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Pedro Augusto Pinho
Administrador aposentado, foi membro do Corpo Permanente da Escola Superior de Guerra (ESG) e Consultor das Nações Unidas (UN/DTCD).

Cid, Jair, Torres e Arruda: os novos ‘Trapalhões’ – 4

Torna-se imperativo colocar os militares de todas as patentes em sala de aula

Publicado em 07/02/2023
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“O homem, como produto da natureza, não existe: é a educação que o forma. Ele só pode subsistir adaptado ao meio; mas a importante adaptação refere-se ao meio moral-social, adaptação que resulta exclusivamente da educação. É a educação que socializa o homem. E ela se torna, cada vez mais, uma função da vida social. Referimo-nos, explicitamente, à sociedade-nação, representada no Estado como fórmula ativa dos direitos da coletividade. Então impõe-se a conclusão: educar não é somente o dever correlato do direito que tem a criança a ser levada à plena condição de homem; mas o interesse social-nacional de melhorarem-se as unidades, a fim de elevar-se o nível da nação”. Manoel Bomfim, O Brasil Nação Realidade da Soberania Brasileira, 1931.

4ª Parte: Retornar às aulas para entender o Brasil

À influência alienígena dos estadunidenses passamos a receber, a partir da década de 1970, a desinformação neoliberal. De colônia dos Estados Unidos da América (EUA) passamos a colônia do indeterminado sistema financeiro apátrida, autodenominado global.

Vê-se entrar nas Escolas Militares, do preparo para o comando às instruções básicas profissionais, personalidades, glorificadas pelas mídias como pensadores, intelectuais, brasileiros e estrangeiros, imaculados homens e mulheres, apenas por serem apóstolos do Consenso de Washington.

E quem não professasse imediatamente o credo não era capaz de realizar coisa alguma, transformava-se em pária, que, como escravos nos primeiros quatro séculos de existência de Nação, poderiam, simplesmente, desaparecer, sem que isso causasse o menor constrangimento, a mais ingênua questão sobre seus destinos.

No período da influência estadunidense, os militares brasileiros recebiam, em português, a Military Review, que trazia no subtítulo “Publicação Profissional do Exército dos EUA”.

Tomada ao acaso, entre diversos exemplares da Military Review (nº 5, volume XLVII, maio de 1967), o artigo “Ensino nas Academias”, assinado por Richard de Neufville, oficial da Reserva do Exército dos EUA, professor no Instituto Tecnológico de Massachusetts (MIT), encontra-se: “O que podem e devem as academias fazer para permanecerem entre as melhores escolas nacionais? Este problema é particularmente urgente devido às revolucionárias modificações nas disciplinas científicas; o desenvolvimento da análise de sistemas, com as suas inúmeras implicações, e a rápida obsolescência do preparo técnico em todas espécies. As academias militares são indubitavelmente sui generis, devido a sua missão especial”.

Nestas três frases estão sendo passadas a diferenciação dos militares da população do País, a excelência do ensino militar estadunidense e sua constante atualização, que o Brasil não poderia dispensar.

Ilustra a matéria a foto de um militar operando computador com a legenda que, desde 1950, assim se preparavam em West Point. No Brasil, na década seguinte, os computadores, de segunda geração, a válvula, eram tão poucos que se relacionavam um a um, na coluna “Processamento de Dados”, do jornal carioca Correio da Manhã, única na América do Sul sobre informática.

A ideologia neoliberal entrou nas FFAA, como nas mídias e nas mentes brasileiras, como resposta ao comunismo. A guerra fria dividia o mundo em dois blocos e não aceitava qualquer Terceira Via, como se viu nas consequências da Conferência de Bandung (Indonésia, abril de 1955).

O neoliberalismo se apresentava como democrático, de possibilidades para todos que se dispusessem a “empreender”, e aceitassem as condições competitivas do mercado. Um conjunto de falácias que não admitia contestação, embora a realidade, mostrada até no Senado dos EUA, fosse muito diferente.

