Publicado em 27/03/2019

Nota sobre acordo entre Petrobrás, Departamento de Justiça dos EUA (DoJ) e a força tarefa da lava jato (MPF)

Em 27 de setembro de 2018, a Petrobrás informou que assinou um acordo

para encerramento das investigações do Departamento de Justiça (DOJ) e da Securities & Exchange Commission (SEC), nos Estados Unidos, relacionados aos controles internos, registros contábeis e demonstrações financeiras da companhia, durante o período de 2003 a 2012 .

Nessa data, a Petrobrás informou também que celebraria acordo com o Ministério Público Federal (MPF), uma vez que os fatos subjacentes foram desvendados por meio de investigações conduzidas pelas autoridades brasileiras no âmbito da Operação Lava Jato. Isso permitiria que 80% dos valores acordados com a SEC e com o DOJ pudessem ser investidos no Brasil.

Segundo a Petrobrás, foram pagos nos Estados Unidos US$ 85,3 milhões ao DOJ e US$ 85,3 milhões à SEC. Adicionalmente, os acordos reconheceriam a destinação de US$ 682,6 milhões às autoridades brasileiras, a serem depositados pela companhia em um fundo especial e utilizados conforme instrumento que será assinado com o MPF.

De acordo com a Petrobrás, os instrumentos que amparam o encerramento das investigações foram os seguintes:

(i) Non-Prosecution Agreement assinado com o DOJ, no qual se responsabiliza pelos atos de certos ex-executivos e diretores que causaram violações às disposições legais sobre registros contábeis e controles internos de acordo com a legislação penal norte-americana (Title 15 of the United States Code, section 78 m). http://www.Petrobrás.com.br/fatos-e-dados/assinamos-acordos-com-autoridades-nos-estados-unidos-para-manter-80-do-nosso-valor-no-brasil.htm.

(ii) Acordo com a SEC para encerrar as alegações de que esses mesmos ex-executivos cometeram violações do Securities Act of 1933, bem como das previsões sobre registros contábeis, controles internos e arquivamento de informações falsas previstos no Securities Exchange Act of 1934. http://fcpacompliancereport.com/2018/10/17455/

(iii) Acordo a ser assinado com o MPF, sem atribuição de culpa ou dolo à companhia, conforme a legislação brasileira, por meio do qual US$ 682,6 milhões serão depositados em um fundo especial no Brasil. http://www.Petrobrás.com.br/fatos-e-dados/assinamos-acordo-para-encerrar-class-action-nos-eua.htm

A Petrobrás informou que o valor de US$ 682,6 milhões será utilizado estritamente segundo os termos e condições do acordo a ser celebrado, incluindo destinação para vários programas sociais e educacionais visando à promoção da transparência, cidadania e conformidade no setor público.

A SEC concordou que os pagamentos feitos na ação coletiva dos Estados Unidos (class action) serão considerados como créditos para fazer frente ao montante de US$ 933,4 milhões (parte do total de US$ 2,95 bilhões da class action), não havendo, portanto, necessidade de desembolso adicional para a SEC, além dos US$ 85,3 milhões.

Foi informado, ainda, que a Petrobrás reconheceria, como provisão dos acordos, o valor de US$ 853,2 milhões, estimado em R$ 3,6 bilhões, incluindo tributos, nas demonstrações financeiras do 3º trimestre de 2018.

De acordo com o FCPA (Foreign Corrupt Practices Act) blog, o valor do acordo de US$ 1,78 bilhão, correspondente a US$ 933,4 milhões acrescidos de US$ 853,2, é o maior da história .
Em 3 de janeiro de 2018, a Petrobrás já havia informado a assinatura de acordo coletivo (class action) na corte federal de Nova York. Segundo a Petrobrás, esse acordo eliminaria o risco de um julgamento desfavorável que poderia causar efeitos materiais adversos à companhia e a sua situação financeira. Além disso, poria fim a incertezas, ônus e custos associados à continuidade dessa ação coletiva .

