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Edoardo Pacelli

Os projetos de gás africanos da Europa estão sob fogo

A Europa, um dos maiores consumidores de gás russo, está lutando para encontrar alternativas africanas enquanto a Rússia ameaça fechar perman

Publicado em 27/07/2022
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A Europa, um dos maiores consumidores de gás russo, está lutando para encontrar alternativas africanas enquanto a Rússia ameaça fechar permanentemente as torneiras. O fornecimento de gás da Rússia para a Alemanha através do gasoduto Nord Stream 1 foi interrompido para a manutenção de rotina, na semana passada, e retomado somente nesta sexta-feira. Moscou já cortou o fornecimento de gás natural para Polônia, Finlândia e Bulgária, que recusaram a exigência da Rússia que esse fornecimento fosse pago em rublos. A Associação da Indústria da Baviera prevê que a Alemanha pode perder quase 13% de seu desempenho econômico, no segundo semestre deste ano, caso o gás russo pare de fluir.

Enfrentando uma crise de energia, o chanceler alemão, Olaf Scholz, foi ao Senegal, em maio, para conferir e explorar o desenvolvimento de um campo de gás que deve ser inaugurado no próximo ano. Diplomatas da União Europeia iniciaram conversas com autoridades nigerianas, em abril, buscando explorar o país como um fornecedor alternativo de gás. Enquanto isso, a Itália fechou acordos com Argélia, Angola e a República do Congo.

Neste mês de julho, o presidente italiano, Sergio Mattarella, visitou a capital moçambicana de Maputo para discutir a colaboração energética. A empresa italiana de energia, Eni, anunciou recentemente que a sua plataforma flutuante de gás natural liquefeito (GNL) na costa da província de Cabo Delgado, que está sendo atormentada pelos insurgentes de Moçambique, deverá atingir sua primeira carga de GNL no segundo semestre de 2022.

À medida que a Europa luta por suprimentos de energia, observadores e os próprios africanos denunciam o que consideram hipocrisia energética, considerando que a maioria dos países africanos vive sob escassez regular de energia e é severamente impactada pelas mudanças climáticas. Os governos africanos têm procurado desenvolver novos projetos de combustíveis fósseis para atender às necessidades locais, mas os governos ocidentais exigiram que credores multilaterais, como o Banco Mundial, parem de financiar esses projetos para obrigar os países a reduzir as emissões globais de carbono.

"Nossos países não podem alcançar uma transição energética e abandonar os padrões poluentes dos países industrializados sem uma alternativa viável, justa e equitativa", disse o presidente senegalês Macky Sall em um discurso desafiador, na reunião ocorrida no ano passado, da Assembleia Geral da ONU. "Parar de financiar o setor de gás... seria um grande obstáculo."

Um relatório divulgado na semana passada sugere que alguns países africanos terão que cortar gastos públicos, em outros setores para cobrir o custo de adaptação a um planeta em aquecimento, o que eclipsará seus gastos para a saúde. Todo o continente é responsável por apenas 3% das emissões globais de carbono. Esse número seria muito menor caso a África do Sul, o maior emissor de carbono da África, seja excluída do cálculo. O europeu médio usa além de seis vezes mais eletricidade do que o consumidor africano médio.

O vice-presidente da Nigéria, Yemi Osinbajo, numa recente entrevista dada à Economist, acusou a Europa por sua insistência para que as nações mais pobres congelem suas emissões de carbono, o que os países mais ricos, em termos reais, não se comprometeram a fazer. Os líderes africanos dizem que esses pedidos equivalem a um desejo de manter o continente pobre.

Um argumento contra a industrialização dependente de combustíveis fósseis é o que concerne à África do Sul, onde cortes de energia programados, conhecidos como "descarga de carga", podem aumentar dez vezes, até 2026, a menos que o país adicione fontes de energia renováveis, de acordo com um estudo da Meridian Economics, empresa de consultoria econômica especializada, que fornece suporte à decisão executiva, consultoria estratégica e habilidades analíticas.

A estatal Eskom, cujas antigas usinas de carvão se tornaram não confiáveis, fornece 90% da energia do país. Na conferência climática da ONU, COP26, no ano passado, as nações ocidentais prometeram US$ 8,5 bilhões para ajudar o país a se converter para energia mais verde.

Porém, Verner Ayukegba, vice-presidente sênior da Câmara Africana de Energia, com sede em Joanesburgo, aponta que a África do Sul deveria explorar todo um mix de fontes de energia, incluindo gás, porque, embora as fontes mais verdes sejam importantes, são as populações que vivem com as luzes acesas, em Nova York ou Londres, que têm o luxo de pensar em energia renovável. "Se você está numa maternidade, em um hospital nos arredores de Maiduguri [no norte da Nigéria], realmente não importa se seu hospital é movido a carvão. (...) O que você precisa é de energia", disse ele.

Apesar de a Nigéria ser o segundo maior produtor de petróleo da África, 85 milhões de nigerianos – quase metade da população do país – vivem sem eletricidade. A Nigéria tem as maiores reservas de gás conhecidas na África e, devido à invasão da Ucrânia pela Rússia, viu o renascimento de projetos paralisados, como o gasoduto transaariano, que atravessaria o norte da Nigéria até o Níger e a Argélia e depois para a Europa.

Ayukegba argumenta que os governos africanos precisam se concentrar em investimentos, em infraestrutura para os mercados locais e não para os mercados europeus e asiáticos. Ele observou que, como a guerra Rússia-Ucrânia empurrou os preços do petróleo, originalmente previstos de US$ 50 a US$ 70 por barril, acima de US$ 120 o barril, a Nigéria obteve lucros inesperados significativos, este ano, que, ele argumenta, devem ser direcionados para investimentos em infraestrutura e para as necessidades locais de eletricidade.

"Uma coisa que precisamos começar a analisar é: qual será a demanda senegalesa por energia? Qual será a demanda regional africana por energia?" ele afirmou. "Devemos olhar para nós mesmos e dizer quais são as prioridades que queremos alcançar caso queiramos desenvolver a capacidade de energia no continente?"

Ayukegba imaginou um acordo como aquele que criou a Área de Livre Comércio Continental Africana com "um foco maior, nesse sentido, no investimento, e não apenas no comércio". Por exemplo, o Banco Africano de Exportação e Importação assinou recentemente um memorando de entendimento com a Organização Africana de Produtores de Petróleo com o objetivo de criar um banco de energia para apoiar projetos de petróleo e gás novos e existentes.

Tal como está, os países do Norte de África são os únicos em condições de se beneficiar, imediatamente, de um aumento dos negócios de gás europeus.

Edoardo Pacelli é jornalista, ex-diretor de pesquisa do CNR (Itália), editor da revista Italiamiga e vice-presidente do Ideus.

Fonte: Monitor Mercantil

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