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Leonardo Condurú

As pedaladas jurídicas nos bastidores do impeachment de Dilma

em contraposição às pedaladas fiscais que a condenaram à perda do mandato presidencial, as pedaladas jurídicas produzidas pelo ministro Lewa

Publicado em 11/01/2018
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em contraposição às pedaladas fiscais que a condenaram à perda do mandato presidencial, as pedaladas jurídicas produzidas pelo ministro Lewandowski a absolveram de inabilitação para o exercício de cargo público por um período de oito anos.

Mas, o que seriam as pedaladas fiscais que apearam Dilma do poder vis-à-vis as pedaladas jurídicas que a absolveram da inelegibilidade?

As pedaladas fiscais do Governo Dilma foram muito bem definidas pelo senador Caiado como um mesmo dinheiro que paga duas dívidas de igual valor. E corresponderiam a operações de crédito, ou a estas assemelhadas, celebradas entre o ente controlador (no caso, a União) e entidades controladas (bancos estatais). Tratando-se, portanto, de dinheiro público tirado de banco estatal, para financiamento de gastos do Governo.

Essas operações são vedadas pela LRF e quando praticadas por agentes políticos tipificam os chamados crimes de responsabilidade, sujeitando os infratores, no caso o presidente da República, à cassação de seu mandato com inabilitação para o exercício de cargo público por oito anos. Foi o que deveria ter acontecido com a ex-presidente Dilma. Mas, como se sabe, não foi bem assim.

Numa alquimia tipicamente petista, atreveu-se o ministro a lucubrar o chamado fatiamento da pena máxima — antes única, indivisível e indecomponível — com julgamento, em separado, de cassação de mandato, de um lado, e inabilitação para o exercício de cargo público por oito anos, de outro. Uma inscrição paroxística de “pena única que pune e absolve simultaneamente”, a chamada pedalada jurídica do Lewandowski.

Tudo começou a partir de uma sondagem do senador Lindbergh ao ministro Lewandowski, na busca de um destaque que pudesse abrandar a situação de Dilma, e que consistia no julgamento, em separado, de cassação e inelegibilidade, respectivamente, num perfeito simulacro do precedente havido no impeachment de Collor, em 1992.

Com o sinal verde de Renan Calheiros, o ministro Lewandowski designa uma dupla de agentes públicos, o secretário-geral do Senado, escrivão do julgamento, e a secretária-geral do STF, coordenadora da equipe de assessoramento do presidente, para que ambos estudassem alternativas jurídicas capazes de justificar o destaque que pedia o fatiamento da pena de impeachment.

E foi o que fizeram. Mesmo alheios ao julgamento de impeachment, passaram a exercer, de fato, funções judicantes em todo o rito final, como paus mandados para justificar a isenção de pantomina do ministro Lewandowski no julgamento, já que também não detinha competência para tanto.

O senador Cassio Cunha Lima alertou o ministro quanto à irregularidade de aceitação de destaque de fatiamento da pena devido tratar-se de matéria preclusa, bem como no tocante ao quórum de votação exigido, de 2/3 dos senadores (mínimo de 54 votos), que deveria ser respeitado.

O presidente descartou a preclusão do destaque, mas adiantou de viva voz a necessidade de quórum de 2/3 dos votos para a sua aprovação. Estavam em curso, portanto, as pedaladas jurídicas de Lewandowski.

Voltemos ao caso Collor tomado como precedente jurídico para aprovação daquele destaque. Naquela ocasião, o então presidente renunciou ao mandato quando percebeu que seria cassado com inabilitação a cargo público por oito anos. Mas o Senado, ainda assim, o inabilitou à perda de direitos políticos por oito anos, dado que o agente político continuava ativo e a renúncia poderia fazê-lo escapulir incólume de qualquer sanção imposta pela pena máxima a que estava sujeito.

