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Flavio Lyra

O capital financeiro sufocou o capital produtivo

O governo de Bolsonaro vem cumprindo a contento o papel nefasto de cortar definitivamente as amarras que impediam a sociedade brasileira de se at

Publicado em 24/10/2019
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O governo de Bolsonaro vem cumprindo a contento o papel nefasto de cortar definitivamente as amarras que impediam a sociedade brasileira de se atolar de vez no pântano da desigualdade social e da estagnação econômica.

Esse processo já vem de longa data. Já no início dos anos 90, com o governo Collor, a classe empresarial brasileira havia optado claramente por entregar os destinos do país aos missionários do neoliberalismo, com suas crenças de que a liberalização dos mercados redução do estado iriam promover o desenvolvimento econômico. Os manuais do Banco Mundial e do FMI, sob a influência do “Consenso de Washington”, serviam como orientadores da burocracia responsável pela política econômica.

Nos governos de FHC, com o Plano Real, ao lado das medidas de estabilização dos preços, foram implementadas ações que fortaleceram a concentração bancária, privatizaram amplos setores produtivos, expandiram expressivamente a dívida pública e criaram o ambiente propício à expansão do capital financeiro, cuja essência se manifesta na extensão das diferentes formas de difusão dos instrumentos creditícios às famílias, às empresas e ao governo, sob o comando dos bancos e de outras instituições financeiras, como as bolsas de valores e empresas de seguro.

O resultado natural dessas mudanças é que os investimentos produtivos, aqueles que levam ao aumento da capacidade de produção, passaram a ser preteridos como forma de valorização do capital, pelos investimentos financeiros, que são meras formas de transferência de ativos financeiros entre os detentores de poupanças.

A política monetária, conduzida pelo Banco Central, fortemente influenciada pelo sistema financeiro, voltada para o controle das pressões inflacionárias, contribuiu fortemente para o desestímulo aos investimentos produtivos, na medida em que estabeleceu a taxa de juros básica da economia (SELIC), em termos reais, muito elevada.

O processo de industrialização sofreu, desde então, um forte golpe derivado do aumento da competição externa e da falta de investimentos produtivos, na infraestrutura econômica e na própria indústria.

O aumento da integração da economia no comércio internacional passou a se dar pelo aproveitamento das vantagens comparativas possuídas pelo país na produção agropecuária, com o aumento na pauta de exportação dos produtos primários e de baixa tecnologia no espaço dos produtos de maior sofisticação tecnológica.

Os governos do PT, pouco alteraram esse quadro de perda de substância da estrutura produtiva do país, associado um processo precoce de desindustrialização, na medida em que em nada alteraram a política monetária e, até mesmo, reforçaram a tendência ao avanço do capital financeiro em detrimento do capital produtivo.

Países, como a China e a Coréia do Sul, souberam aproveitar o avanço da chamada “globalização” para consolidar seus processos de industrialização, com políticas econômicas que reforçaram os investimentos produtivos e favoreceram o desenvolvimento tecnológico interno.

Seria injusto afirmar que os governos do PT, não realizaram esforços para retomar o processo de industrialização. A expansão dos investimentos em empresas estatais, como as de produção de energia, a retomada dos investimentos na construção naval e a forte expansão dos financiamentos do BNDES, bem como os esforços de expansão da capacidade produtiva no Primeiro Governo Dilma com o que se convencionou chamar de “Nova Matriz Econômica”, são indicações claras da intenção de recuperar a importância dos investimentos produtivos.

Lamentavelmente, o setor privado, já estava tão dominado pela dinâmica da expansão do capital financeiro e pelo catecismo neoliberal no campo da política econômica, que a resposta às intenções governamentais de fomentar a reindustrialização não encontrou eco no mundo empresarial.

O objetivo, então, do mundo empresarial já era o de aprofundar o domínio do mercado e do capital financeiro, mediante a restrição dos direitos da classe trabalhadora, na expectativa de que, por esse meio, fosse viável reconstituir as fontes de dinamismo da economia.
A destituição do Governo-Dilma, através de um golpe parlamentar, e sua substituição pelo Governo-Temer, com um programa de cunho eminente neoliberal, “ Ponte para o Futuro”, cujas ênfases são a contenção dos gastos públicos, a flexibilização da legislação trabalhista e a redução dos gastos previdenciários, apontam na direção da reconcentração do poder nas mãos da classe empresarial em detrimento da classe trabalhadora.

A eleição presidencial de 1918, representou uma grande derrota da classe trabalhadora com a chegada ao poder, apoiada pelo mundo empresarial, de um grupo de aventureiros de extrema-direita, cuja proposta de governo é, no plano econômico o aprofundamento da austeridade fiscal, no plano social a retirada de direitos da classe trabalhadora, no plano político a promoção de valores antidemocráticos, no plano cultural a adoção de ações contra a liberdade de criação no campo artístico.

No plano econômico, o Governo Bolsonaro, não esboça nenhuma intenção de agir para aumentar os investimentos produtivos. Ao contrário, descapitalizou o BNDES, principal supridor de fundos de longo prazo. Sua expectativa é de que capitais privados venham a suprir essa necessidade, o que nunca funcionou no passado.

No plano social, as ações do governo se orientam para baixar o poder de compra dos trabalhadores e cortar gastos sociais nas áreas de Educação e Saúde.

Saltam aos olhos as intenções e ações do governo de desmoralizar as instituições que sustentam a democracia, estimulando as pressões de grupos de direita contra a cúpula do Poder Judiciário, fomentando o descrédito do Poder Legislativo e a desagregação dos partidos políticos, a começar pelo partido do governo.

Finalmente, na área cultural, o governo tem desarticulado os órgãos com atuação na promoção nos diferentes campos artísticos e o estabelecimento de censura prévia a obras de arte.

A estagnação econômica, o alto índice de desemprego da força de trabalho, o aumento da miséria e das desigualdades sociais são sinais preocupantes de que o país chegou ao fundo do poço e não se vislumbram perspectivas de superação do quadro atual a curto e médio prazos.

A classe capitalista não parece propensa a fazer qualquer concessão que possa promover uma pactuação com a classe trabalhadora para superar o quadro atual, pois continua acreditando que não há alternativa fora do mercado livre e da redução do estado.

O neoliberalismo dá sinais de fracasso em toda parte e não se vislumbra a possibilidade de sair da crise seguindo seus preceitos. Nesse contexto, a classe capitalista não possui alternativa e tende a apoiar governos autoritários, como forma de manter sua dominação.

Resta à classe trabalhadora o heroico papel de libertar o país das amarras do neoliberalismo e de seu promotor o capital financeiro, para tornar viável uma nova etapa de expansão produtiva. Tarefa cheia de obstáculos nas atuais circunstâncias nacionais e internacionais.

(*) Economista da Escola UNICAMP.

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