No Acordo da Ação Coletiva, a Petrobrás, e sua subsidiária Petrobrás Global Finance B.V. (PGF), concordou em pagar US$ 2,95 bilhões, em duas parcelas de US$ 983 milhões e uma última parcela de US$ 984 milhões. Dessa forma, a companhia reconheceu no resultado do quarto trimestre de 2017, em outras despesas operacionais, o valor de R$ 11,198 bilhões considerando impostos da parcela referente à Petrobrás. Em 1º de março de 2018, a Petrobrás e PGF depositaram a primeira parcela do acordo em uma conta designada pelo autor-líder da ação coletiva; a segunda parcela foi depositada no dia 2 de julho de 2018 e a terceira parcela depositada no dia 15 de janeiro de 2019. A atualização cambial da provisão gerou uma despesa de R$ 1,646 bilhões, registrada em outras despesas operacionais.

Com relação aos Estados Unidos, a Petrobrás acertou, então, os seguintes pagamentos:

US$ 2,95 bilhões no acordo coletivo (class action);

US$ 85,3 milhões ao DOJ;

US$ 85,3 milhões à SEC;

US$ 686,6 depositado no Brasil.

Dessa forma, os pagamentos da Petrobrás totalizaram US$ 3,8 bilhões, que, ao câmbio atual, representaria um pagamento total da ordem de R$ 14,4 bilhões.

Sobre acordo de pagamento de US$ 2,95 bilhões aos acionistas dos Estados Unidos, a Associação dos Engenheiros da Petrobrás (AEPET), por meio de nota publicada em 4 de janeiro de 2018 http://www.AEPET.org.br/w3/index.php/conteudo-geral/item/1200-nota-da-AEPET-sobre-acordo-de-pagamento-de-us-2-95-bilhoes-aos-acionistas-dos-eua , manifestou sua repulsa ao constatar que “apesar de a Petrobrás ser a vítima da corrupção, condição reconhecida pela companhia e pelas instituições competentes brasileiras, o Ministério Público e a Justiça, a atual direção decida indenizar, bilionária e antecipadamente, os acionistas norte-americanos”.

A AEPET denunciou os prejuízos potenciais da perda da soberania brasileira ao alienar parcela relevante das ações da Petrobrás na bolsa de valores dos Estados Unidos: “Então a companhia é vítima, se reconhece como tal, assim como o fazem todos os poderes constituídos do Brasil, mas decide antecipar indenização multibilionária aos acionistas norte-americanos por causa do risco de se submeter a júri popular, peculiaridades e legislação ianque? ”.

A sequência cronológica do crime continuado é demonstrada na nota da AEPET: “Primeiro, os responsáveis no governo FHC pela venda das ações em Nova Iorque, com a perda significativa de soberania sobre o maior patrimônio dos brasileiros, a Petrobrás e o petróleo brasileiro. Segundo, os responsáveis nos governos Lula e Dilma por não terem recomprado as ações em Nova Iorque, recuperando a soberania plena sobre a Petrobrás. Terceiro, os corruptores e os corruptos que lesaram a Petrobrás nos desvios revelados pela Operação Lava Jato. Os empresários que se organizaram em cartel para obtenção de contratos superfaturados, os políticos traficantes de interesses e os executivos de aluguel na estatal. Quarto, os procuradores, juízes e agentes públicos que a pretexto do combate à corrupção se aliaram aos investigadores norte-americanos, ora recebendo, ora entregando informações sensíveis à proteção dos interesses nacionais, das nossas empresas, dos nossos empregos e das nossas riquezas. ”

A AEPET assim concluiu sua nota: “O pagamento desses bilhões precisa ser questionado, mas as veias abertas da nossa renda petroleira não vão parar de sangrar enquanto a maioria dos brasileiros de bem não tomem consciência, se unam e se organizem para a construção de um país digno para que nossos filhos e netos vivam em paz”.

