os funcionários e dirigentes de uma empresa como a Petrobrás.


Em recente editorial refletimos sobre “O que pensam os executivos da Petrobrás”, reiteramos aqui que aos que ainda preferem se omitir no seu dia a dia, dizendo que não vai dar em nada, quando qualquer iniciativa de mostrar sua discordância com o desmonte da companhia é sugerida, vale parar para refletir pois não serão preservados apenas porque foram condescendentes com a direção.


A História julgará a todos, precisamos estar à altura do nosso tempo.

Associação dos Engenheiros da Petrobrás (AEPET)

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