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Luis Nassif

O engano fatal das metas de inflação

O sistema de metas é falho: a alta da Selic visa o lucro especulativo e afasta o investimento produtivo

Publicado em 23/10/2025
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Define-se uma meta de inflação. Se a expectativa de inflação supera essa meta, eleva-se a taxa básica de juros.

A justificativa? Que o aumento dos juros desacelera a economia e, assim, reduz a inflação.

Essa narrativa é aceita por muitos, mas não resiste à análise crítica. Nenhum economista sério acredita que a taxa básica de juros controla a atividade econômica a ponto de domar a inflação futura. A verdadeira lógica por trás do sistema é cambial — e o instrumento de ajuste não é o nível de atividade, mas sim o carry trade.

Entendendo o Carry Trade

O carry trade é uma operação em que investidores tomam empréstimos em moedas com juros baixos e aplicam em ativos com juros mais altos, como o Real. O lucro depende do diferencial de juros e da expectativa de variação cambial.

Exemplo 1: Real estável ou valorizado

Empréstimo: US$ 10 milhões a 4,33% ao ano → dívida de US$ 10,433 milhões.

Conversão: US$ 10 mi × R$ 6,00 = R$ 60 mi.

Aplicação na Selic a 15% → R$ 69 mi após um ano.

Se o dólar desvaloriza 5% (R$ 6,30), o investidor converte R$ 69 mi em US$ 10,95 mi.

Lucro: US$ 519 mil.

Exemplo 2: Real valoriza 5% (R$ 5,70)

Conversão de R$ 69 mi → US$ 12,10 mi.

Lucro: US$ 1,67 mi.

Exemplo 3: Real desvaloriza 15% (R$ 6,90)

Conversão de R$ 69 mi → US$ 10 mi.

Prejuízo: US$ 433 mil.

Ou seja, o fator decisivo é a variação cambial. Se o real se valoriza, o especulador ganha; se desvaloriza, perde.

O Que Move o Câmbio?

A entrada ou saída de dólares. Se há expectativa de valorização do real, o fluxo de entrada aumenta, valorizando a moeda. Se há fuga de capitais, o real se desvaloriza.

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E a Inflação?

A lógica do mercado é distorcida: supõe-se que, para manter a paridade de compra, o câmbio deve acompanhar a inflação interna. Se a inflação sobe, o real pode se desvalorizar, o que afeta o carry trade. Mas a inflação não sobe por causa da atividade econômica — sobe por causa da variação cambial, que depende da entrada de dólares.

Quando o real se valoriza, os preços dos produtos comercializáveis caem — tanto importados quanto exportados. Com isso, a inflação recua. E vice-versa. E ainda assim, atribui-se a inflação à “gastança”, mesmo quando o déficit primário é irrisório.

O “Apito de Cachorro”

Indicadores como inflação e déficit funcionam como “apito de cachorro”: sinais codificados que apenas os grandes players do mercado entendem. Eles entram e saem rapidamente, lucrando sobre a manada que reage depois.

Foi o que ocorreu em dezembro, quando três grandes bancos — um deles estrangeiro — provocaram uma corrida contra o real, gerando uma maxidesvalorização. As contas públicas estavam iguais, as expectativas de inflação também. O que mudou? A fuga de capitais.

A desvalorização pressionou a inflação, forçando o Banco Central a elevar a Selic novamente. Tudo isso por causa de uma única condição: o livre fluxo de capitais.

O Verdadeiro Debate

Por que manter essa liberdade irrestrita para entrada e saída de capitais? Os “idiotas da objetividade” dirão que o Brasil precisa de investimento estrangeiro. Mas qual tipo?

Apenas o capital produtivo — aquele que investe na economia real, em fábricas e setores novos — é desejável. E para esse capital, a estabilidade cambial é essencial.

Ao permitir o livre fluxo, abrimos as comportas para o capital especulativo e afastamos o investimento produtivo. Esse é o verdadeiro nó a ser desatado para destravar o crescimento: controlar o fluxo de capitais e enfrentar o tsunami especulativo que ameaça a economia.

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