Em 30 de janeiro de 2019, a Petrobrás informou que efetuou o pagamento do acordo de Assunção de Compromissos (Acordo), celebrado com o MPF e homologado judicialmente em 25 de janeiro de 2019, no valor de US$ 682,6 milhões, correspondentes a 80% do valor da resolução celebrada com o DOJ e SEC nos Estados Unidos . http://www.investidorPetrobrás.com.br/pt/comunicados-e-fatos-relevantes/homologacao-de-acordo-com-o-ministerio-publico-federal

O Acordo estabelecia que metade do valor depositado seria revertido para um fundo patrimonial gerido por meio de uma fundação independente (a ser constituída), que investiria em projetos, iniciativas e desenvolvimento institucional de entidades idôneas, que reforcem a cultura de respeito à legalidade e aos valores democráticos, de modo apartidário, por meio da promoção da cidadania participativa e que promovam a conscientização da população brasileira sobre a importância da integridade no ambiente público e privado, dentre outras finalidades semelhantes, de acordo com as diretrizes do MPF e sem ingerência da Petrobrás. A outra metade poderia ser utilizada para atender eventuais condenações da companhia em demandas de investidores ou para pagamento de possíveis acordos.

Em 15 de março de 2019, o Ministro Alexandre de Moraes do Supremo Tribunal Federal (STF) suspende eficácia de Acordo firmado entre procuradores da República no Paraná e Petrobrás; foi suspensa também a decisão da 13ª Vara Federal de Curitiba (PR) que o homologou . http://www.stf.jus.br/portal/cms/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=405926

O Ministro do STF determinou ainda o imediato bloqueio dos valores depositados pela Petrobrás, bem como subsequentes rendimentos, na conta corrente designada pelo juízo da 13ª Vara Federal que somente poderão ser movimentados com autorização expressa do STF.

O Acordo, que buscava dar destinação a US$ 682,5 milhões repassados pela estatal “a autoridades brasileiras” em razão de acordo anterior celebrado nos Estados Unidos, foi questionado no STF pela Procuradora-Geral da República, Raquel Dodge, na Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF 568), pelo PT e pelo PDT (ADPF 569) e pela Câmara dos Deputados (Reclamação 33667).

Na liminar concedida na ADPF 568 e na RCL 33667, o Ministro afirma que a partir do primeiro acordo celebrado entre as autoridades norte-americanas e a Petrobrás, a empresa brasileira optou – em circunstâncias cuja constitucionalidade, legalidade e moralidade deverão ser analisadas pelo STF – pela realização de um segundo acordo, para efetivar o pagamento da multa, no qual escolheu como as “autoridades brasileiras” os procuradores do Ministério Público Federal do Paraná.

Além da discricionariedade “duvidosa” de tal escolha, observou o Ministro, ela também ignora o Estatuto do Ministério Público da União (Lei Complementar 75/1993), que define na chefia da instituição a atribuição para sua representação administrativa.

O Ministro Alexandre de Moraes observou, ainda, que os termos do acordo realizado entre a Petrobrás e o governo norte-americano não indicam os órgãos do MPF-PR como sendo as “autoridades brasileiras” destinatárias do pagamento da multa, tampouco indicaram a obrigatoriedade ou mesmo a necessidade de o depósito dos valores ser realizado perante a 13ª Vara Criminal Federal de Curitiba.

Segundo ele, a execução e fiscalização do cumprimento de obrigações assumidas pela Petrobrás no exterior, por fatos relacionados à Operação Lava-Jato, não são atribuições específicas dos membros do MPF na força-tarefa nem atraem a competência do Juízo da 13ª Vara Federal para homologá-lo.

Além disso, para o Ministro, o conteúdo do segundo acordo estabeleceu inúmeras providências não previstas no acordo norte-americano, que apenas previu o creditamento da multa em favor do Brasil, sem condicioná-la à constituição de uma pessoa jurídica ou destiná-la a atividades específicas.

