
Defesa das plataformas de petróleo: a soberania no mar
A defesa dessas instalações não pode ser tratada como um tema secundário ou como uma simples atribuição de vigilância da Marinha
A venda de uma empresa nacional de desenvolvimento de mísseis, como denunciou Luís Nassif em seu artigo, não é apenas um tema de soberania tecnológica. É também, de forma direta, uma questão de sobrevivência para a economia brasileira. Isso porque nosso petróleo — responsável por boa parte da arrecadação fiscal, da balança comercial e da matriz energética — está quase todo no mar. As plataformas de extração, gigantes isoladas em pleno oceano, representam um dos alvos mais óbvios e vulneráveis em qualquer cenário de conflito ou pressão internacional.
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Atacar uma plataforma não requer uma frota de guerra. Pequenas embarcações rápidas, drones navais ou até mesmo mísseis antinavio lançados a partir de distâncias médias podem interromper a produção de milhões de barris, causar danos ambientais irreparáveis e colocar em risco centenas de trabalhadores. Por isso, a defesa dessas instalações não pode ser tratada como um tema secundário ou como uma simples atribuição de vigilância da Marinha. Trata-se de um ponto nevrálgico da soberania nacional.
A experiência da Lei do Abate, sancionada no governo FHC e regulamentada na gestão Lula, já nos mostrou que é possível criar protocolos claros de defesa, compatíveis com a legalidade internacional e com a proteção da vida humana. Aviões que invadem o espaço aéreo brasileiro são inicialmente identificados, advertidos e apenas em último caso abatidos. Nada impede que modelo semelhante seja aplicado no ambiente naval, especialmente em torno das zonas de produção offshore. Embarcações sem transponder ou que se aproximem de áreas restritas poderiam ser submetidas a um protocolo escalonado: identificação, advertência, dissuasão e, se necessário, neutralização.
Mas a dissuasão não pode depender apenas da presença eventual de um navio-patrulha. As plataformas precisam de meios próprios, ainda que limitados, de autodefesa. Isso inclui sensores locais, drones de vigilância, sistemas de comunicação redundantes e, sobretudo, armamento de ponto capaz de deter embarcações hostis de pequeno porte. Não se trata de transformar plataformas em fortalezas flutuantes, mas de lhes dar tempo e capacidade de resistir até que cheguem reforços navais ou aéreos.
A defesa deve ser pensada em camadas, como uma cebola. A camada mais externa envolve satélites, radares costeiros e aeronaves de patrulha de longo alcance, capazes de detectar ameaças antes mesmo de se aproximarem da zona econômica exclusiva. Em seguida, navios de patrulha e fragatas garantem a presença dissuasória e o poder de fogo contra embarcações maiores. Submarinos, silenciosos e furtivos, acrescentam uma dimensão estratégica de negação de área. Nas próprias plataformas, armas defensivas e protocolos de isolamento asseguram a sobrevivência dos trabalhadores e a continuidade mínima das operações. Por fim, uma camada dedicada exclusivamente ao resgate e à evacuação, com helicópteros e aeronaves de transporte, deve garantir que vidas civis não sejam sacrificadas em nome da produção.
Em cada uma dessas camadas, contudo, a questão da autonomia tecnológica se impõe. Sem soberania sobre os mísseis antinavio, sobre os sistemas de sensores e sobre a integração de comando e controle, o Brasil corre o risco de descobrir, em plena crise, que não tem acesso aos equipamentos de que mais precisa. Dependência em defesa significa vulnerabilidade estratégica. É por isso que a venda de uma empresa como a SIATT não pode ser tratada como simples transação de mercado. O que está em jogo é a capacidade de proteger o coração energético e financeiro do país.
Defender as plataformas é defender a soberania. Significa garantir que a decisão sobre interromper ou não a produção de petróleo em águas brasileiras estará sempre em mãos brasileiras — e não à mercê da vontade de terceiros. Essa é a verdadeira linha divisória entre ser um país autônomo ou um protetorado de luxo.
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