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Poder de Compra do Estado como Instrumento de Fomento à Inovação

Neste caso, PPI são as políticas públicas de inovação

Publicado em 11/10/2023
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No Brasil, as compras governamentais totais, incluindo as aquisições realizadas pelas empresas estatais, correspondem a cerca de 10% do PIB nacional. Como principal comprador da economia, o Estado pode utilizar seu poder de compra para estimular as atividades de inovação do setor privado e resolver desafios sociais significativos.

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O papel das compras públicas nas estratégias industriais foi reforçado nas experiências internacionais contemporâneas, que tem na pesquisa, desenvolvimento e inovação um dos seus principais eixos de política. É o que mostram os levantamentos globais, como por exemplo aqueles sintetizados nas Cartas IEDI n. 823 “Indústria 4.0: Políticas e estratégias nacionais face à nova revolução produtiva” e n. 1159 “Indicações da OCDE para Estratégias Industriais”.

O IEDI vem tratando deste tema da perspectiva do Brasil, como no caso da Carta n. 1121 “Compras Públicas de Inovação no Brasil: as recomendações do BID”, e o retoma na edição de hoje, a partir do estudo realizado pelo pesquisador do IPEA André Rauen intitulado “Strengthening Brazil’s innovation policy through public procurement”, recentemente publicado.

O principal objetivo do estudo é identificar e sistematizar todos os instrumentos de compra pública para inovação (PPI) existentes no Brasil e caracterizá-los de acordo com a lógica econômica e jurídica por trás deles.

A essência da PPI está em alavancar a demanda pública por soluções, existentes ou a serem desenvolvidas, para estabelecer um mercado de fornecedores inovadores que, por meio de contrato, tornam-se parceiros do Estado. Isso resultou, como destaca o autor, em uma nova aplicação da PPI em muitos países: políticas de inovação orientadas à missão.

Segundo o autor, as compras públicas podem assegurar uma demanda estável e robusta para a oferta privada, promovendo inúmeros objetivos socioeconômicos, incluindo a inovação. Os potenciais objetos de aquisição governamentais incluem: i) bens ou serviços comuns; ii) bens ou serviços complexos que requerem interação do sistema; iii) bens ou serviços novos para o governo; iv) serviços de P&D, prototipagem ou dimensionamento; e v) tecnologia embarcada.

Por meio da PPI, o setor público pode atender às suas necessidades a um custo mais baixo ao mesmo tempo em que promove e estimula a inovação privada. O governo usa estrategicamente sua demanda para estabelecer mercados consumidores para inovações e tecnologias específicas, impulsionando efetivamente a inovação.

De acordo com o estudo, desde a aprovação da Lei de Inovação (Lei nº 10.973) em dez/04, o Estado brasileiro passou por um profundo aprendizado institucional no apoio público formal à inovação, que culminou, no período recente, em uma série de modificações na Lei de Inovação original (Lei nº 13.243/2016 e Decreto nº 9.283/2018) e no estabelecimento de novas regulamentações legais, com a Nova Lei de Licitações e Contratos – NLBC (Lei nº 14.133/2021) e o novo Marco Legal das Startups (Lei Complementar nº 182/2021), bem como em outras normas.

Estas mudanças legais resultaram em avanços substanciais nos processos de PPI e de licitações. Por exemplo, uma maior tolerância para assunção de riscos por parte do governo, abolição de penalidades por falha devido à incerteza tecnológica, maior flexibilidade de processo, introdução de novas ferramentas e capacidade de negociar Direitos de Propriedade Intelectual (IPR) quando a inovação está envolvida.

Todavia, na avaliação do autor do estudo, a utilização plena e exitosa das novas possibilidades legais exigirá do governo brasileiro um esforço significativo para treinar e capacitar os servidores públicos.

Esse novo arcabouço jurídico viabilizou novos usos para instrumentos tradicionais de compra governamentais assim como criação de novos instrumentos de PPI, ao mesmo tempo em que permitiu o tratamento adequado da incerteza e do risco inerente ao processo de inovação.

Com isso, o Brasil conta atualmente com dez instrumentos de compras públicas que podem ser usados para fomentar a inovação privada. Destes, três não são específicos à inovação, enquanto os sete restantes são específicos.

Dentre os instrumentos tradicionais de contratação pública que ganharam possíveis novos usos, destacam-se:

• Leilão Eletrônico Híbrido, que abrange licitações fechadas e abertas. Ainda que esta ferramenta apresente certa rigidez, dada sua lógica em termos de aquisição de bens homogêneos ao menor custo, o autor considera que pode ser incluída em uma estratégia de inovação, sobretudo se for utilizada com o objetivo de estimular a difusão de inovações.

