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Marcelo P. F. Manzano

Mercado fareja o fim da farsa golpista e se desespera

O economista Marcelo Manzano, professor de Economia da Facamp, critica a histeria que o chamado "mercado" tem patrocinado nos últimos dias ao pe

Publicado em 08/12/2017
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O economista Marcelo Manzano, professor de Economia da Facamp, critica a histeria que o chamado "mercado" tem patrocinado nos últimos dias ao perceber que o governo de Michel Temer vai caminhando para o fim sem conseguir lhes entregar a reforma da Previdência; "Como se sabe, a saliva aflora na boca do rentismo ao enxergarem na reforma previdenciária a possibilidade de abocanharem três grandes e apetitosos benefícios: 1) mais recursos fiscais para arcar com o pagamento dos serviços da dívida pública; 2) menor pressão pelo aumento de impostos, principalmente aqueles que deveriam incidir sobre o capital e que no Brasil são quase inexistentes; 3) abertura de um imenso mercado para a venda de planos de previdência privada", diz ele.

Tenho a impressão que as coisas vão melhorar. Pelo menos é isso que posso deduzir da histeria que o tal “mercado” tem patrocinado nos últimos dias ao perceber que o governo golpista vai caminhando para o fim sem conseguir lhes entregar o “prime rib”, isto é, a Previdência Social. Como se sabe, a saliva aflora na boca do rentismo ao enxergarem na reforma previdenciária a possibilidade de abocanharem três grandes e apetitosos benefícios: 1) mais recursos fiscais para arcar com o pagamento dos serviços da dívida pública; 2) menor pressão pelo aumento de impostos, principalmente aqueles que deveriam incidir sobre o capital e que no Brasil são quase inexistentes; 3) abertura de um imenso mercado para a venda de planos de previdência privada.

Não por outro motivo, impressiona o caminhão de bobagens que foram ditas pelos repetidores de sinal espalhados pelos grandes grupos de mídia que controlam a opinião pública nesse quintal sul-americano. Um movimento coordenado, preciso e fiel à batuta do maestro “mercado” tratou de disseminar palpites sobre a tragédia que nos aguarda em 2060 (sic) caso o Congresso não aprove a Reforma da Previdência – now!

Nesse jogo combinado – turbinado inclusive com relatórios saídos das gavetas de instituições multilaterais como a OCDE e o Banco Mundial – a Secretaria do Tesouro Nacional (STN) botou na roda um documento de apenas dezesseis páginas no qual trata não somente de nos apresentar uma síntese rasteira dos números recentes mas, principalmente, de nos contar o que seus modelos econométricos nos contam a respeito das próximas quatro décadas e dois anos.

São muitas as barbaridades que pipocam na obra de futurologia da STN. A começar que para traçarem as suas projeções catastróficas para o longínquo ano de 2060 não nos contam qual a métrica utilizada para calcular a evolução do PIB – em tempo: quem souber de alguma métrica de projeção do PIB para 2020, favor mandar mensagem in box. Além disso, depois de descobrirem que serão necessários mais 8,5% de carga tributária sobre o PIB para arcar com os custos previdenciários em 2060 (sic), dizem que isso significa que teremos de optar entre cortar as despesas de outras áreas prioritárias ou aumentar os impostos.

Ora, ora, Srª Secretária do Tesouro Nacional. Será que essas contas fazem algum sentido? Comecemos pelo mais fácil: as despesas com juros, as quais simplesmente não aparecem no radar de vocês. Nos últimos vinte anos os encargos com os serviços da dívida (amplamente influenciados pela taxa Selic) mantiveram-se entre 6 e 8% do PIB. Se formos capazes de desarmar essa bomba nos próximos anos – e não décadas! – eliminaremos a mais pesada canga que estrangula as contas públicas brasileiras. Assim, no percurso até 2060, imagino que poderíamos reduzir essa despesa com tranquilidade a uns 2% do PIB. Na boa, sobrariam aí algo mais que 200 bilhões de reais por ano (3% a 4% do PIB) que poderiam então transitar do bolso dos rentistas (0,1% da população que vive de juros) para o financiamento da seguridade social (em benefício de quase todo o resto).

