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Thierry Meyssan

Preparação de uma nova Guerra Mundial

Os Estados Unidos pressionam os seus aliados da União Europeia a fim de se prepararem para uma Terceira Guerra mundial.

Publicado em 11/04/2023
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Se quiserem sair vitoriosos da « armadilha de Tucídides », eles não têm outra escolha a não ser travá-la. A menos que toda essa agitação seja apenas uma encenação para «manter» os aliados no seu lugar quando muitíssimos Estados, na América do Sul, em África e na Ásia, se declaram « neutrais ». Ao mesmo tempo, o ruído das botas agita os militaristas japoneses que, tal como os « nacionalistas radicais » da Ucrânia, estão de regresso.

Face aos progressos feitos pelos partidários de um mundo multipolar, os defensores do «imperialismo americano» não demoraram a reagir. Duas operações serão aqui analisadas : a transformação do Mercado Comum Europeu numa estrutura militar e a reformulação do Eixo da Segunda Guerra Mundial. Este segundo aspecto faz entrar em jogo um novo actor : o Japão.
A metamorfose da União Europeia

Em 1949, os Estados Unidos e o Reino Unido criam a Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN). Aí, eles colocam o Canadá e os Estados que libertaram na Europa Ocidental. Trata-se para eles, não de se defender, mas de preparar um ataque à União Soviética. Esta responde criando o Pacto de Varsóvia.

Em 1950, aquando da Guerra da Coreia, os Estados Unidos consideram alargar o conflito à República Democrática Alemã (chamada « Alemanha Oriental »). Para isso, têm que rearmar a República Federal Alemã (chamada « Alemanha Ocidental »), apesar da oposição da França, da Bélgica e do Luxemburgo. Portanto, eles propõem a criação de uma Comunidade Europeia de Defesa (CED), mas falham perante a resistência dos gaullistas e dos comunistas franceses.

Paralelamente, eles ajudam à reconstrução da Europa Ocidental com o Plano Marshall. Este inclui muitas cláusulas secretas, entre as quais a construção de um mercado comum europeu. Washington pretendia simultaneamente dominar economicamente a Europa Ocidental e preservá-la politicamente da influência comunista e do imperialismo soviético. As Comunidades Económicas Europeias ---e mais tarde a União Europeia--- formam a face civil da ficha dos EUA, cuja face militar é a OTAN. A Comissão Europeia não é uma administração de Chefes de Estado e de Governo membros da UE, mas, realmente, a interface entre eles e a Aliança Atlântica. As normas europeias em matéria não só de armamento e construção, mas também de equipamento, de vestuário e de alimentação, etc. são estabelecidas pelos serviços da OTAN, primeiro no Luxemburgo, depois na Bélgica. São transmitidas à Comissão e hoje em dia aprovadas pelo Parlamento Europeu.

Em 1989, quando a União Soviética está em vias de afundar sobre si própria, o Presidente francês, François Mitterrand, e o Chanceler alemão, Helmut Köhl, pensam libertar a Europa Ocidental da tutela norte-americana de maneira a poder rivalizar com Washington. As negociações deste tratado tem lugar em simultâneo com o fim da ocupação quadripartida da Alemanha (12 de Setembro de 1990), a reunificação das duas Alemanhas (3 de Outubro de 1990) e a dissolução do Pacto de Varsóvia (1 de Julho de 1991). Washington aceita o Tratado de Maastricht desde que ele reconheça o seu domínio militar. Os Europeus Ocidentais aceitam este princípio.

No entanto, Washington desconfia do par Mitterrand-Köhl e no último momento exige que a União Europeia integre todos os antigos membros do Pacto de Varsóvia, até mesmo os novos Estados independentes, saídos da antiga União Soviética. Estes Estados não partilham as aspirações dos negociadores de Maastricht. Até desconfiam muito mais deles. Pretendem livrar-se tanto da influência alemã como da russa. Para sua defesa remetem-se apenas ao «guarda-chuva americano».

Em 2003, Washington aproveita a presidência espanhola da UE (o socialista Felipe González) e do Alto Representante para a Política Externa e de Segurança Comum, Javier Solana, para fazer adoptar a «Estratégia Europeia de Segurança», decalcada da National Security Strategy do Presidente norte-americano, George W. Bush. Este documento é revisto em 2016 pela Alta Representante Federica Mogherini.

