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Luciano Seixas Chagas
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Suzi Huff Theodoro

Fertilizantes: um caso de dependência ou de soberania?

mas agravada por ela. Somos fortemente dependentes das importações, desmontamos o parque produtivo nacional e temos um modelo de agronegócio i

Publicado em 18/04/2022
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mas agravada por ela. Somos fortemente dependentes das importações, desmontamos o parque produtivo nacional e temos um modelo de agronegócio intensivo no uso do NPK (nitrogênio, fósforo e potássio). Podemos ter alternativas se adotarmos políticas voltadas para ser mais eficiente no uso dos fertilizantes, ampliar o uso de compostos bio-orgânicos, remineralizadores e desenvolver tecnologias de aproveitamento das reservas existentes.

Há vários tipos de fertilizantes e políticas específicas precisam ser definidas. Os solúveis, principalmente os potássicos e fosfatados, são provenientes do tratamento de rochas ricas nesses componentes, enquanto os nitrogenados são oriundos do gás natural ou do carvão. O Brasil é perdulário no uso do NPK e pode ser mais eficientemente efetuando mudanças no manejo agrícola e pesquisas na área da agropecuária.  Do ponto de vista da produção, há recursos identificados em várias áreas brasileiras, inclusive no sal do Pré Sal que exigem soluções tecnológicas, econômicas e ambientais, portanto, requerendo forte ação do estado, especialmente no fomento da Pesquisa e Desenvolvimento. Há também as fontes alternativas de nutrientes agrícolas que precisam ser expandidos no Brasil com os bio-orgânicos e os remineralizadores
O governo lançou recentemente o Plano Nacional de Fertilizantes 2022-2050 (PNF) que...

Mercado de Fertilizantes
Fertilizantes são produtos de natureza mineral ou orgânica, natural ou sintética que têm a função de alterar os níveis de fertilidade dos solos, assegurando a oferta de um ou mais nutrientes para as plantas. Esses insumos contêm macro e micronutrientes ou moléculas essenciais ao metabolismo vegetal.

A grande maioria dos fertilizantes, os sintéticos ou naturais, são oriundos de vários tipos de rocha que possuem características mineralógicas, químicas e gêneses distintas. Essas somente podem se tornar adubos se forem ricas em nutrientes essenciais como potássio (K) e fósforo (P), cálcio (Ca), magnésio (Mg), enxofre (S), sílica (Si) e mais uma série de elementos considerados micronutrientes os quais são necessários para o desenvolvimento de plantas sadias e com qualidade nutricional.

Os fertilizantes solúveis (sintéticos ou convencionais) são produzidos a partir de rochas fosfáticas e evaporíticas com altas concentrações de P e K, respectivamente. O nitrogênio (N) origina-se do gás natural livre ou associado ao petróleo. Para obtenção desses insumos utiliza-se ácido sulfúrico, fosfórico e amônia anidro entre outros.

A China e Marrocos detêm as maiores reservas e produções de fosfatos. O Brasil ocupa a 7ª colocação e produz apenas 1,4% do total, com cerca de 2,7 milhões de toneladas. Os principais produtores de K são o Canadá, a Rússia e a Bielorrússia (67% do total mundial).  

A participação do Brasil é irrisória, muito aquém de sua demanda. A oferta de nitrogenados é mais pulverizada entre os países produtores de petróleo e gás natural. Catar, Rússia e Argélia são os principais fornecedores para o Brasil.  A seguir é possível entender, de forma simplificada, a cadeia de produção desses insumos (Figura 01)

Figura 01 - Cadeia de produção simplificada dos fertilizantes solúveis (NPK)

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Fonte: Ribeiro (2017)

Os maiores consumidores de fertilizantes no mundo são a China, Estados Unidos, Índia e Brasil. O alto consumo e a produção relativamente pequena colocam o Brasil numa posição de dependência do mercado internacional, no qual ele não é um dos players formadores de preços. Mas há outras boas possibilidades para diminuir a dependência por insumos que sustentam uma cadeia agroindustrial, extremamente forte que produz uma ampla gama de mercadorias (commodities) e alimentos.

