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Entrevista de Felipe Coutinho à Tribuna da Imprensa

Entrevista concedida ao jornalista Daniel Mazola

Publicado em 10/09/2018
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1- Com a crise global do capitalismo latente e o declínio do império estadunidense, faça uma breve análise da conjuntura do setor de petróleo e energia.

Felipe Coutinho*: O petróleo é uma mercadoria especial, na medida em que não tem substitutos em equivalente qualidade e quantidade. Sua elevada densidade energética e a riqueza de sua composição, em orgânicos dificilmente encontrados na natureza, conferem vantagem econômica e militar àqueles que o possuem.

A sociedade que conhecemos, sua complexidade, sua organização espacial concentrada, sua produtividade industrial e agrícola, o tamanho da superestrutura financeira em relação as esferas industrial e comercial, foi erguida e depende do petróleo.
O fim do petróleo barato de se produzir e a redução do excedente energético e econômico da indústria petroleira está transformando, aceleradamente, a sociedade.

É necessário garantir a propriedade do petróleo e ficar com seu valor de uso. Atender as necessidades dos brasileiros e erguer a infraestrutura dos renováveis para uma nova organização social.

As maiores multinacionais de capital privado do setor do petróleo não repõem suas reservas na taxa que são esgotadas, têm produção declinante, apresentam resultados financeiros fracos, e perderam boa parte de sua capacidade tecnológica, ao terceirizar suas atividades às empresas prestadoras de serviço. Em uma palavra, definham. Entre as principais causas, a adoção de modelo de negócios baseado em premissas falsas, com objetivo de maximizar o valor para o acionista no curto prazo, com precária visão estratégica ao não compreender o ambiente de negócios, seguindo bovina e consensualmente planos similares baseados em informações de “consultorias independentes”, ao negar restrições socioeconômicas, além de ignorar limites naturais. Caso a Petrobras adote modelo parecido terá o mesmo destino, em breve.

2- Muito se fala na mídia monopolista sobre a dívida corporativa e o endividamento da Petrobras, o que é fato e o que é mistificação? E qual é a melhor forma da Petrobrás reduzir seu endividamento sem se desfazer de ativos importantes?

Quem pensa que a Petrobrás está quebrada, que a produção do pré-sal é lenta, que o pré-sal é um mico e não tem valor ou que a exportação de petróleo por multinacionais pode desenvolver o Brasil, está sendo enganado. É vítima da ignorância promovida pelos empresários da comunicação, políticos e executivos à serviço das multinacionais do petróleo e dos bancos.

A Petrobrás é a maior e mais importante empresa do país. Embora tenha sido vítima de corrupção sempre esteve muito longe do risco de falência. A estatal é uma grande geradora de caixa. Entre 2012 e 2017, a geração se manteve estável entre 25 e US$ 27 bilhões por ano. Também neste período manteve enormes reservas em caixa, entre 13,5 e US$ 25 bilhões, superiores as multinacionais estrangeiras. A capacidade de honrar compromissos de curto prazo sempre foi evidenciada pelo índice de liquidez corrente superior a 1,5.

A dívida da Petrobrás é proporcional às reservas em desenvolvimento do pré-sal e aos investimentos de mais de US$ 250 bilhões, de 2009 a 2014, sendo perfeitamente administrável pela companhia que cresce, tanto na produção, quanto na geração operacional de caixa.

3- Com essa política neoliberal e entreguista, quais consequências a Petrobrás terá no futuro com a política de desinvestimentos?

A privatização desnecessária dos ativos lucrativos e estratégicos, como a malha de gasodutos do Sudeste (NTS) e a alienação de acumulações de petróleo e gás natural promissoras, como Carcará, comprometem o futuro da Petrobrás e do Brasil.
Com isso se compromete a geração de caixa e se assume riscos empresariais desnecessários com a maior vulnerabilidade a variação dos preços relativos do petróleo e seus derivados.

Também se compromete o futuro da companhia com o abandono da produção dos biocombustíveis que ocupam o mercado dos combustíveis fósseis, dos petroquímicos e fertilizantes que podem agregar valor ao petróleo e ao gás natural.

4- Assange e Snowden foram homenageados pela Comissão de Defesa da Liberdade de Imprensa e DH da Associação Brasileira de Imprensa-ABI em 2013 por iniciativa minha e do confrade Jakobskind. O que a AEPET tem feito para divulgar os planos secretos da espionagem americana?

Produzimos artigos, vídeos e seminários que tratam da ingerência dos EUA na disputa pelo pré-sal e a renda petroleira.

Desde a descoberta do petróleo no pré-sal ocorreram eventos geopolíticos e econômicos relevantes. No Brasil contemporâneo, o petróleo e a Petrobras sempre estiveram no centro dos debates entre projetos políticos para o nosso país. Desde a campanha “O Petróleo é Nosso” que interesses contraditórios disputam a narrativa, o senso comum e o poder político para condução nacional. Em 2018, nas eleições gerais, a disputa pelo petróleo e a renda petroleira continua no centro da contenda.
Apresentamos fatos relevantes desde a descoberta do pré-sal (2006) à privatização acelerada do petróleo brasileiro e dos ativos da Petrobras (desde 2016). Destaco:

