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Maranhão alerta para risco de monopólios privados após venda de refinarias da Petrobrás

Diretor da AEPET mostra as graves consequências da política de desinvestimento

Publicado em 15/02/2019
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Em janeiro, a Petrobrás anunciou a retomada de sua estratégia em estabelecer parcerias com empresas privadas na área de refino. A ideia é vender a participação da estatal em plantas no Nordeste e Sul do Brasil. Enquanto isso, também em janeiro, o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (CADE), em conjunto com a Agência Nacional do Petróleo (ANP), emitiu uma nota técnica recomendando a venda das refinarias da estatal, incluindo eventualmente unidades do Sudeste. Mas não há unanimidade no setor em torno do tema.

Para o diretor da Associação dos Engenheiros da Petrobrás (AEPET), Ricardo Maranhão, os desinvestimentos nas refinarias podem ter resultados graves para o consumidor, como a concentração econômica do segmento nas mãos de empresas privadas e estrangeiras.

“Ao entregar as refinarias do Nordeste, aquela região ficará sujeita só a um determinado grupo privado. A Petrobrás ficaria com 40% de participação apenas. É a transferência de um domínio da Petrobrás para empresas multinacionais”, disse.

Assim, na visão de Maranhão, a venda dos ativos vai gerar a criação de monopólios privados regionais no Sul e Nordeste. “Além disso, negociar as refinarias não resolverá nosso problema. Hoje, o Brasil importa 400 mil barris de derivados por ano. Daqui a alguns anos, estaremos importando 1 milhão de barris. E ao vender o parque de refino da Petrobrás, o Brasil não terá agregado um barril a mais. A capacidade de refino será a mesma”, analisou o engenheiro.

Gostaria que o senhor falasse, inicialmente, da política de preços de derivados da Petrobrás.

A Petrobrás, na gestão de Pedro Parente, dando sequência com Ivan Monteiro e com o atual presidente, Roberto Castello Branco, quer vincular os preços do mercado brasileiro aos preços do mercado nacional. Esta paridade, normalmente, é estabelecida em torno de dois mercados: o europeu e do Golfo do México. Ao fazer isto, existem duas variáveis: a taxa de câmbio e o preço do petróleo e dos derivados.

O preço do petróleo e do derivado, propriamente dito, é estabelecido em um mercado sabidamente não perfeito, oligopolizado. Existe a influência da OPEP, que controla cerca de 40% da oferta de petróleo e derivados no mundo. Ainda tem a Rússia, que articula com a Arábia Saudita, já que é uma grande produtora de petróleo e gás e tem interesse nos preços elevados do barril. É um cartel que restringe a produção para fazer os preços subirem, já que suas receitas dependem muito da venda do petróleo. Então, por causa da influência desse cartel, o mercado não é perfeito.

Já em relação à taxa de câmbio, ela é volátil. Fatores como a morte de figuras políticas, uma eventual rejeição da Reforma da Previdência ou a elevação dos juros americanos, por exemplo, fazem com que o real desvalorize. A Petrobrás produz, no Brasil, com 90% ou 95% dos custos em reais. Os salários dos operadores, seus impostos e despesas são maciçamente em reais. Ou seja, não tem nada a ver com a taxa de câmbio. Ao adotar a taxa de câmbio, estamos penalizando o consumidor brasileiro em função disso.

Existem outros fatores que influenciam?

Fatores geopolíticos, como embargos e brigas políticas. Por exemplo, impor um embargo ao petróleo do Irã, terceiro maior exportador do insumo na Opep. Então, com o embargo, a oferta é restringida e o preço sobe. Há ainda os problemas climáticos. Por exemplo, se o Golfo do México sofrer um furacão, as plataformas de petróleo da região param de operar. Em suma, ao fazer a paridade internacional, você está submetendo o consumidor brasileiro a fatores climáticos, geopolíticos, taxa de câmbio e mercado cartelizado – uma série de pontos os quais não temos controle e influência.

Qual seria a saída?

Nós defendemos que a Petrobrás tem condições de vender petróleo e derivados sem a influência da taxa de câmbio e das incertezas e volatilidade desses fatores que citei. Ao ter derivados de petróleo com preços altos, teremos uma economia com pouca competitividade, já que eles são utilizados em todos os setores da economia.

Agora, o petróleo está na faixa dos US$ 55. Mas recentemente ele esteve na casa dos US$ 80. Some o preço do petróleo alto com estradas brasileiras esburacadas e pedágio elevado. O resultado foi a greve dos caminhoneiros. Além disso, temos notícias de famílias no Recife e em vários pontos no Brasil que, com a subida do preço do GLP (gás liquefeito de petróleo), estão trocando o gás por formas rudimentares, como lenha e carvão. Aumentou muito o número de incêndios e queimaduras.

Temos documentos da Associação Brasileira das Empresas de Transporte Aéreo reclamando do preço do querosene de aviação (QAV). Temos também os protestos da Confederação de Transportes, porque a greve do caminhoneiros impôs uma tabela de fretes. Em um país rodoviário, isso tem consequências desastrosas sobre o frete dos caminhões, afetando o agronegócio brasileiro. O preço do diesel é um fator determinante para a competividade do agronegócio, que é o carro-chefe da nossa economia.