O século 19 foi dominado pelas finanças inglesas, superadas pela industrialização dos EUA, que, após a Guerra da Secessão, foi formando conglomerados industriais e, após as duas Grandes Guerras do século 20, ganhou o poder, dentro e fora do País. Mas a concentração é um fenômeno do capitalismo que acumula poderes técnicos, econômicos e políticos. Vejam-se os “Konzerns” germânicos, os “Zaïbatsus” nipônicos e os trustes, cartéis, oligopólios e monopólios por todo mundo.

Dados de 1974 apontam que a indústria química estava concentrada em dez empresas; seis empresas estadunidenses e uma anglo-holandesa representavam quase todo petróleo comercializado no planeta; o mesmo nível concentração era encontrado na indústria automobilística, siderúrgica e de extração mineral.

Ao fim desta segunda década do século 21, com 30 anos de domínio financeiro, são os gestores de ativos que comandam toda economia mundial. Os cinco maiores gestores de ativos ou de fundos no mundo (BlackRock, Vanguard, Fidelity, State Street e Morgan Stanley) concentram mais de US$ 30 trilhões, superior à soma do Produto Interno Bruto (PIB) dos EUA com o da República Popular da China (RPCh).

Com a epidemia da Covid-19, fabricada em laboratório, arma de guerra das finanças neoliberais, fizemos o levantamento dos principais acionistas das cinco maiores empresas farmacêuticas atuais. São:

1 – Johnson & Johnson: Vanguard, State Street, BlackRock, Geode e Northern Trust;

2 – Pfizer: Frank A. D’amelio, John Young e Mikael Dilsen, Vanguard, BlackRock e State Street;

3 – Roche: Fidelity, Yorkville, R.E. Dickinson, Sierra Capital e BCI (Banco Comercial de Investimentos) Asset Management;

4 – AbbVie: Vanguard, BlackRock, State Street, Capital R&M e JP Morgan; e

5 – Novartis: Dodge & Cox, Prime Capital, Loomis, Saylis & Co., Fisher, Franklin Mutual.

Ainda há dúvida quem detém o poder, especialmente no mundo unipolar do ocidente? Por que então militares declaram ter medo do perigo comunista?

Porque, hoje, o comunismo é o gaulês dos romanos, o herege medieval para igreja católica, o judeu ou cigano na Alemanha Nazista, o pobre, preto e desvalido no Brasil de sempre; nenhuma ameaça, mas tremendo desconforto aos que usufruem de condições privilegiadas. Delenda esse!

Os desafios no século 21

Em novembro de 1972, A Nova Revista dos Dois Mundos, publicada na França, editou um número sobre a América Latina (“Regards sur L’Amérique Latine”) no qual colaborou, na qualidade de Embaixador do Brasil na França, o general Aurélio de Lyra Tavares, com artigo de título “A Integração Nacional”. Nele encontramos o seguinte parágrafo: “A grande e contínua transformação do novo Brasil é um fenômeno que se desenvolve desde que, em 1964, a nação conseguiu sair do caos tomando consciência de seus graves problemas, sendo o mais urgente o da terrível inflação monetária” (tradução livre).

Vejamos a história. Em 1972, governava o Brasil o general Emílio Médici. Foi período de grande crescimento econômico (Milagre Brasileiro) e iniciativas na área social, que destacamos o Prorural e o Incra, e as Empresas Embrapa, Infraero, Telebrás, Embraer, Itaipu Binacional, Dataprev, além de programas de desenvolvimento regional. Na área educacional, criou o Mobral, o Projeto Rondon e a inclusão nos currículos escolares das disciplinas Educação Moral e Cívica e Organização Social e Política.

Por que o general e embaixador Lyra Tavares, após dar destaque ao combate à inflação, como se obras como Transamazônica, Ponte Rio-Niterói, expansão do mar territorial a 200 milhas não representassem encargos financeiros ao Brasil, passa a discorrer sobre literatura, música, pintura, arquitetura? Nenhuma palavra sobre a criação de empresas e instituições que dariam suporte ao desenvolvimento nacional?