1) Anúncio da descoberta do pré-sal – 2006
2) 1a extração do pré-sal, em Tupi (atual Lula) – novembro de 2007
3) Roubo dos notebooks e HDs da Petrobras – janeiro de 2008
4) Reativação da Quarta Frota dos EUA – abril de 2008
5) Lei da Partilha do pré-sal – agosto de 2009
6) EUA treinam agentes judiciais brasileiros - outubro de 2009
7) Reunião de executiva da Chevron no consulado dos EUA sobre a reversão da Lei da Partilha– dezembro de 2009
8) Protestos de junho de 2013
9) Brasil e Petrobras são alvos da espionagem dos EUA –2013
10) Operação Lava Jato e “cooperação internacional”- março de 2014
11) Golpe do impeachment da presidenta Dilma Roussef – maio de 2016
12) Temer assume agenda das multinacionais do petróleo – a partir de maio de 2016
13) Nova política de preços da Petrobras, exportação de petróleo cru, importação de derivados e ociosidade do refino – desde outubro de 2016
14) “Parcerias estratégicas”, o novo codinome da privatização dos ativos da Petrobras – desde 2016
15) Pagamento de US$ 2,95 bilhões aos acionistas da Petrobras nos EUA – janeiro de 2018
16) Pré-sal representa mais de 50% da produção brasileira de petróleo – 2018

Recomendo o artigo e o vídeo “Eventos históricos da disputa pelo pré-sal e a renda petroleira”.

5- A imprensa de mercado insiste em usar a Lava Jato para desmoralizar e entregar a Petrobras ao estrangeiro, qual mecanismo pode ser usado para desconstruir essa mistificação sobre a Petrobrás? Qual o melhor meio para disputarmos a opinião pública na defesa das riquezas nacionais, da Petrobrás e Soberania Nacional

Temos que disputar o senso comum e a opinião pública em defesa da verdade sobre a Petrobrás. A luta pela verdade deve ter precedência e é revolucionária. O povo não é bobo, pesquisa recente mostrou que 70% dos brasileiros são contra a privatização da Petrobrás, enquanto 78% são contra o capital estrangeiro na estatal.

O melhor campo para a batalha das ideias é a internet porque é mais democrática, acessível e eficiente.

A Associação dos Engenheiros da Petrobrás – AEPET – é uma fábrica de ideias em defesa da companhia.

É necessário perguntar:

Defender a Petrobrás de quem? De quais interesses?

Em favor de quem?

O que está em disputa é a renda petroleira, a propriedade do petróleo e os objetivos do seu uso.

As multinacionais privadas que são controladas pelo sistema financeiro querem se apropriar da renda petroleira para maximizar seus lucros no curto prazo.

Querem produzir e se apropriar do petróleo aos menores custos e riscos, com total liberdade para exportá-lo.

Os bancos querem financiar os empreendimentos e garantir o recebimento prioritário da maior taxa de juros possível. Quanto maior a velocidade da extração mais rápido se apropriam desta fração da renda petroleira.

As estatais estrangeiras querem garantir a segurança energética de seus países. Querem transferir a renda petroleira na aquisição de bens e serviços. Querem gerar empregos qualificados em seus países.

Outros interesses privados disputam a renda petroleira, os empreiteiros, os licenciadores de tecnologias, os industriais consumidores dos derivados e os comerciantes de combustíveis.
Aos rentistas interessa que o Estado privatize seus ativos e recursos naturais para garantir o pagamento dos elevados juros da dívida pública.

Os políticos traficantes de interesses e os executivos de aluguel servem aos poderosos interesses privados que cercam a Petrobrás, o petróleo brasileiro e a renda petroleira.

Cabe a AEPET defender a Petrobrás destes poderosos interesses antinacionais.

Em favor dos interesses da grande maioria dos brasileiros, dos estudantes, dos trabalhadores e dos aposentados.

Para que nosso país seja soberano e utilize seus recursos e o fruto do trabalho dos brasileiros para o desenvolvimento, com justiça e dignidade social.

Existe correlação entre o desenvolvimento humano e o consumo de energia per capita. O consumo no Brasil é próximo ao do Paraguai, é cerca de seis vezes menor em relação aos EUA e quatro vezes menor do que a Noruega.
Também existe relação entre o consumo de energia e o crescimento econômico.

Nosso desenvolvimento depende da produção do petróleo na medida das nossas necessidades e em suporte ao progresso do Brasil.

Agregar valor ao petróleo, desenvolver uma indústria forte e diversificada, planejar a distribuição da renda petroleira através do desenvolvimento tecnológico e da produção de bens e serviços especializados.
Utilizar a renda petroleira para levantar a infraestrutura da produção dos biocombustíveis e das energias potencialmente renováveis.

Nenhum país se desenvolveu exportando petróleo por multinacionais estrangeiras.

Nenhum país, continental e populoso como o Brasil, se desenvolveu exportando petróleo cru ou matérias primas.

* Felipe Coutinho é Presidente da Associação dos Engenheiros da Petrobrás (AEPET)
Engenheiro Químico desde 1997, especialista em Engenharia de Processamento pela Petrobras desde 2000, com experiência nas áreas de Pesquisa aplicada, Desenvolvimento e Engenharia básica (PD&E) no Centro de Pesquisas (Cenpes) e na área de Projetos, especialista nas energias potencialmente renováveis com ênfase nos biocombustíveis. Engenheiro de Processamento Sênior e Consultor (especialista técnico)

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Daniel Mazola
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