Em 2022, durante a guerra da Ucrânia, os Estados Unidos, tal como durante a guerra da Coreia, pensam ter de novo necessidade de rearmar a Alemanha contra a Rússia (sucessora da URSS). Eles transformam pois a UE, com cuidado desta vez. Durante a presidência do Francês Emmanuel Macron, propõem-lhe uma «Bússola Estratégica». Esta só é adoptada um mês após a intervenção russa na Ucrânia. Os membros da União Europeia estão de tal maneira bloqueados que continuam sem saber exactamente se estão juntos para cooperar ou para se integrar (a «ambiguidade construtiva», segundo a expressão de Henry Kissinger).

Em Março de 2023, o actual Alto Representante da União Europeia para os Negócios Estrangeiros (Relações Exteriores-br) e a Política de Segurança, Josep Borrell, organiza o primeiro « Fórum Robert Schumann sobre Segurança e Defesa ». Nele participam muitos Ministros da Defesa e dos Negócios Estrangeiros dos Estados Membros da União. Além dos Estados europeus não-membros da União, mas que são pró-EUA, muitos outros estão aí representados a nível ministerial, como Angola, Gana, Moçambique, Níger, Nigéria, Ruanda, Senegal, Somália, Egipto , Chile, Peru, Geórgia, Indonésia e Japão. Além da OTAN, a ASEAN, o Conselho de Cooperação do Golfo e a União Africana também se fazem aí representar. A Liga Árabe envia até o seu Secretário-Geral.

Este Fórum tem o propósito explícito de defender o « multilateralismo e uma ordem internacional baseada em regras » ; uma maneira elegante de denunciar o Projecto russo-chinês de um « mundo multipolar baseado no Direito Internacional ».

Graças à epidemia de Covid, a União Europeia já se dotou de poderes em matéria de Saúde que não estavam previstas nos Tratados. Expliquei no início desta epidemia que a medida de confinamento das pessoas sãs não tinha nenhum precedente na História. Ela foi pensada, a pedido do antigo director do laboratório Gilead Scien e do antigo Secretário da Defesa, Donald Rumfeld, pelo Doutor Richard Hatchett, que se tornou director do CEPI (Coalition for Epidemic Preparedness Innovations) e, a esse título, iniciador desta medida no mundo inteiro [1]. Segundo o seu relatório classificado de 2005, que infelizmente apenas conhecemos através das reacções que suscitou, o confinamento de civis saudáveis em casa devia permitir determinar os empregos a ser deslocalizados, fechar indústrias de bens de consumo no Ocidente e concentrar a força de trabalho na indústria de Defesa. Ainda não chegamos lá, mas tendo se apoderado a União Europeia de atribuições de Saúde Pública não previstas pelos Tratados, sem despertar indignação, ela faz agora interpretações dos textos para se tornar uma potência militar.

Na semana passada, durante o Fórum Schuman, Josep Borrell apresentou o seu primeiro relatório sobre a aplicação da «Bússola Estratégica». Trata-se de coordenar a agregação dos Exércitos nacionais, incluindo os Serviços de Inteligência, num espírito de integração e já não mais de cooperação. O projecto de Emmanuel Macron enterra agora o de Charles De Gaulle e dos comunistas franceses. A «Europa da Defesa» aparece agora como um slogan (eslogan-br) visando não só colocar as Forças operacionais dos Estados-Membros da UE sob a autoridade do Comandante Supremo Aliado na Europa (SACEUR), hoje o General norte-americano Christopher G. Cavoli, mas também tomar o controlo de todas as decisões de financiamento que incumbiam até aqui aos Parlamentos nacionais, e mesmo as decisões sobre armamento e organização que pertenciam aos Executivos dos Estados-Membros. Assim, a União está em vias de organizar um Exército comum sem saber quem o vai comandar.

A reconstituição do Eixo nazi-nipónico

Quando pensamos na Segunda Guerra Mundial, evocamos na Europa as datas de 1939 e 1945. Isto é absolutamente falso. A guerra começou em 1931, após o ataque pelos generais japoneses aos militares chineses na Manchúria. Tratou-se da primeira ultrapassagem do Poder civil japonês pela facção militarista que se amplificou alguns meses mais tarde com o assassinato do Primeiro-Ministro civil por um grupo de militares. Em poucos anos, o Japão transformou-se numa potência militarista e expansionista. Esta guerra não terminou com a libertação da Manchúria pelo Exército Vermelho, em 1945. Com efeito, os Estados Unidos utilizaram duas bombas atómicas para impedir a rendição do Japão à URSS e assegurar que ela só teria lugar perante seus próprios generais. Eles continuaram os combates até 1946 porque muitos Japoneses recusaram render-se aos Norte-Americanos que só se haviam batido até aí no Pacífico. A Segunda Guerra Mundial durou, pois, de 1931 a 1946. Se cometemos estes erros de datação, é porque ela só se mundializou com o Eixo Roma-Berlim-Tóquio (o «Pacto Tripartido»), a que a Hungria, a Eslováquia, a Bulgária e a Roménia rapidamente se juntaram.

