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Fernando Alcoforado

A verdade sobre o "rombo" nas contas públicas do Brasil e a reforma da Previdência

A reforma da Previdência vem sendo colocada pelo governo Bolsonaro como a soluçãopara o déficit das contas públicas que está estimado

Publicado em 14/02/2019
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A reforma da Previdência vem sendo colocada pelo governo Bolsonaro como a solução para o déficit das contas públicas que está estimado em R$ 139 bilhões no orçamento de 2019. Trata-se de um engodo que se vende para a população brasileira, porque este déficit e aqueles que aconteceram em 2015, 2016, 2017 e 2018 resultaram, fundamentalmente, da crise recessiva que levou à queda do crescimento econômico do Brasil desde 2014 e contribuiu para a redução da arrecadação de impostos, dos encargos excessivos do governo federal com o pagamento da sempre crescente dívida pública e, também a gigantesca dívida de grandes empresas para com a Previdência Social.

O crescimento econômico do Brasil foi negativo de 2014 a 2018 (-3,8% em média) que fez com que houvesse redução na arrecadação de impostos do governo. O governo federal paga anualmente R$ 1,5 trilhão aos banqueiros e usurários donos dos títulos da dívida pública que daria pra resolver todos os problemas do Brasil. A dívida estimada das empresas devedoras da Previdência Social em todo Brasil, soma um valor de R$ 426 bilhões que representaria a solução para o déficit da Previdência. Tudo isto contribuiu para o déficit das contas públicas no Brasil. Para resolver problema do déficit nas contas públicas, motivo este alegado pelo governo Bolsonaro para realizar a reforma da Previdência, o governo federal deveria adotar como estratégia fundamental a reativação da economia brasileira que, além de fazer frente ao problema do desemprego de 13 milhões de trabalhadores, contribuiria para elevar a arrecadação de impostos com um amplo programa de obras públicas de infraestrutura (energia, transporte, habitação, saneamento básico, etc) e, em consequência, promover a expansão do consumo das famílias resultante do aumento do emprego e da massa salarial e a renda das empresas com os investimentos em obras públicas.

Além do programa de obras públicas, o governo brasileiro deveria desenvolver um amplo programa de exportações, sobretudo do agronegócio e do setor mineral e promover a redução drástica das taxas de juros bancárias para incentivar o consumo das famílias e o investimento pelas empresas, a redução dos custos da administração pública com o congelamento dos altos salários do setor público, o corte de mordomias e de órgãos da administração pública.

Além da adoção da estratégia de reativação da economia brasileira para elevar a arrecadação de impostos e de redução dos custos da administração pública, o governo federal deveria promover auditoria da dívida pública seguida de redução dos encargos com o pagamento de juros e amortização da dívida pública a ser renegociada com os credores da dívida pública. O Orçamento Federal para 2019 corresponde a R$ 3,262 trilhões. Dentre as despesas, sobressai o gasto financeiro com a chamada dívida pública, que consumirá quase 44% de todo o orçamento, ou seja, R$ 1,425 trilhão. O gasto coma dívida compreende o gasto com amortizações da dívida de R$ 1,046 trilhão e o gasto com juros e encargos da dívida de R$ 379 bilhões, somando R$ 1,425 trilhão. O gastocom servidores públicos – ativos e aposentados – consumirá R$ 350,4 bilhões. As despesas com a Previdência Social (INSS) estão previstas para R$ 625 bilhões, bem menos da metade do que será gasto com a dívida pública. O valor destinado a investimentos é insignificante para um país como o Brasil de apenas R$ 36 bilhões.

Portanto, o rombo das contas públicas está claramente localizado nos gastos financeiros com a chamada dívida pública – que nunca foi auditada, como manda a Constituição enão nas despesas com a Previdência. Além da adoção da estratégia de reativação da economia brasileira para elevar a arrecadação de impostos, de redução dos custos da administração pública e de redução dos encargos com o pagamento de juros e amortização da dívida pública a ser renegociada com os credores da dívida pública, o governo federal deveria ir atrás dos grandes devedores da Previdência Social cuja dívida totaliza R$ 426 bilhões cujo valor representaria a solução do déficit da Previdência.

Cabe observar que, entre os 400 maiores devedores da Previdência Social estão Bradesco (R$ 465,2 milhões), Itaú (R$ 88,8 milhões), Caixa Econômica (R$549,5 milhões), Banco do Brasil (208,2 milhões), Santander (R$ 80,8 milhões), Banco Rural (R$ 124,8 milhões), CBTU (R$ 131,6 milhões) Friboi (R$ 1,8 bilhão), Jornal do Brasil (274,9 milhões), Lojas Americanas (R$166 milhões), Oi (R$ 126,5 milhões), Usina Santa Rita (R$ 205,5 milhões), Usina Santa Helena (R$ 159, 8 milhões), Usina Santa Maria (R$ 76,7 milhões), Vasp (R$ 1,5 bilhão), antiga Parmalat (R$ 25 bilhões). Estes são apenas alguns dos casos de grandes devedores da Previdência Social.

Além do engodo representado pela reforma da Previdência Social como solução para o déficit das contas públicas, o governo Bolsonaro apresenta uma proposta draconiana contra a população brasileira que venha a se aposentar no futuro. A Proposta de Emenda Constitucional (PEC) da equipe econômica do governo Bolsonaro retoma medidas da primeira proposta do governo Michel Temer, como equiparar a idade de aposentadoria entre homens e mulheres em 65 anos. O governo quer fixar o tempo de contribuição de 40 anos para quem quiser receber o valor integral do benefício. Mas a grande novidade do texto é a criação de um sistema de capitalização. Neste sistema, o fundo da Previdência é extinto. As contribuições vão para uma conta individual e são aplicadas em investimentos. O valor é definido na contratação do plano, e o benefício que será recebido varia de acordo com a rentabilidade. Hoje, o modelo da Previdência se baseia no sistema de repartição: há contribuição de trabalhadores, das empresas e do Estado. Ou seja, um fundo financeiro que cresce quando o emprego cresce.