Produção no Brasil
Ainda que o Brasil opte por seguir preferencialmente no uso de fertilizantes solúveis é possível potencializar a obtenção desses produtos a partir do desenvolvimento de reservas nacionais. Essa possibilidade é extremamente factível para o caso do K.  Além das reservas presentes no estado do Amazonas (região de Autazes, Nova Olinda do Norte e Fazendinha – com muitos requerimentos de pesquisa em poder da Petrobras) há outras ocorrências de rochas evaporíticas em diversas bacias sedimentares brasileiras.

Para se desenvolver projetos dessa natureza, será necessário superar muitos desafios tecnológicos, econômicos, ambientais e sociais, particularmente na Amazônia, em terra, e também na área do pré-sal, no mar, onde estão os maiores volumes de evaporitos potássicos do Brasil.
Por condições geológicas especiais, toda a área do polígono do pré-sal e seu entorno, tem desde pequenas almofadas, domos maiores e uma imensa coluna de sal com espessuras superiores a 2.500m. Outras ocorrências importantes estão nos estados de Al, SE, ES, RJ e SP
No que se refere ao nitrogênio, o Brasil pode alcançar uma produção próxima às suas necessidades de consumo ao retomar, revitalizar e ampliar as fábricas de fertilizantes. O fósforo também poderá ser obtido a partir de reservas distribuídas em várias regiões do País. Tais reservas não são tão expressivas, mas podem suprir parte substantiva da necessidade desse mineral. Vários tipos de rochas ricas em fósforo (apatita - fluorapatita, hidroxiapatita e a cloroapatita rara) presentes em rochas ígneas e metamórficas poderão ser exploradas de modo célere.

Para agravar a situação desse modelo agrícola caro, e insumo-dependente de fertilizantes solúveis, não existem políticas públicas consistentes que avaliem as reais necessidades de cada agro ecossistema. O receituário agronômico nem sempre considera as especificidades e necessidades dos solos. Isto torna o Brasil um perdulário no uso de fertilizantes. Quase sempre o que não é usado para o desenvolvimento das plantas é perdido na lixiviação (K), ou fica retido nas estruturas das argilas cauliníticas dos solos tropicais (P), ou é evaporado (N) contribuindo com o efeito estufa. Pergunta-se: como mudar algo (ou modelo) que aparentemente funciona e que assegura superávits na balança comercial? Existem outras opções?

Certamente: a primeira é de fácil implementação, com  o uso mais parcimonioso e eficiente dos adubos, bastando, para tanto, que conheçamos as reais necessidades e especificidades de cada solo e das culturas que desejamos produzir (soja, mandioca,  milho, feijão etc.).

Pode-se ampliar e apoiar a produção interna de fertilizantes, além de se implementar o uso de novas fontes e de outros processos/produtos derivados dos recursos geológicos, amplamente disponíveis no País.

Uma das opções são os remineralizadores (REMs) de solos baseados nos pressupostos da tecnologia da rochagem, que prevê que o uso de determinados tipos de rochas moídas (cominuidas) têm a capacidade de oferecer os nutrientes que as plantas precisam para o seu pleno desenvolvimento. Os bio-insumos são também outra boa possibilidade.  Essas duas rotas já estão regulamentadas em normas específicas, que definem as suas características e os seus mecanismos de controles.

O uso dos REMs (eventualmente denominados pó de rocha ou agromineral) foi regulamentado pela Lei nº 12.890/2013 e pela Instrução Normativa nº 05/2016 (MAPA), que definiram as garantias mínimas e os condicionantes para a sua comercialização como insumos agrícolas. Eles têm a vantagem de oferecer um amplo espectro de nutrientes para os solos e plantas, além do fósforo e potássio. As rochas apropriadas para essa finalidade têm na sua composição uma série de nutrientes oriundos dos compostos químicos (cálcio, magnésio, enxofre, silício, ferro, cobalto, vanádio, selênio, molibdênio etc.), e a maiorias deles combinados, são importantes para o desenvolvimento e sanidade das plantas ou seja, ao invés da oferta restrita de nutrientes (N, P e K), dos fertilizantes solúveis, os REMs oferecem uma maior diversidade e fortalecem os processos enzimáticos complexos, que garantem alimentos e produtos (aí incluídas as commodities soja, milho...) mais robustos em termos de segurança nutricional para os consumidores.