O fundamento do Eixo não foi o dos díspares interesses dos seus membros, mas o seu culto da Força. Para o retomar hoje em dia, é preciso voltar a juntar aqueles que partilham esse mesmo culto.

Quando os Estados Unidos ocuparam o Japão, em 1946, eles pensaram primeiro em expurgar todos os elementos militaristas. Mas assim que sobreveio a Guerra da Coreia, decidiram apoiar-se no Japão para lutar contra o comunismo. Puseram fim aos julgamentos em curso e reabilitaram 55. 000 altos funcionários. Colocaram em marcha o plano Dodge, equivalente do Plano Marshall na Europa. Entre os felizes contemplados por essa mudança de política, Hayato Ikeda tornou-se o Primeiro-ministro e restaurou a economia do país. Com a ajuda da CIA, ele fundou o Partido Liberal-Democrata. Foi da sua corrente, do seu seio, que saíram o Primeiro-Ministro Shinzo Abe (2012-20) e o seu sucessor Fumio Kishida (2020-).

Este último acaba de efectuar uma visita surpresa à Ucrânia. É o primeiro Chefe de Governo asiático a visitar este país depois do início da guerra. Ele visitou uma vala comum em Bucha e transmitiu as suas condolências às famílias das vítimas dos « crimes russos ». A maior parte dos analistas interpretam esta viagem como uma preparação da próxima Cimeira (Cúpula-br) do G7 no Japão. A menos que tal não vá muito mais longe.

No seu comunicado final, Fumio Kishida e Volodymyr Zelensky sublinharam « a inseparabilidade da segurança euro-atlântica e indo-pacífica » e « a importância da paz e da estabilidade no Estreito de Taiwan ». Trata-se para eles, não só de defender a Ucrânia face à Rússia, mas também o Japão face à China. Este comunicado lança as bases de uma nova aliança entre os sucessores dos nazis, que são os « nacionalistas integralistas » ucranianos [2], e os sucessores do nacionalismo Showa. A Ucrânia actual é o único Estado no mundo a dispor de uma Constituição explicitamente racista. Adoptada em 1996 e revista em 2020, ela especifica no seu Artigo 16.º que «Preservar o património genético do povo ucraniano é da responsabilidade do Estado». Este Artigo foi redigido pela viúva do Primeiro-Ministro ucraniano nazi, Yaroslav Stetsko.

Pelo contrário, a Constituição japonesa estabelece a renuncia à guerra no seu Artigo 9. Mas Shinzo Abe e Fumio Kishida iniciaram uma luta para revogar esta disposição. Ela torna, entre outras coisas, impossível a transferência de equipamento de defesa mortíferos, por isso Kishima ofereceu cerca de US$ 7,1 mil milhões (bilhões-br) em ajuda humanitária e financeira a Kiev. Quanto ao material militar não-letal, nesta semana ele apenas conseguiu anunciar o envio de um stock (estoque-br) no valor de US$ 30 milhões de dólares.

Esta nova militarização do Japão é apoiada por Washington, o qual já mudou de campo ao apoiar a Ucrânia. O Embaixador dos EUA em Tóquio, Rahm Emmanuel, twittou : « O Primeiro-Ministro Kishida efectua uma visita histórica à Ucrânia para proteger o povo ucraniano e promover os valores universais inscritos na Carta das Nações Unidas (…) A cerca de 900 quilómetros de distância, uma parceria diferente e mais nefasta toma forma em Moscovo (Moscou-br) » (alusão à Cimeira Putin-Xi).

Por seu lado, o porta-voz do Ministério chinês dos Negócios Estrangeiros, Wang Weibin, declarou a propósito da viagem do Primeiro-Ministro que « espera que o Japão faça pressão para um apaziguamento da situação, e não o inverso ». Por seu lado, a Rússia enviou dois bombardeiros estratégicos voar por cima do Mar do Japão durante cerca de sete horas.

Thierry Meyssan, intelectual francês, presidente-fundador da Rede Voltaire e da conferência Axis for Peace. As suas análises sobre política externa publicam-se na imprensa árabe, latino-americana e russa.

Fonte: https://www.voltairenet.org/article219084.html

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