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Sergio Xavier Ferolla

Petróleo e soberania

Estudiosos do petróleo e seu significado estratégico há muito vêm alertando para o fim do óleo barato e da inexorável redução da oferta d

Publicado em 19/08/2021
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Estudiosos do petróleo e seu significado estratégico há muito vêm alertando para o fim do óleo barato e da inexorável redução da oferta do produto nas próximas décadas. Tal cenário se agrava pelo fato de a demanda por óleo combustível estar crescendo cerca de 2% ao ano; razão de ter merecido especial consideração em São Petersburgo, no encontro do G–8, grupo dos oito países mais in dustrializados, em 2006.

Na ocasião, o fornecimento de petróleo foi abordado como grande questão pelas potências econômicas e militares, muitas envolvidas, de longa data, na dominação e controle político de nações privilegiadas com preciosas jazidas de óleo e gás. Frente a tal horizonte de escassez o Fundo Monetário Internacional (FMI), alertou para um "choque permanente do petróleo e que os países vão ter de se ajustar".

A este complexo quadro de demanda por energia soma–se o especial parâmetro da ascensão de "potências regionais emergentes", como a China e a Índia, dentre as quais, em futuro próximo, também posicionar–se–á o Brasil. Tal estratégica feição da geopolítica energética explica, em parte, a firme postura do governo da Federação Russa, cujos dutos, oriundos do Mar Cáspio, suprem boa parcela do óleo e gás para a Europa.

Também no continente asiático, a dependência de petróleo levou o Japão a propor investimento superior a uma dezena de bilhões de dólares, para que um oleoduto russo, com 3.700 quilô metros, fosse construído até suas fronteiras. Da mesma forma a China, segundo maior consumi dor de petróleo do mundo, pres siona a Rússia para que um oleo duto de 2.250 quilômetros inter ligue os dois países.

Estas iniciativas em infraestrutura e acordos estratégicos apontam para uma nova confi guração geopolítica que, dire cionada para o Oriente, pode rá modificar o predomínio es tabelecido pelas potências oci dentais, especialmente após a Segunda Guerra Mundial. Para melhor entendimento, é preciso considerar que desde o Império Romano, representante preliminar do Ocidente, o poder central só se interessava por conquis tas para exploração e segurança das fronteiras, considerando os povos da periferia como bárba ros. No entanto, desses povos, os mercadores adquiriam especia rias para as elites do continente, cruzando as primitivas estradas do Leste, designadas como "Rota da Seda" pelo geólogo alemão, Ferdinand von Richthofen, no Século XIX.

Em sentido oposto, no limiar do século XXI, um novo quadro se apresenta ao longo dessas estradas, com a China consolidando ousada expansão pela "Nova Rota da Seda", também designada "Belt and Road Initiacive", ao disponibilizar 100 bilhões de dólares para o financiamento de pontes, estradas, portos e projetos energéticos em mais de 60 países.

Em busca de dinâmico inter câmbio com os aliados está in vestindo em estradas e portos no Paquistão, Sri Lanka, Myanmar e Bangladesh. Tal estratégia geo política, cognominada "Cordão de Pérolas", demonstra a preten são chinesa em estabelecer um colar de facilidades portuárias, através do Oceano Índico, até a África. Tudo leva a crer que estas rotas alternativas podem atender à logística militar, ape sar de Pequim afirmar que seu objetivo é assegurar caminhos para a exportação de manufa turas e importação de insumos energéticos.

Estas considerações, quanto à real situação mundial do petróleo, nos levam a contra por argumentos sobre a gravidade da política que foi im posta ao país, em detrimento dos reais interesses da socieda de. Além de realizar danosa li beralização econômica, dilapi dando significativa parcela do patrimônio público sem a ne cessária contrapartida, esten deu suas diabólicas pretensões sobre as reservas do ouro negro através de danosas concessões e incentivos à sua exploração por empresas cujo objetivo maior é o lucro imediato e a satisfação de interesses alienígenas. Este verdadeiro crime de lesa– pátria oficializou–se com a pro mulgação da Lei nº 9.478/97, de 6 de agosto de 1997, conhecida como "lei do petróleo", justificada como solução necessária para forçar a redução do custo dos derivados.
Argumentavam, à época, que a competição entre as empresas le varia, naturalmente, à diminuição dos preços para os consumidores. A dura realidade do mercado mundial, dominado por um oligopólio de empresas estatais e privadas, acabou demonstrando a necessidade de nova legislação capaz de assegurar a propriedade estatal sobre as jazidas do subsolo, bem como o abastecimento doméstico a custos razoáveis e por um longo período.

A descoberta do Pré–sal, pelo competente trabalho dos geólogos da Petrobrás, tornou impositivo um novo modelo, in clusive para atender aspectos es tratégicos da segurança nacio nal. No dia 31 de agosto de 2009, o Congresso aprovou a legisla ção pertinente, cujo Decreto es tabeleceu, de forma sintética:

1. Novo sistema de repartição dos produtos da exploração do Pré–sal alterando o modelo de Contrato de Concessão para um sistema de Partilha da Produção, e fixando regras de transição para os contratos entre os dois modelos;
2. Criação de uma empresa estatal para gerenciar os trabalhos das petrolíferas selecionadas para a exploração. A nova estatal — Pré-sal Petróleo S.A. — representará os interesses da União nos Contratos de Partilha da Produção;
3. Criação de um Fundo Social com os recursos a serem transferidos para o gover no, decorrentes do proces so de partilha da produ ção, nos termos a serem estabelecidos em futuros contratos. Esse fundo será encarregado de gerir e dis tribuir os recursos.


Ao criar a Empresa Brasileira de Administração de Petróleo e Gás Natural S.A. – Pré–sal Petróleo S.A. (PPSA)1 e estabelecer o modelo de partilha, nosso país não só restringiu a expansão do predatório modelo das concessões, como assegurou a presença do Estado Nacional nas plataformas em águas pro fundas e, portanto, muito além dos limites territoriais brasileiros. Localizadas numa Zona de Exploração Exclusiva (ZEE), sob a gestão do Estado Nacional, tornaram–se impositivos grandes investimentos no setor da pro dução, com as necessárias cau telas em relação aos ganancio sos grupos econômicos e potên cias internacionais. As vulne rabilidades frente aos usurpa dores e ameaças de aventurei ros externos também exigiram providências no campo da Defesa. Sistemas militares de controle e vigilância foram implementados na imensa região oceânica, designada por Amazônia Azul, ao longo da faixa litorânea brasileira.

Como as ações de lobistas estão sempre presentes, inclusive com falsos filósofos atuando nos corredores do poder, acima de quaisquer argumentos téc nicos, jurídicos e econômicos é importante deixar muito claro que o suprimento de combustíveis para um país com as características do Brasil, muito extenso e com consideráveis assimetrias regionais e sociais, terá de ser executado priorizando aspectos geopolíticos e estratégicos, mesmo atendendo os rotineiros contratos e leis que regem o mercado.

Por tudo isso, faço minhas as palavras do patriota Embaixador Araújo Castro, quando representante do Brasil nas Nações Unidas: "Temos de pensar grande e planejar em grande escala, simplesmente porque o Brasil não será viável como país pequeno ou mesmo como país médio. Ou aceitamos nosso destino como país grande, livre e generoso, sem ressentimentos e sem preconceitos, ou corremos o risco de permanecer à margem da História, como povo e como nacionalidade".


SERGIO XAVIER FEROLLA, tenente–brigadeiro, aviador, engenheiro e ministro aposentado do Superior Tribunal Militar

Fonte: Legados Trabalhistas

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