A Petrobrás tem condições de praticar preços mais baixos do que os internacionais, sem prejuízos. Não estamos defendendo a venda de derivados com prejuízos. Isso gera problemas. A empresa pode praticar o preço entre seu custo e o mercado internacional, remunerando seus acionistas e gerando recursos para seus investimentos.

Qual foi a consequência desta política?

Com esta confusão de preços elevados, criou-se um discurso falso. Quando aconteceu a greve de caminhoneiros, o governo tirou alguns tributos do diesel para diminuir o preço do combustível em 30 centavos. Depois, criou o subsídio, que custou cerca de R$ 10 bilhões. Isso foi feito em um momento onde só se fala em crise fiscal.

Durante um determinado período, por mais de um ano, os senhores Pedro Parente e Ivan Monteiro reajustavam os preços quase que diariamente. Praticavam preços acima dos preços internacionais. Com isso, os importadores fizeram a festa. Trouxeram produtos do exterior mais baratos. Assim, as refinarias da Petrobrás chegaram a ter 32% de ociosidade.

Era uma situação absurda: importamos mais de US$ 10 bilhões de derivados, sendo que o país tem refinarias que receberam bilhões de dólares em investimentos. É um contrassenso. Então, o resumo desta ópera é que a política de preço com paridade no mercado internacional prejudica a Petrobrás, que perde mercado. Além disso, tira a competitividade do mercado brasileiro. E prejudica os consumidores brasileiros, que ficam sujeitos a uma baita volatilidade. Por fim, isso faz com que o país importe derivados, mantendo refinarias ociosas. Quem ganha com isso são os importadores.

Como avalia o mercado de refino hoje no país?

A Petrobrás tem 98% da capacidade de refino no Brasil. Então, em termos práticos, detém o monopólio total do refino no Brasil. Isto é uma meia-verdade. Em primeiro lugar, o monopólio não é da Petrobrás, e sim da União. A Petrobrás é executora do monopólio. É preciso distinguir o monopólio público do privado. O monopólio privado é crime nas democracias. O Brasil, em 1963, começou a se preocupar com os monopólios privados e criou o CADE. Já o monopólio público é constitucional, está no artigo 177 da Constituição. O monopólio público do petróleo é de interesse público e de segurança nacional.

O monopólio do refino não existe desde a lei 9.748 de 1997. Há mais de 21 anos, não existe legalmente o monopólio do refino do petróleo. Hoje, qualquer empresa privada pode construir refinarias no Brasil. O nosso mercado é grande, não existe impedimento legal, é moderado e tende a crescer muito. O país já é importador e deve importar ainda mais. Existem todas as condições para se fazer novas refinarias. Mas, mesmo assim, os grupos privados não construíram mais refinarias no país.

E porque essas empresas não investem no setor?

Essas empresas não o fazem porque uma refinaria requer um investimento alto. Mas não é um investimento fora do alcance de uma ExxonMobil, Chevron ou BP. Exige um certo investimento. Além disso, demora cerca de três ou quatro anos para que a refinaria comece a operar e disputar mercado com a Petrobrás. Por isso, é muito mais negócio comprar uma refinaria já existente, com os terminais e rede de dutos, e custando preços de fim de feira.

Ainda existe o cúmulo da ANP mandar um expediente ao CADE, para que o conselho recomende a venda das refinarias. Ao negociar estes ativos, implica também em vender todo o complexo: porto, rede de dutos, etc. Fazendo isto, você estará criando monopólios privados regionais. Ao entregar as refinarias do Nordeste, aquela região ficará sujeita só a um determinado grupo privado. A Petrobrás ficaria com 40% de participação apenas. É a transferência de um domínio da Petrobrás para empresas multinacionais. Nenhum grupo brasileiro deve comprar estes ativos. Esta é uma preocupação minha e da AEPET: o índice avassalador da desnacionalização da economia brasileira.

Além disso, negociar as refinarias não resolverá nosso problema. Hoje, o Brasil importa 400 mil barris de derivados por ano. Daqui a alguns anos, estaremos importando 1 milhão de barris. E ao vender o parque de refino da Petrobrás, o Brasil não terá agregado um barril a mais. A capacidade de refino será a mesma.

Qual seria a melhor solução?

Para nós, a melhor solução é que os grupos estrangeiros ou nacionais construam novas refinarias, até mesmo em parceria com a Petrobrás. O país hoje, como já disse, está importando derivados e vai importar muito mais. Se vendermos a capacidade de refino da Petrobrás, a quantidade de refinarias no país ficará a mesma. Haverá apenas transferência de propriedade. Ao construir uma nova refinaria, haverá demanda por equipamentos, gerando empregos e renda. É uma solução muito mais lógica.

Quando a política de paridade internacional de preços for consagrada e entregar os polos de refinarias do Nordeste e Sul para os grupos estrangeiros, o Estado brasileiro ficará impedido de ter controle sobre os combustíveis. [Esses grupos] querem tirar do Estado brasileiro o poder de ter um mínimo de controle de um setor estratégico e fundamental da nossa economia.

Fonte: Petronotícias

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