• Critério de avaliação mais flexível, baseado na Melhor Relação Preço-Qualidade, pode fomentar inovações incrementais na economia brasileira. Este instrumento permite integrar critérios tradicionais de preços com sofisticados critérios de desempenho tecnológico, possibilitando a seleção de fornecedores inovadores.

• Procedimento de Manifestação de Interesse, embora não seja um instrumento de aquisição per se, e sim uma ferramenta administrativa que auxilia nos processos de aquisição pública e reduz as assimetrias de informação entre compradores e fornecedores, pode servir nas estratégias de PPI como um mecanismo para o setor privado introduzir inovações que antes eram desconhecidas do governo.

No que se refere aos sete instrumentos legais diretamente associados à compra pública para inovação, o autor ressalta que três deles já estão bem estabelecidos:

• Margem de Preferência, um instrumento criado em 2010 e reintroduzido em 2021, que dá preferência a produtos ou serviços fabricados ou montados no Brasil, mesmo que sejam até 20% mais caros que os importados, desde que vinculado a projetos nacionais de P&D ou inovação;

• Compensação Tecnológica em Defesa, ferramenta utilizada nas compras públicas internacionais de produtos e serviços relacionados à defesa, nas quais a entidade contratante pode solicitar várias formas de compensação, dentre as quais a transferência de tecnologia incorporada;

• Parcerias para o Desenvolvimento Produtivo (PDPs) na Indústria da Saúde, estratégia federal que visa reduzir o déficit comercial do setor farmacêutico causado pela falta de fornecedores nacionais para o Sistema Único de Saúde (SUS). Como a compensação tecnológica em defesa, as PDPs apoiam o desenvolvimento de tecnologia endógena por meio de transferência tecnológica, em troca de um contrato exclusivo de fornecimento por vários anos de medicamentos estratégicos a um custo reduzido.

Os outros quatro instrumentos existentes, entretanto, são novos e por isso menos usuais:

• Compra Pré-Comercial (PCP) se destaca como o mais disruptivo dentre os sete instrumentos específicos de PPI, ao permitir a contratação direta, dispensando o tradicional processo licitatório, de serviços de P&D. Esse instrumento é adequado para compras envolvendo incerteza tecnológica e projetos com menor maturidade tecnológica. Além disso, o PCP inclui uma opção de compra que pode ser exercida, sem a necessidade de um novo processo de seleção, quando os esforços de P&D forem bem-sucedidos, resultando em produção em escala comercial (TRL 9).

• Contrato Público de Soluções Inovadoras é um novo instrumento projetado para facilitar as colaborações entre startups (Govtechs) e o governo, ainda que não se restrinja exclusivamente a esse tipo de empresa. Essa modalidade única de licitação foi instituída no Projeto de Lei das Startups (Lei Complementar nº 182/21) e tem como objetivo central reduzir a assimetria de informação entre o comprador e os potenciais fornecedores por meio de testes reais.

• Prêmios de Inovação são um instrumento bastante utilizado como estratégias de indução ex-ante nas principais economias desenvolvidas. Sua utilização no Brasil que permite negociações sobre direito de propriedade intelectual tornou-se possível com as recentes modificações no ordenamento jurídico pela NLBC.

• Diálogo Competitivo, que é uma novidade no ordenamento jurídico brasileiro, representa um tipo específico de processo de licitação usado em situações nas quais as soluções inovadoras mais adequadas à resolução de um problema complexo são desconhecidas. A principal utilidade do CD reside em promover a introdução e difusão de inovações, em vez de seu desenvolvimento.

Em resumo, o estudo do IPEA avalia que o Brasil possui atualmente um conjunto poderoso e variado de instrumentos de política de inovação, equivalente aos existentes nos Estados Unidos ou nos países da Europa.

Esse conjunto abrange mecanismos do lado da demanda e do lado da oferta, que fornecem suporte desde o desenvolvimento tecnológico em estágio inicial com baixos níveis de maturidade tecnológica até a difusão no mercado de inovações incrementais.

André Rauen enfatiza que quando os instrumentos do lado da demanda são combinados com instrumentos do lado da oferta, o mix de políticas de apoio à inovação torna-se ainda mais robusto.

Clique aqui para ver a íntegra do texto

Fonte(s) / Referência(s):

Jornalismo AEPET
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