E por que Médici e Geisel são principalmente referidos pelas indesculpáveis torturas praticadas em quartéis e delegacias, com morte de presos, sem culpa formada em juízo? Vê-se a confusão que um militar graduado tem na cabeça. E por quê?

Houve e continua existindo na formação dos militares brasileiros muita ideologia estrangeira e pouco conhecimento do Brasil. Quando no Império, colônia inglesa, aceitávamos acriticamente o que vinha da Europa, após o interregno nacionalista dos governos Varga, voltamos a ter doutrinação alienígena, desta vez anticomunista e pró-estadunidense. Agora, desde a divulgação do decálogo Consenso de Washington, alienando tudo que for nacional para capitais apátridas, como se uma entidade que tem dono, sempre teve, como já vimos, que é o mercado, agisse com mágicas.

Tomemos mais um caso real. A refinaria, símbolo da capacitação da Petrobrás, primeira a ser construída, foi a RLAM – Refinaria Landulfo Alves Mataripe, homenageando o senador baiano. Foi vendida para fundo de investimento dos Emirados Árabes Unidos (Abu Dhabi), Mubadala Capital, por US$ 1,8 bilhão, valor já corrigido.

No formato das refinarias, projetado pela Petrobrás, para otimizar os custos de distribuição e transporte, cada uma atendia determinada região do Brasil. Como eram, todas elas, órgãos operacionais do Departamento Industrial da Petrobrás, nunca houve razão para serem alienadas, cada uma detinha um monopólio regional de fornecimento de derivados. Eventuais paradas para manutenção ou quaisquer problemas nos processamentos, o Departamento determinava transferências e medidas adequadas. Jamais houve falta.

Mas a atual Refinaria de Mataripe recebeu um monopólio sem precisar se responsabilizar pelo atendimento aos consumidores. Resultado, os nordestinos, especialmente os baianos, pagam os mais caros derivados do Brasil e as embarcações que atendiam o comércio nas ilhas e localidades da Baia de Todos os Santos, estão paralisadas porque a Mubadala, otimizando seus ganhos, deixou de produzir bunker, combustível para atender as embarcações, aumentando a produção de diesel, gasolina e gás, produtos mais caros.

Mas as FFAA não se pronunciaram, os seguidores dos mais de 4 mil militares que ocuparam cargos civis no governo Bolsonaro não pensaram como ficará o Brasil com as Mubadalas no comando da produção nacional de derivados do petróleo. Mas a família (que família, a neopentecostal?) está livre do perigo comunista (sic). Mas estariam os brasileiros livres dos neoliberais que estão destruindo a Nação?

Torna-se imperativo colocar os militares de todas as patentes em sala de aula. Primeiro, como já propunha o presidente Médici, para estudar profundamente o Brasil. Entender o que se passou e porque ocorreu cada fato de nossa história. Que forças o impulsionaram, quem foi o beneficiado e o prejudicado, mas sem questões ideológicas ou partidárias. Eram brasileiros ou estrangeiros? Pessoas físicas ou jurídicas?

Depois de conhecer muito bem o Brasil, estudar a Teoria do Poder. Quem está efetivamente mandando? Quem fazia o embaixador e general Lyra Tavares se expor com artigos como aquele em La Nouvelle Revue des Deux Mondes?

E tendo sido aprovado em conhecimentos do Brasil e na Teoria do Poder, dedicar-se ao estudo: de tema muito importante para um oficial de Estado Maior, a geopolítica, e das tecnologias da informação, aeroespaciais, das energias para colaborar no desenvolvimento soberano, efetivamente autônomo, do Brasil.

Pedro Augusto Pinho, administrador aposentado, pertenceu ao Corpo Permanente da Escola Superior de Guerra (ESG) e é atual presidente da Associação dos Engenheiros da Petrobrás (Aepet).

Último artigo da série iniciada dia 30 de janeiro de 2023

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