A frente e os partidos
Quarto artigo da série "E agora, Brasil?", do ex-governador do Paraná, Roberto Requião
Acredito que a formação de uma Frente progressista, democrática e nacionalista seja a nossa grande tarefa hoje. Uma união da esquerda ao centro, mas com essas características. Sem concessões à direita, mesmo a dita “civilizada”, aos liberais mercadistas, àquela gente que concorda com tudo o que o governo do fulano de tal faz e pretende fazer na área econômica, que aprovou a reforma trabalhista, o teto de gastos e quer a reforma da Previdência e a capitalização; que acha um luxo a Embraer “associar-se” à Boeing; que anseia, sonha e aprova a privatização da Petrobrás, da Eletrobrás, e que não reste pedra sobre pedra das estatais.....mas que fica constrangida com a xucrice do capitão e se mostra sensível à inabilidade dele no uso dos talheres, no entanto é tão impiedosa com o país e o povo, essa gente que vá se catar, com o Huck, o Dória, o Amoedo e quem mais seja.
Na verdade, estamos atrasados para a organização da Frente. Ela deveria ter sido pensada e formatada na sequência do impeachment de Dilma. Ou mesmo antes, para se opor ao que se anunciava desde de 2013.
É claro que não se trata de uma tarefa fácil. Porque o principal adversário seremos nós mesmos. As vaidades, os ressentimentos, as desconfianças, as cotoveladas pelo protagonismo, as ambições eleitorais, o partidarismo. São tantos os embaraços que muitos inclinam-se a desistir, antes de começar. Mas é preciso começar.
Não temos partidos fortes, enraizados na sociedade nacional. E não é uma pesquisa do IBOPE que vai medir isso. A popularidade, a simpatia por essa ou aquela sigla não significa, necessariamente, capacidade de mobilização, de arregimentação, de comando. A satanização dos políticos e da política que precedeu o golpe, marcou as últimas eleições, e que o consórcio mídia-Lava Jato tratou de levar ao paroxismo, provocou estragos que ainda vão repercutir por longo prazo.
Mas os partidos são imprescindíveis para a constituição da Frente. Sob ataque, enfraquecidos ou não eles vão viabilizar a estruturação da Frente. Os partidos, junto com os sindicatos (federações, confederações e centrais sindicais), com as associações profissionais, com as associações de bairros, e com as organizações e entidades estudantis, haverão de fazer com que a Frente já nasça com um razoável grau de organização, de presença política e representatividade social.
É óbvio que a proposta de composição de uma Frente que reúna sob o seu teto miríade de representações, tendências e interesses vai ser recebida com ceticismo, descrença e oposição.
Que é necessário se organizar para a contraposição ao entreguismo, à trituração dos direitos dos trabalhadores, à destruição da economia nacional, à liquidação das universidades e coisa e tal, não há dúvida. Que é preciso uma reação conjunta da esquerda ao centro, dos progressistas, dos nacionalistas, dos que prezam os valores da civilização e do humanismo, não se discorda.
Se anuímos, porque não descruzar os braços?
O que nos une parece claro. E o que nos une não é muito maior que as pequenas contradições que nos atritam?
Venho lá de trás, de muito longe. Fui advogado, atuando na área de direitos sociais. Fui deputado, prefeito, três vezes governador, duas vezes senador. Desde que comecei a militância até hoje, não vi nada que se assemelhasse a tenebrosidade desses dias. E minha convicção é: sem unidade, sem um programa mínimo que nos congregue e sem uma organização que nos aglutine e fortaleça, não iremos a lugar algum.
Dias desses, quando em uma roda manifestava mais agudamente minhas apreensões e angústia, dada a velocidade boltiana com que o país está sendo destruído, houve quem tentasse me tranquilizar: “Calma, é o ciclo. Daqui a pouco muda tudo. Veja o que acontece na Europa: às vezes a direita ganha, depois ganha esquerda. É a alternância de poder”.
Bom, para quem pensa assim; para quem acredita que basta esperar a próxima eleição, e enquanto espera vai se divertindo com as revelações do Intercept Brasil e rindo com as trapalhadas da Damares, do Araújo, do Weintraub, dos três zeros e do próprio, está de bom tamanho.
Como disse no início deste texto: a velocidade espantosa com que a nossa soberania, a nossa economia, as garantias, direitos e a seguridade sociais estão sendo esfarelados deveria ter, da nossa parte, uma reação igualmente rápida e contundente.
É que, daqui a pouco, só teremos ruínas e a reconstrução será lenta, custosa, dolorosa.
Não se trata de simples alternância de governos, dentro de uma quadra de estabilidade institucional, de funcionamento normal dos poderes, de civilidade, como pode acontecer na Inglaterra, França ou Alemanha. Aqui é o Brasil. Aqui, o primarismo, a psiquê escravocrata de nossas elites não permite se construa uma sociedade minimamente civilizada. Por isso jamais haverá alternância de poder por essas bandas e quando acontece alternância de governo, há sempre o recurso à sabotagem, ao golpe para restabelecer a ordem das coisas; isto é: relho na patuleia.
Essa a percepção que deve ter uma Frente Nacional, Popular e Democrática. A ciência de que as mudanças não serão concedidas, negociadas, pactuadas; que todo pacto, que todo avanço, até hoje, foi traído e derrogado.
O que há de maior, de grandioso, superior, total e sublime que a construção da Nação Brasileira? O Brasil para os nossos. Não um país para os outros.
Não é possível que mais uma vez, diante das circunstâncias dadas, desse extraordinário estado das coisas, terrível, tenebroso, é verdade, mas prenhe de tantas possibilidades, deixemos a oportunidade passar por mesquinharias, por uma visão de curto prazo, pelo imediatismo caolho, por projetos eleitorais que podem nos dar uma Presidência, mas não uma Nação. A não ser, é claro, que não se pretenda qualquer rompimento e sim as acomodações de sempre.
A organização da Frente, já!, é o primeiro passo para o longo caminho das transformações.
E agora? Agora, Brasil, a preparação ativa e imediata da Revolução Brasileira.
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