Com a reforma da Previdência do governo Bolsonaro, haveria, portanto, a fixação da idade mínima de 65 anos para homens e mulheres. Idosos carentes receberiam menos do que um salário mínimo. O benefício integral do regime do INSS só seria obtido com 40 anos de contribuição. Foi proposto pagar menos de um salário mínimo a um idoso carente. Além de cruel, é uma ideia pouco inteligente porque quem ganha salário mínimo utiliza este recursos rapidamente em benefício da economia. O problema da Previdência não é quem recebe um mínimo. Esse benefício social deve ser preservado.

Privilégios é que devem ser combatidos. O rombo fiscal é responsabilidade das altas aposentadorias do funcionalismo público, inclusive dos militares, e também de benefícios de maior valor do regime do INSS a profissionais liberais que conseguem se aposentar a partir dos 50 e poucos anos. É justo fixar uma idade mínima, mas é preciso preservar os mais pobres. Se aprovada, a reforma da Previdência de Bolsonaro aumentará as desigualdades sociais no Brasil.

A reforma da Previdência do governo Bolsonaro tem apenas a previsão legal da capitalização que teria caráter obrigatório. O custo social dessa mudança é o seguinte: só os trabalhadores que conseguirem poupar uma parte do seu salário poderão fazer uma reserva para sua fase de aposentadoria. Com os baixos salários que temos hoje no Brasil e com quatro em cada dez trabalhadores no país no mercado informal, pouquíssimos brasileiros poderão ter uma aposentadoria no futuro. E o Estado brasileiro resolveu abandonar essa parcela da população porque, simplesmente, o regime de repartição com a contribuição do trabalhador, da empresa e do governo acabaria. Este modelo do governo Bolsonaro, inspirado na reforma da Previdência do Chile da década de 1980 durante a ditadura Pinochet, será um desastre para o povo brasileiro. 

A reforma da Previdência não vai resolver o problema do déficit público como demonstramos, muito pelo contrário, porque o sistema de capitalização vai reduzir as receitas da Previdência Social e provocar um déficit no regime geral, de repartição, que vai continuar existindo porque há aposentados que pertencem a esse regime. O grande beneficiário na reforma da Previdência Social é o sistema financeiro. A reforma da Previdência Social reduz a proteção ao trabalhador, a garantia de renda no futuro e transfere recursos públicos para os bancos privados. Essa proposta não oferece nenhum ganho para a sociedade. Quem ganha com esta proposta são os bancos. Um país civilizado não pode abrir mão de um sistema de proteção social. O governo não pode entregar para o capital especulativo a responsabilidade de lidar com a aposentadoria dos trabalhadores. Quem tem filhos, netos e bisnetos precisa lutar para impedir que a reforma da Previdência Social do governo Bolsonaro seja aprovada pelo Congresso Nacional e exigir que seja adotada uma política econômica que reative o crescimento econômico, faça auditoria da dívida pública com a redução dos encargos com o seu pagamento e exigir o pagamento da dívida pelos grandes devedores da Previdência Social.

*Fernando Alcoforado, 79, detentor da Medalha do Mérito do Sistema CONFEA/CREA, membro da Academia Baiana de Educação, engenheiro e doutor em Planejamento Territorial e Desenvolvimento Regional pela Universidade de Barcelona, professor universitário e consultor nas áreas de planejamento estratégico, planejamento empresarial, planejamento regional e planejamento de sistemas energéticos, é autor dos livros Globalização (Editora Nobel, São Paulo, 1997), De Collor a FHC- O Brasil e a Nova (Des)ordem Mundial (Editora Nobel, São Paulo, 1998), Um Projeto para o Brasil (Editora Nobel, São Paulo, 2000), Os condicionantes do desenvolvimento do Estado da Bahia (Tese de doutorado. Universidade de Barcelona, http://www.tesisenred.net/handle/10803/1944, 2003), Globalização e Desenvolvimento (Editora Nobel, São Paulo, 2006), Bahia- Desenvolvimento do Século XVI ao Século XX e Objetivos Estratégicos na Era Contemporânea (EGBA, Salvador, 2008), The Necessary Conditions of the Economic and Social Development- The Case of the State of Bahia (VDM Verlag Dr. Müller Aktiengesellschaft & Co. KG, Saarbrücken, Germany, 2010), Aquecimento Global e Catástrofe Planetária (Viena- Editora e Gráfica, Santa Cruz do Rio Pardo, São Paulo, 2010), Amazônia SustentávelPara o progresso do Brasil e combate ao aquecimento global (Viena- Editora e Gráfica, Santa Cruz do Rio Pardo, São Paulo, 2011), Os Fatores Condicionantes do Desenvolvimento Econômico e Social (Editora CRV, Curitiba, 2012), Energia no Mundo e no Brasil- Energia e Mudança Climática Catastrófica no Século XXI (Editora CRV, Curitiba, 2015), As Grandes Revoluções Científicas, Econômicas e Sociais que Mudaram o Mundo (Editora CRV, Curitiba, 2016), A Invenção de um novo Brasil (Editora CRV, Curitiba, 2017) e Esquerda x Direita e a sua convergência (Associação Bahiana de Imprensa, Salvador, 2018, em co-autoria).

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