O efeito China no aumento das importações brasileiras

China sozinha foi responsável por 42% do aumento do coeficiente de penetração de importações de bens da indústria de transformação no Brasil entre 2010 e 2023

Publicado em 08/01/2025
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O Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial - IEDI vem analisando as relações comerciais entre o Brasil e a China dos últimos anos e seus efeitos para a nossa indústria. Duas Cartas IEDI já foram divulgadas sobre este tema, com foco na complexidade de nossa estrutura econômica e de nossas exportações: Carta n. 1292 “O comércio Brasil-China e nossa perda de complexidade econômica” e Carta n. 1294 “A complexidade das exportações brasileiras e a concorrência da China”.

Adicionalmente, também abordamos os efeitos dos subsídios chineses sobre os fluxos internacionais de comércio no período entre 2009 e 2022, a partir da análise feita por pesquisadores do FMI no estudo “Trade Implications of China’s Subsidies”, de autoria de Lorenzo Rotunno e Michele Ruta, na Carta IEDI n. 1295 “O comércio mundial e os subsídios chineses”.

Na presente edição, damos ênfase ao aumento da penetração de importações no mercado brasileiro de produtos industriais, destacando a contribuição da China. Além disso, também retomamos a discussão sobre os padrões de comércio entre Brasil e China, mas agora sob a perspectiva da intensidade tecnológica dos setores industriais, complementando a análise da Carta n. 1292.

Em síntese, o comércio internacional do Brasil com a China segue um padrão “centro-periferia”, onde o Brasil exporta predominantemente produtos básicos com baixo grau de processamento industrial e importa produtos manufaturados de maior intensidade tecnológica, exacerbando a trajetória de retrocesso industrial do país.

Ou seja, a China aprofunda nossa dependência das exportações de commodities. Vale lembrar o estudo da UNCTAD, discutido na Carta IEDI n. 1101, que argumenta que a experiência internacional indica que os países em desenvolvimento dependentes de commodities permanecem presos por longos períodos em uma situação de baixo crescimento do PIB e fraco desenvolvimento socioeconômico, instabilidade macroeconômica, alta exposição a choques e à volatilidade dos preços internacionais das commodities, entre outros problemas.

Nas últimas décadas, a China vem ganhando market share na pauta de importações do Brasil em ritmo acelerado. Entre 2000 e 2023, a participação da China nas importações brasileiras de bens da indústria de transformação aumentou dez vezes, de 2,5% para 25%. O crescimento foi ainda mais expressivo em alguns setores mais tecnológicos, como equipamentos de informática, produtos eletrônicos e material elétrico, bem como em setores de baixa tecnologia, como têxteis, vestuário e confecções.

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Neste estudo, preparado pelo economista Paulo Morceiro para o IEDI, entre outros indicadores, calculamos o coeficiente de penetração das importações no período recente para avaliar o peso das importações no consumo doméstico e a contribuição da China para o aumento desse coeficiente.

Cabe observar que o coeficiente de penetração das importações mensura o peso das importações no consumo doméstico brasileiro, ou melhor, no chamado “consumo aparente” do país, que é a soma da produção industrial doméstica mais importações menos exportações.

A seguir, resumimos os principais resultados.

Entre 2010 e 2023, o coeficiente de penetração das importações da indústria de transformação do Brasil aumentou de 15,8% para 23,2%, ou seja, +7,4 pontos percentuais (p.p.). Isso, vale notar, a despeito de uma desvalorização de 58% de nossa taxa de câmbio real efetiva.

Além de intensa, a elevação da penetração dos importados também foi bastante difundida entre os ramos industriais. Todos os 24 ramos registraram alta, sendo que aquele que mais se aproximou de uma virtual estabilidade foi o ramo de impressão e reprodução, cujo coeficiente passou de 2,66% para 2,72%.