Outro ponto extremamente importante refere-se aos preços (sem o custo de cabotagem das importações). Os REMs podem também diminuir os custos de produção em até 50%, se comparados à adubação convencional (NPK) com tonelada precificada entre R $150,00 a 300,00. Para comparação, cada tonelada de cloreto de potássio (KCl)  custa cerca de R$6.000,00. Numa análise ainda superficial, a pesquisa nacional recomenda cerca de 4 t/ha como média padrão de uso dos REMs. Mas deve-se destacar que as dosagens irão variar de acordo com cada tipo de solo e as características químicas dos REMs.

Após a regulamentação do uso dos remineralizadores, em 2016, as empresas do setor mineral têm se enquadrado para atender as especificações estabelecidas na normativa. A produção duplica ano após ano, passando em toneladas/ano de 920 mil, em 2019, para 1.500 milhão, em 2021, e previsão de 3.000 milhões em 2022 (SGM/MME, 2021). Estimativas recentes indicam que em 2030 a oferta chegará a 75 milhões. Hoje há 29 empresas, em 9 Estados, que podem comercializá-los, conforme mostrado na Figura 02.

Figura 02 – Localização das empresas que possuem registro no MAPA para comercializar REMs

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Fonte:  Theodoro, S. H. Manning, D. A. C; Ferrão, F.  R;  Almeida, G. R (2022) a partir de dados do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento. Disponível: https://institutobrasilorganico.org/atuacao/mapa-de-remineralizadores/

Considerando um aumento potencial, tanto no que se refere à diversidade de tipos de rochas, como na ampla distribuição espacial, pode-se considerar que esta rota tecnológica expandirá a oferta de insumos em todas as regiões, para diferentes perfis de agricultores (familiares e empresariais). Isto aumenta a disponibilidade de ofertas locais/regionais, diminuindo custos de aquisição e transporte dos produtos.

Adicionalmente, a existência da grande quantidade de minerações e pedreiras (cerca de 9.000), em operação no Brasil, garantirá a oferta maior de novos REMs, desde que atendam as especificações técnicas e normativas. Muitos dos seus subprodutos ou coprodutos poderão ser usados para essa finalidade. Estocar tais produtos seria uma opção de solução para atender a demanda de fertilizantes. Porém, tais produtos devem passar por processos de avaliação agronômica para qualificar as respectivas eficácias nos usos na agricultura.

Também as análises mineralógicas e geoquímicas são indispensáveis para caracterização dos produtos, de forma que eles atendam as especificações da IN 05/2016, bem como para se reduzir riscos ambientais. E tudo isso depende da competência governamental hoje difusa e muito fragmentada. De forma simples a tabela a seguir exibe as vantagens e as desvantagens dos fertilizantes solúveis (NPK) e os REMs são:

FONTES CONVENCIONAIS - NPK                                             REMINERALIZADORES
Alta solubilidade                                                                       Baixa solubilidade
Altas concentrações                                                               Baixas concentrações
Oferta reduzida de nutrientes                                              Ampla oferta de nutrientes
Efeito residual breve/ausente                                              Efeito residual prolongado
Custos elevados                                                                      Custos reduzidos
Em grande parte, importados                                                    Produto nacional
Salinização dos solos                                                      Neoformação mineral nos solos
Fortalece a planta                                                  Fortalece o sistema solo-planta-microrganismos
Emite gases formadores do efeito estufa (NOX e CO2)              Captura e armazena CO2

Fonte:  Theodoro, S. H. (2022)

Para viabilizar esse cenário de oferta segura de insumos, será necessário estabelecer políticas públicas precisas que garantam a produção e uso dos remineralizadores, inclusive apoio econômico, logístico e a continuidade das pesquisas. Cabe ao novo governo investir em P&DI para equacionar o problema e dar autonomia em determinadas áreas como fertilizantes e energia, entregues pelo governo de viés econômico absolutamente financeiro a outrem ou vendidos por valores irrisórios, que muito contribuem com o agravamento da crise atual.

Não vê quem não quer energia e fertilizantes por preços absurdos e o povo arcando com as consequências, enquanto o governo, segue vendendo ativos estratégicos de energia e fertilizantes, justo, também, nas áreas onde impera o agronegócio. Pode?

Suzi  Huff Theodoro (autora) – Profa Universidade de Brasília
Luciano Seixas Chagas (coautor) – Consultor independente em geologia e geofísica

 

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