A quem interessa a alta dos combustíveis?
OBrasil foi surpreendido com mais um aumento no preço da gasolina. O preço do combustível vem aumentando de forma consecutiva nas últim
O Brasil foi surpreendido com mais um aumento no preço da gasolina. O preço do combustível vem aumentando de forma consecutiva nas últimas cinco semanas e o litro já é vendido a quase 8 reais no Rio Grande do Sul. Segundo dados da Agência Nacional de Petróleo (ANP), entre 31/10/2021 e 06/11/2021, o preço médio do litro da gasolina subiu de 6,562 para 6,710.
Os preços do óleo diesel e do gás de cozinha também subiram. Como resultado, a inflação ao motorista chegou ao patamar de 18,46% no acumulado de 12 meses até outubro, como mostra o Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (IBRE/FGV). O principal fator é o aumento dos combustíveis, o que inclui a gasolina, o etanol e o GNV.
A Organização dos países exportadores de petróleo (OPEP) adota uma política de restrição da produção e, como resultado, as exportações caíram drasticamente. A melhora nas condições da pandemia provocou um aumento na demanda global de petróleo, e essa menor oferta está pressionando os preços nos países importadores. No entanto, a OPEP não sinaliza uma possível revisão do plano de fornecimento dos barris de petróleo, a despeito da pressão de países como Estados Unidos, Japão e Índia. Com efeito, o preço do barril já é vendido a mais de 80 dólares.
No Brasil, além do impacto da menor oferta mundial de petróleo, as contínuas desvalorizações do real frente ao dólar representam mais um elemento no encarecimento dos combustíveis. Ademais, desde o final de 2016, a Petrobras reajusta os preços do barril de acordo com a cotação internacional e as oscilações são repassadas para os preços da companhia. Como o petróleo é cotado em dólar, a desvalorização do real frente à moeda norte-americana é um componente fundamental no encarecimento dos combustíveis. Em relação ao etanol, a crise hídrica e a consequente estiagem prejudicaram a produção de cana-de-açúcar, pressionando para cima o preço do biocombustível.
Parece que os preços exorbitantes dos combustíveis estão deteriorando apenas a renda das famílias brasileiras
O preço da gasolina possui cinco componentes: distribuição e revenda, custo do etanol anidro, imposto estadual (ICMS), impostos federais (CIDE, PIS/PASEP e COFINS) e parcela da Petrobras. No período entre 31/10/2021 e 06/11/2021, a parcela da Petrobras passou a ser em média 2,33 reais, que é a maior cota de arrecadação dentre os componentes citados. Em relação ao diesel, a parcela da Petrobras é em média 3,02 e no gás de cozinha esse valor chega a 50,12. Na esteira desses fatos, a Petrobras registrou um lucro líquido de 31,142 bilhões de reais no terceiro trimestre de 2021, resultado direto do aumento do preço do petróleo no mercado internacional e da receita das vendas no mercado doméstico.
O governo federal é diretamente beneficiado pela alta dos combustíveis, pois sua receita é impactada positivamente pela maior arrecadação e pelo recebimento de dividendos e royalties. Os impostos federais PIS e COFINS compõem o preço dos combustíveis e, com a constante alta, a arrecadação da União também aumentou. O governo federal é o maior acionista da Petrobras e, com o aumento do lucro líquido da companhia, o valor dos dividendos também subiu. Por fim, as petroleiras precisam pagar royalties à União (além de estados e municípios) para realizar a exploração do petróleo e esses valores também apresentam uma trajetória de elevação.
Portanto, parece que os preços exorbitantes dos combustíveis estão deteriorando apenas a renda das famílias brasileiras. Na contramão, o governo federal não parece muito preocupado, uma vez que os cofres públicos estão sendo beneficiados por esta conjuntura.
Preocupado com as eleições, o presidente Jair Bolsonaro sinalizou ao Planalto a possibilidade de criação de um "fundo de estabilização" para conter a alta do diesel (para atender as pressões dos caminhoneiros) e do gás de cozinha, não incorporando a gasolina. Provavelmente o impacto do fundo não será muito relevante, pois além de não incluir a gasolina, não será capaz de reduzir o preço a um ponto socialmente eficaz. A alta dos combustíveis é um elemento fundamental na trajetória inflacionária recente, que vem corroendo a renda familiar, com impactos sociais sem precedentes. Não é por acaso que os grupos Habitação e Transportes representam os maiores impactos no IPCA mensal, puxados pela alta dos combustíveis, energia elétrica e gás de botijão. Diante deste cenário, o governo federal deveria atuar de forma ativa para reduzir os repasses da alta dos preços para os consumidores. Ademais, o fornecimento de um auxílio para que famílias mais necessitadas possam comprar o botijão de gás também deveria ser uma medida a ser analisada. Por enquanto, seguem as incertezas, omissões e inversão de prioridades, típicas do governo Bolsonaro.
Julia Leal - Doutoranda em Economia pela UFRJ e Pesquisadora do FINDE/UFF
Fonte: Carta Capital
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