Uma das cláusulas do acordo agora suspenso previa que metade do valor seria investido em “projetos, iniciativas e desenvolvimento institucional de entidades e redes de entidades idôneas, educativas ou não, que reforcem a luta da sociedade brasileira contra a corrupção”, e constituiria um fundo patrimonial a ser administrado por uma fundação de direito privado.

Segundo o Ministro Alexandre de Moraes, em uma análise inicial, é possível considerar “duvidosa” a criação e constituição de fundação privada para gerir recursos derivados de pagamento de multa às autoridades brasileiras, que ao ingressarem nos cofres públicos da União passaram a ser públicos, e cuja destinação dependeria de lei orçamentária editada pelo Congresso Nacional.

Ao conceder a liminar, o Ministro destacou a presença dos requisitos necessários para sua concessão – plausibilidade do direito invocado e perigo da demora – uma vez que poderia haver desvirtuamento de vultoso montante de dinheiro destinado ao Poder Público.

Apesar de considerar correta a decisão do Ministro Alexandre de Moraes, na visão da AEPET a suspensão do Acordo entre a Petrobrás e os procuradores da República no Paraná precisa ser acompanhada de outras providências.

O acordo da Petrobrás com autoridades dos Estados Unidos, informado pela estatal em 27 de setembro de 2018, também precisa ser suspenso, principalmente em razão do Anexo C desse acordo.

Nos termos desse Anexo, a Petrobrás concorda que se reportará à Seção de Fraudes do DOJ e ao Escritório do Ministério Público dos Estados Unidos para o Distrito Leste de Virginia, periodicamente, com intervalo não menor que doze meses, durante três anos.

A Petrobrás submete-se a pelo menos duas revisões e relatórios incorporando as visões da Seção de Fraudes e do Escritório para monitorar e avaliar se as políticas e procedimentos da estatal são adequadamente concebidas para prevenir violações da FCPA e outras leis anticorrupção aplicáveis.

A primeira revisão e relatório de acompanhamento tem que ser concluída antes de um ano e submetida à Seção de Fraudes e ao Escritório; a segunda deve ser completada até trinta dias após o final do prazo da primeira.

Nos termos do item “d” do Anexo C, é esperado que os relatórios incluam informações proprietárias, financeiras, confidenciais e de negócios competitivos. Além disso, a divulgação pública poderia desencorajar cooperação, impedir investigações governamentais pendentes ou potenciais e, assim, dificultar os objetivos da exigência dos relatórios.

Por essas razões, entre outras, os relatórios e seus conteúdos têm de permanecer não-públicos, exceto se acordado entre as partes, por escrito, ou se a Seção de Fraudes e o Escritório, por decisão própria, determinar a divulgação.

A Petrobrás poderá estender o período para a submissão dos relatórios de acompanhamentos com prévia escrita aprovação da Seção de Fraudes e do Escritório.

Observa-se, então, que a Petrobrás optou por abrir informações estratégicas para órgãos dos Estados Unidos e que a sociedade brasileira somente poderá ter acesso a essas informações mediante aprovação de órgãos de um outro país.

Ao que tudo indica, houve improbidade administrativa por parte dos administradores da Petrobrás que aprovaram o acordo com órgãos dos Estados Unidos, assim como dos administradores que homologaram o Acordo com os procuradores da República no Paraná.

Em suma, diante das ilegalidades dos acordos aqui mencionados e dos atos praticados pelos administradores da Petrobrás, a AEPET avaliará os meios jurídicos para assegurar a soberania do Brasil, a moralidade e o interesse público ao tonar nulo de pleno direito este acordo, além da imputação, por possíveis implicações relativas à improbidade administrativa, dos responsáveis pela aprovação do referido acordo.

Diretoria da Associação dos Engenheiros da Petrobrás (AEPET)

Março de 2019

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