Onde a penetração de importados progrediu mais entre 2010 e 2023 foi na indústria de alta e média-alta intensidade tecnológica, cujo indicador aumentou em quase 50% no período, passando de 25,6% para 39,2% (+13,6 p.p.). Seis dos sete ramos de alta e média-alta tecnologia apresentaram aumentos de dois dígitos.

A China sozinha foi responsável por 42% do aumento do coeficiente de penetração de importações de bens da indústria de transformação no Brasil entre 2010 e 2023. Neste último ano, os produtos industriais chineses responderam por ¼ da penetração de importados do país.

A contribuição da China foi significativa na penetração de importados na maioria dos ramos industriais, superando 50% em mais de 1/3 deles. Todo o aumento do coeficiente nos ramos têxteis, impressão e reprodução, informática e eletrônicos e máquinas e equipamentos se deve exclusivamente à China.

Nos setores de alta e média-alta tecnologia, a contribuição só não foi superior a 30% na farmacêutica e em outros equipamentos de transporte, segmentos onde a Europa e os EUA produzem bens mais sofisticados e ainda são mais competitivos do que a China no comércio internacional.

Para alguns ramos, o período pós pandêmico se destaca como importante momento de elevação do coeficiente de penetração de produtos chineses. São os casos, por exemplo, de couros e calçados e de produtos químicos, para quem o período 2019-2023 responde por metade do aumento do coeficiente do período integral de 2010-2023, de veículos e de informática, eletrônicos e ópticos com 60% do aumento em 2019-2023, e notadamente metalurgia, que inclui o ramo siderúrgico, para quem 90% do aumento da penetração de importados chineses se deu após a pandemia de Covid-19.

Em síntese, produtos importados continuaram avançando no mercado doméstico nos últimos 15 anos, refletindo períodos de apreciação cambial, como em 2004-2012, mas também defasagens tecnológicas, baixa produtividade e deterioração das condições de competitividade da indústria brasileira, ao mesmo tempo que em outros países, como a China, reforçaram ações de promoção de seu desenvolvimento industrial, como discutido nas Cartas IEDI n. 827 de 26/11/18, n. 961 de 29/11/19, n. 1088 de 18/06/21, n. 1094 de 16/07/21 e n. 1171 de 18/11/22, entre outras.

Não por acaso, a China desempenhou um papel preponderante no aumento do coeficiente de penetração de bens importados da indústria de transformação no Brasil, sobretudo em ramos de maior intensidade tecnológica. A isso, se deve agregar a conclusão de outros estudos realizados pelo IEDI, citados inicialmente, que mostram que a China também deslocou produtos industriais brasileiros em mercados externos de peso para o país.

Pari passu a estas trajetórias, verificamos a perda de complexidade econômica do Brasil, comprometendo nossas condições de crescimento econômico e de geração de empregos, como argumentam os professores Ricardo Hausmann da Universidade de Harvard e César Hidalgo do MIT, que desenvolveram a abordagem da complexidade econômica.

Fica, assim, evidente a necessidade urgente de recompormos as condições de competitividade nacional de forma estrutural, por meio de uma adequada reforma tributária, melhoria de nossa infraestrutura e redução do custo de capital ao investimento produtivo, bem como outros fatores há muito defendidos pelo IEDI, como podem ser verificados no documento “Indústria e Estratégia de Desenvolvimento Socioeconômico do Brasil”.

Acelerar a inovação e a atualização tecnológica da indústria nacional, em direção à sustentabilidade e à digitalização, também é vital para inaugurarmos uma nova fase de aumento da sua produtividade, determinante último de sua competitividade de longo prazo. Uma boa implementação da NIB – Nova Indústria Brasil – é um caminho a ser sistematicamente perseguido e aprimorado.

Por fim, e não menos importante, o Brasil deve estar atento a práticas desleais de comércio internacional, aperfeiçoar sua política de defesa comercial e adotar tempestivamente medidas antidumping sempre que forem necessárias.

Clique aqui para ler o estudo completo

Fonte(s) / Referência(s):

Jornalismo AEPET
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