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Edoardo Pacelli

O verdadeiro desafio acontece nas matérias-primas

No século 21, o que domina as estratégias geopolíticas é, sobretudo, a necessidade de encontrar recursos que são hoje fundamentais para a tecnologia, o armamento e o bem-estar.

Publicado em 20/05/2024
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Cobre, petróleo, borracha natural, titânio, gás, urânio, terras raras, tungstênio, fósforo, alumínio, manganês, cobalto… Estas são algumas das matérias-primas que a Europa considera “críticas”: uma lista de 34 bens dos quais o velho continente necessita, mas não produz. Onde se encontram esses? Cada vez mais em países com os quais a tradição de relações comerciais não está bem consolidada, ou que se situam em zonas instáveis, potencialmente pouco fiáveis e arrastadas pelos interesses das diversas potências.

Para o Ocidente, esta é uma questão crucial: o fornecimento destas matérias-primas é fundamental para o bem-estar, para o progresso tecnológico, transição ecológica, missões aeroespaciais e para os armamentos. Portanto, compreender onde se encontram, em abundância, esses bens, que se tornaram tão preciosos, é uma forma de ler o presente e o futuro da Europa e, também, de interpretar as relações entre as potências. Especialmente quando se tornam (ou correm o risco de se tornarem) conflitantes. Guerras econômicas e batalhas reais, golpes de estado, ações de espionagem, infiltrações através de contratos milionários: da mesma forma, hoje se combate o desafio global entre drones e minas, foguetes e exportações, embargos e bombas.

O jornalista e o analista financeiro italianos Paolo Gila e Maurizio Mazziero criaram um guia para orientação na “geopolítica das matérias-primas”, que, afirmam os autores, é “o verdadeiro desafio estratégico do século 21”. Trata-se do livro Mapas do Tesouro, um ensaio repleto de dados e informações, não apenas sobre a produção, mas, igualmente, sobre as reservas desses bens tão cobiçados. Porque o verdadeiro jogo será jogado no futuro: por exemplo, hoje os Estados Unidos são o maior produtor de petróleo do mundo; mas é a Arábia Saudita que possui os maiores depósitos, e é a Venezuela que possui as maiores reservas do mundo (mais de 300 bilhões de barris). Apenas um país da zona ocidental, o Canadá, possui grandes reservas ainda a serem exploradas.

Para termos um exemplo do que pode acontecer, basta pensar no gás natural, cujos principais produtores são os EUA, a Rússia e o Irã. A China ocupa o quarto lugar em termos de produção, mas necessita de enormes importações, tal como a União Europeia. Esta última sempre obteve abastecimento da Rússia, mas, após a guerra na Ucrânia, o fluxo foi interrompido. Resultado: não só a Europa teve de encontrar outros fornecedores, mas a Rússia mirou o leste para vender o seu gás. A mesma situação acontece com o trigo e com o aumento dos preços dos produtos agrícolas, causado pelo conflito entre a Rússia e a Ucrânia. A produção na região do Mar Negro atingiu níveis tais que prejudicarão todo o equilíbrio global se essas quantidades não conseguirem chegar aos mercados. Não só isso: “Os bens agrícolas, como os combustíveis, os metais e as terras raras, tornaram-se também ativos estratégicos adequados para utilização como armas de pressão geopolítica”. Por exemplo, a escassez de cereais em alguns países, como a Nigéria, o Sudão do Sul, a Somália ou a Etiópia, pode causar fome e instabilidade política, provocando a inserção, quer de milícias privadas, fornecimento de armas, ou da criação de novas esferas de influência. Nos últimos anos, a China e a Rússia tiraram vantagem disso, mas o Ocidente, bem menos.

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Nesta perspectiva de alianças e equilíbrios, destacam-se ainda os países “inesperados”. É o caso da Austrália, que, “com suas minas de urânio, seus portos e a possibilidade de controlar os fluxos dos navios mercantes e das forças navais chinesas, é um ponto estratégico avançado”. Ou a República Democrática do Congo, o maior produtor mundial de cobalto e dono de uma imensa reserva de muitas matérias-primas, incluindo diamantes e petróleo.

Cobalto significa (junto com o lítio, encontrado principalmente na Austrália e no México) baterias para carros elétricos e baterias para smartphones, tablets, PCs e câmeras digitais. Em suma, todo o nosso mundo tecnológico. A China comprou muitas reservas, antecipadamente, para aproveitar as necessidades futuras de cobalto; os Estados Unidos responderam com uma “batalha híbrida”, ainda em curso, no país africano.

E ainda há a Groenlândia, com o seu potencial para terras raras sob o permafrost – isto é, todo aquele terreno que tenha permanecido congelado durante pelo menos dois anos, formado por terra, rochas e sedimentos amalgamados em um todo pelo gelo, agindo como cimento – que atrai a China e a Rússia. As terras raras são utilizadas nos campos industrial, militar e tecnológico, das telas tácteis aos drones, dos LCD às turbinas eólicas. O fato de Pequim deter praticamente o monopólio sobre essas permitiu que os chineses as utilizassem como arma geopolítica já em 2010, contra o Japão, e é uma das razões subjacentes à disputa, em curso, sobre Taiwan.

Finalmente, na geopolítica do futuro, os bens do passado não devem ser subestimados (como também ensina a questão do trigo). É o caso do carvão antigo, que a Europa gostaria de eliminar, mas do qual foram extraídas mais de 8 bilhões de toneladas em 2022 – armazenamento recorde histórico – porque para a China, a Índia, a Indonésia e todos os países que buscam um maior desenvolvimento representa uma fonte fundamental de energia.

É, igualmente, o caso do ouro, que a China acumula com o objetivo mal disfarçado de substituir o dólar no seu papel no mercado global, e do ferro, que, em termos de produção (duplicou nos últimos 20 anos) e de procura, é “um metal dividido, igualmente, entre as duas partes do mundo que competem para afirmar, cada uma, uma nova ordem mundial”. Mas prestem atenção: no setor do aço a corrida já terminou, e a China já está dominando. A Europa, entretanto, recorreu à reciclagem!

Edoardo Pacelli é jornalista, ex-diretor de pesquisa do CNR (Itália), editor da revista Italiamiga e vice-presidente do Ideus.

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