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Edson Monteiro

Reflexões sobre a greve dos petroleiros

Uma situação dramática – a nosso ver – aquela vivida por milhares de pessoas, direta ou indiretamente, pertencentes ao segmento trabalhado

Publicado em 19/03/2020
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Uma situação dramática – a nosso ver – aquela vivida por milhares de pessoas, direta ou indiretamente, pertencentes ao segmento trabalhador da empresa ANSA – Araucária Nitrogenados S.A / FAFEN – PR que, premidas pela iminência do encerramento das atividades fabris, decidiram-se pelo regime de greve, a partir de 1º de fevereiro de 2020. Tão dramática que os colegas petroleiros, no âmbito nacional, solidarizaram-se com o Movimento Grevista, um direito constitucional e, como tal, indiscutível no seu uso.

Os cidadãos brasileiros sabem – vivendo no contexto de mais de 11 milhões de desempregados – do drama social e humano que grava o país. Percebem, com nitidez, que as decisões da área responsável pela economia nacional, com base exclusiva no pronunciamento de seus titulares, revelam o propósito de distanciamento do Estado das atividades vinculadas à produção ou determinados serviços essenciais à população, o que atinge frontalmente a PETROBRÁS – maior empresa brasileira – e seus trabalhadores.

Esta orientação do Governo Federal se coaduna com a política de alienação dos ativos da Petrobrás, o que dá sustentação factual à preocupação dos trabalhadores da ANSA. É mais um episódio do teatro de mudança destrutiva do patrimônio nacional que prossegue.

Prova da inconveniência social da medida foi a sensibilização dos 21.000 petroleiros que interromperam suas atividades em 121 unidades do Sistema Petrobrás, desde 1º de fevereiro, em 13 estados da Federação.

Insistimos, com convicção, no caráter solidário da iniciativa dos trabalhadores aderentes à paralisação, somente vencida, em duração, à de 1995, quando foi registrada a interrupção dos trabalhos durante 32 dias.

Porém, mesmo com tão significativa reação, o Tribunal Superior do Trabalho, em decisão monocrática de seu presidente, considerou o Movimento ilegal, identificando nele um caráter politico e se decidindo pelo bloqueio das contas sindicais e por uma multa de 250 a 500 mil reais diários, aplicada aos Sindicatos, nela incluída a mensalidade de seus associados.

A indiscutível dureza da decisão guarda coerência com o castigo grego aplicado aos infratores daquele longínquo ‘status’, fenômeno social que fez surgir na história da civilização a classe escrava. E, de fato, esta será a condição dos grevistas – que no uso de um condicionante constitucional, decidiram-se por correr o risco da miséria e da morte, para cujo vale serão conduzidos seus dependentes, seus cônjuges e filhos.

Sabemos que, na dureza das decisões, o Direito não exclui os Recursos nem a manifestação solidária dos trabalhadores, além do inalienável direito de opinião crítica, que agora praticamos. Crítica que fazemos por entender que o direito ao trabalho, indispensável à obtenção de renda e à própria sobrevivência, é o mínimo exigível ao pensamento de quem promove as sentenças.

Portanto, o monocrático ato decisório de alguém cujas decisões, em conflitos anteriores, já resultaram na discordância do colegiado – um sinal de não isenção de Sua Excelência –, trouxe como consequência um drama desnecessário e pouco inteligente, injusto e cruel. Uma intervenção que, trocando em miúdos, impede ao trabalhador o exercício legal de sua competência, na definição da oportunidade de interrupção de seu trabalho. No caso, a greve pretendia apenas garantir aos grevistas sua condição de trabalhadores.

Acrescente-se a esse drama a decisão de marcar, para mais de 15 dias, a apreciação do Colegiado, um visível agravante do conflito. Some-se a isso tudo, o valor da multa gigantesca aplicada aos Sindicatos. Uma desproporção que acena com o propósito de liquidação dos mesmos, em face da inviabilidade de seu cumprimento.

Mesmo o cidadão não especialista identifica com clareza o caráter infrator da decisão face às Normas da OIT – Organização Internacional do Trabalho.

Na análise da situação da ANSA, não podem ser desconsiderados fatores e circunstâncias relevantes como emprego, importância das atividades para a economia da região, essencialidade dos produtos da empresa para a economia do país dentre outros.

Esse nosso comentário provém do fato de que a PETROBRÁS defende a interrupção das atividades da ANSA – sua subsidiária integral –, com base no acúmulo de alegados prejuízos na sua atividade. Atividade fundamental à nação, no que tange à produção de fertilizantes. Curiosamente, os insumos necessários à ANSA provêm dos resíduos inevitáveis da REPAR – Refinaria do Paraná – Araucária – PR, mas, essa benesse não chega a influenciar a queda dos custos da empresa, devido à prática de preços internacionais, política com a qual não concordamos.

Aliás, abrindo o leque das discussões nesse contexto, lembramos que Gerson Castellano, diretor da FUP, questiona a Direção da Petrobrás, afirmando que tais prejuízos são apenas de natureza contábil. Bastaria, a nosso ver, esse tipo de dúvida, para que o Juiz fosse menos drástico e mais cauteloso no momento de sua decisão sobre o Movimento Grevista. Bastaria que ele pensasse no aumento do volume de importações de amônia, ureia e ARLA que o fechamento da ANSA exigirá do país.

Fica-nos muito claro que o propósito de fechamento da ANSA não considera aspectos sociais nem econômicos nem tecnológicos, mas simplesmente decisões de uma política de esvaziamento de ativos da empresa “holding”, cujos lucros, atribuídos ao exercício de 2019, derivaram-se fortemente da alienação de ativos lucrativos e estratégicos.

Nesta apreciação não entraremos em detalhes sobre a referida política. Tão somente identificaremos, que é nela que se baseia a decisão de interrupção das atividades da ANSA, em que pesem as inúmeras demissões e o fato de que o país depende da produção de fertilizantes, para prosseguimento em sua trajetória no agronegócio.

Aliás, não há ineditismo no fechamento da ANSA – FAFEN –Araucária. Há o caso das FAFENs de Camaçari (BA) e Laranjeiras (SE), arrendadas a grupos privados.

Por que fechar empresas tão comprometidas com os alvos de nossa Soberania? É certo que não nos faltam pessoal competente e competências, o que nos leva a concluir – ou mesmo ratificar – a consciência de que o propósito maior é livrar o Estado de tudo, para satisfazer a pretensão alienígena de dominar e controlar os nossos potenciais, mesmo que tal procedimento implique enfraquecimento civilizatório e agressão ao Direito Cidadão do povo brasileiro.

*Edson Monteiro, engenheiro, professor e escritor. É Conselheiro do Clube de Engenharia.

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