O ex-presidente recorreu daquela condenação ao STF, que bateu o martelo e a manteve, tal como subscrita no texto constitucional de cassação de mandato com inabilitação para o exercício de cargo público por oito anos, desconsiderando-se, no caso, a perda do mandato pela vacância do cargo, em razão de sua renúncia.

A pena em questão só poderia ser descartada, na hipótese de vacância do cargo pelo impedimento definitivo do agente político (em caso de morte, por exemplo). Fato que não houve no caso de Collor; nem no caso de Dilma tampouco. Assim, cai por terra o precedente jurídico-político do julgamento de Collor para justificar as pedaladas jurídicas no impeachment de Dilma.

Na pena de cassação de mandato, a ré foi condenada por 61 votos a favor e 20 contra; no julgamento de inabilitação para o exercício de cargo público por oito anos, a ré foi absolvida por 42 votos a favor e 36 contra, além de 3 abstenções, não obtendo, assim, os 54 votos requeridos para tal façanha. E tome pedalada: uma única pena em que se pune e se absolve simultaneamente e sem quórum qualificado para subsidiá-la.

A manobra do Senado, conduzida pelo presidente do STF, em conluio com Renan e outros, foi considerada uma séria agressão à CF, à unanimidade, pelos juristas de bem do País.

Especula-se que o STF pode tentar lavar as mãos a esse respeito, ao admitir a competência exclusiva do senado na matéria para eximir-se da apreciação do mérito no mais grave atentado à CF, desde sua edição, em 1988. Se essa banda tocar, porém, o País poderá ficar à deriva, também no terreno jurídico-institucional.

A atuação dos tribunais superiores do Judiciário, que não é lá muito bem vista pela sociedade, poderá ficar ainda mais comprometida caso as pedaladas jurídicas venham a ser chanceladas pelo pleno do STF, uma vez que abririam um sério precedente para interesses de políticos e empresários em dívida com o Judiciário, via Lava-Jato e outras operações em curso. Contudo, ainda não se tem ideia até que ponto poderá chegar.

Sabe-se com clareza que as pedaladas de Lewandowski tendem a aumentar a insegurança jurídica na celebração de contratos e no fomento a um ambiente de negócios mais saudável por parte do Poder Público, temendo-se que possam afastar ainda mais o investimento produtivo do País e agravar a crise em que estava mergulhada a economia brasileira há dez trimestres consecutivos e da qual só agora começa a se afastar.

A ministra Carmen Lúcia, pouco antes de assumir a presidência do STF, bradava por um Judiciário único, no seu poder judicante na defesa da CF. Esta posição pareceu firmada em seu discurso de posse, quando destacou a necessidade de transparência das ações do STF, em benefício da sociedade.

Certamente foi um bom sinal. Ao que tudo indica, porém, a nova presidente do STF parece sequer ter assumido a missão a que se propôs. Decorridos mais de 12 meses do impeachment de Dilma, as pedaladas do Lewandowski ainda não foram apreciadas pelo pleno do STF. E na esteira deste imbróglio outros mais vêm se sucedendo, desde aqueles ligados a críticas às delações premiadas; a vetos ao uso de condução coercitiva; às solturas de empresários e agentes públicos e políticos denunciados no âmbito da operação Lava-Jato, além de bate-bocas destemperados de ministros em sessões plenárias do STF.

Algumas dessas medidas foram tomadas às vésperas do recesso de fim de ano do judiciário, em 2017, tendo como personagem central o ministro Gilmar Mendes, recordista em medidas polêmicas e campeão de pedidos de impeachment no STF, onde já acumula oito nesse sentido, dos quais seis deles entre 2016 e 2017.

Diante desse quadro, a opinião pública espera com grande ansiedade que outros ministros não sigam nessa contenda com o ministro Gilmar, e muito menos que a ministra Carmen Lúcia, como presidente do STF, venha a receber prêmio maior, de iniquidade jurídica, em nome da suprema corte brasileira.

Leonardo Condurú é economista aposentado da BR Distribuidora.
Consultor econômico independente.
E-mail: odranoel.urudnoc@gmail.com

 

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