Mas, sabendo que essa turma não gosta muito de falar em taxa de juros, vamos a outros números. Por exemplo, a Desvinculação das Receitas da União (DRU) que autoriza o repasse de até 30% dos recursos da seguridade para o caixa do governo federal. Apenas no ano passado vazaram por esse buraco 92 bilhões de reais (1,5% do PIB). Já pela via das renúncias fiscais, foram outros 57 bilhões de reais (1% do PIB), quatorze dos quais decorrentes da política de desoneração da folha de pagamentos e mais onze relativos às isenções das instituições filantrópicas (igrejas, clubes de futebol, entidades sociais e educativas, Santas Casas, etc).

Já o setor do agronegócio, agraciado por Deus e por recorrentes rodadas de perdão das dívidas do pouco que não paga, obteve isenções adicionais que alcançaram seis bilhões de reais, apenas a título de incentivo às suas exportações.

Em paralelo, nunca é demais lembrar que urge no país implantar um tributo sobre os dividendos (lucros das empresas transferidos para acionistas). O Brasil é o único país do G-20 que não cobra esse tipo de imposto. Segundo cálculos do economista do IPEA, Sérgio Gobetti (leia aqui), com uma alíquota em torno de 15%, somente este tributo geraria uma receita da ordem de 50 a 60 bilhões de reais (+1% do PIB), parte dos quais poderiam ser muito justamente empregados como fonte de financiamento da seguridade social. Já a CPMF, outro tributo que foi sabotado pela maioria do Congresso Nacional e que arde no bolso dos rentistas, devolveria ao orçamento da seguridade social algo próximo de quarenta bilhões de reais adicionais por ano (+0,7% do PIB).

Pelo lado das despesas, há sérios problemas relacionados à classificação de gastos públicos que não correspondem propriamente a despesas com seguridade social. São os casos, por exemplo, dos gastos dos entes governamentais com encargos de seus servidores públicos (isto é, o equivalente à contribuição patronal do Regime Geral de Previdência) ou ainda das despesas com os funcionários do sistema de seguridade. Tais gastos representam custeio da máquina pública (que tem diversas outras finalidades) e de maneira alguma deveriam ser lançados como despesas equivalentes aos benefícios pagos pela seguridade social.

Outro caso parecido e de grande relevância diz respeito às despesas com pensões e reformas dos militares. No ano de 2016, apenas essa rubrica gerou um “déficit” de 34,1 bilhões de reais (0,5% do PIB), o que significa uma despesa bastante alta, principalmente se considerarmos que o “déficit” total com o Regime Público de Previdência Social (que abarca cerca de onze milhões de servidores civis em todos os níveis de governo e nas três esferas de poder) foi de 43,1 bilhões de reais. Entretanto, o que ocorre também aqui é que a despesa com militares reformados e seus familiares talvez não devesse ser enquadrada como um item da seguridade social. Os pagamentos de benefícios diferenciados a profissionais das Forças Armadas não apenas decorrem das especificidades das carreiras militares, como respondem a demandas derivadas da estratégia de segurança nacional. Por isso, pareceria muito mais lógico que tais despesas estivessem claramente vinculadas ao orçamento da Defesa Nacional.

Ou seja, tanto do ponto de vista das receitas, quanto das despesas, há um razoável número de ajustes que podem e devem ser implementados antes de se mexer no coração do Regime Geral de Previdência Social. O problema está longe de ser a idade mínima, o valor pago à vasta maioria dos beneficiários ou o tempo de contribuição. Começar a reforma pela ponta errada não é apenas um equívoco, mas um claro indício de que o que motiva os reformadores golpistas são outros interesses.

Marcelo P. F. Manzano é economista e professor de economia da Facamp (Faculdades de Campinas)

FONTE: Brasil 247

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