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Pedro Augusto Pinho
Administrador aposentado, foi membro do Corpo Permanente da Escola Superior de Guerra (ESG) e Consultor das Nações Unidas (UN/DTCD).

O caso Evergrande e suas lições

(RPC), para que não seja erroneamente tratado como outra das constantes crises que o sistema financeiro vem provocando desde 1987 pelo mundo.</p

Publicado em 23/09/2021
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(RPC), para que não seja erroneamente tratado como outra das constantes crises que o sistema financeiro vem provocando desde 1987 pelo mundo.

No período 1986-1991 houve a crise imobiliária japonesa, que muito prejudicou sua economia. Observemos aquela crise a partir de regras estabelecidas pelo Banco de Compensações Internacionais (BIS), instituição sediada na Suíça dirigida por representantes de Bancos Centrais de diversos países e alguns membros ex-officio.

De acordo com o BIS, o capital de um banco deve ser constituído por recursos de duas origens: (1) os fundos dos acionistas e os lucros retidos, e (2) das reservas para perdas com empréstimos e por “ativos ocultos”. Quarenta e cinco por cento dos ganhos de capital não realizados em ações podem ser contabilizados como “ativos ocultos”.

As desregulações promovidas nos sistemas financeiros, em 1985, acarretaram a indesejável competição por depósitos que levaram ao aumento das taxas de juros. Durante a alta do mercado de ações, os bancos japoneses emitiram novas ações que lhes permitissem aumentar seus ativos. Entre 1987 e 1989, os bancos municipais emitiram seis trilhões de ienes em ações e títulos relacionados a ações. Quando o mercado de ações de Tóquio quebrou, em 1990, esses bancos tiveram dificuldade em manter o índice de 8% de capital exigido pelo BIS.

Em 1990, os bancos japoneses detinham cerca de 22% das hipotecas japonesas. Além disso, muitos dos empréstimos para pequenas empresas eram garantidos por propriedades e 75% dos empréstimos dos bancos direcionavam-se para pequenas empresas.

Havia outros intermediários financeiros no mercado de empréstimos garantidos por imóveis. A Housing Loan Corporation, uma agência governamental, oferecia hipotecas subsidiadas com taxas de juros. Às vezes, algumas grandes corporações empregadoras forneciam empréstimos hipotecários subsidiados. Também atuavam empresas de leasing, empresas de financiamento ao consumidor e empresas intermediárias neste mercado hipotecário, mas essas instituições dependiam, em grande parte, dos bancos para seu financiamento, de modo que representavam efetivamente uma participação indireta dos bancos japoneses.

De acordo com Christopher Wood, “The Bubble Economy: Japan’s Extraordinary Speculative Boom of the ’80’s and the Dramatic Bust of the ’90’” (The Atlantic Monthly Press, 1992), quando a China pediu conselho ao Japão a respeito de como privatizar suas empresas públicas, os japonês aconselharam a adiar a privatização (!).

Vejamos o caso Evergrande.

É indispensável compreender que a RPC é uma economia socialista de características próprias. Ela não age como uma economia inteiramente dominada pelo Estado nem pelo mercado. A economia chinesa é uma economia planejada setorialmente e regionalmente, dentro das linhas gerais de um país comunista que tem como meta prioritária atender seus habitantes, o povo chinês.

Transcrevo do artigo “Não tanto Evergrande”, de Michael Roberts (AEPET, 20/setembro/2021): “A morte de Evergrande é um reflexo dos perigos da especulação imobiliária descontrolada no setor capitalista da economia chinesa. Evergrande depende muito dos clientes que pagam pelos apartamentos antes da conclusão dos projetos. O modelo de propriedade Evergrande é essencialmente um esquema Ponzi, onde a empresa coleta dinheiro da pré-venda de um número cada vez maior de apartamentos, além de centenas de milhares de investidores individuais e usa o dinheiro para financiar vendas adicionais, acelerando a construção em andamento e financiamento de adiantamentos. Como qualquer Ponzi, funciona enquanto estiver acelerando. Mas quando o mercado desacelera, os fluxos de entrada de caixa começam a ficar para trás no arco crescente de demandas de caixa. Evergrande agora tem cerca de 800 projetos inacabados e cerca de 1,2 milhão de pessoas esperando para se mudar”.

O nome “Ponzi” é devido a Carlo Ponzi (Lugo, 1882 – Rio de Janeiro, 1949), um estelionatário italiano radicado, nos Estados Unidos da América (EUA), conhecido por ter elaborado a maior fraude do século XX, estimada em 50 bilhões de dólares estadunidenses. “Esquema Ponzi” é uma operação fraudulenta e sofisticada de investimento, do tipo esquema em pirâmide, que envolve a promessa de pagamento de rendimentos anormalmente altos aos investidores à custa do dinheiro pago pelos investidores que chegarem posteriormente, e não pela receita gerada por qualquer negócio real.

Pelo visto, os chineses não consideraram o conselho japonês. Deixar entrar as finanças, numa economia desregulada, ou de mercado, é aceitar a trapaça, algum tipo de burla, de fraude, que as finanças praticam usualmente no seu modelo concentrador de renda.

Pode também ser visto como o erro de deixar com o mercado a questão habitacional, embora as propriedades da Evergrande, majoritariamente, serem comerciais.

O projeto habitacional é das grandes iniciativas para o desenvolvimento econômico e social de uma nação, principalmente as que estão em crescimento com melhoria do nível de vida.

Observem, caros leitores, o caso brasileiro. Há enorme déficit habitacional, visível nas periferias das cidades, nos moradores de rua e nas favelas e habitações semelhantes existentes em todo País.

Também as medidas contra a proteção e valorização do trabalho, adotadas nos últimos anos, com a economia sob as ordens do sistema financeiro, fez explodir o desemprego, principalmente entre os de menor habilitação. Um projeto estatal que reduzisse o limite orçamentário de pagamento de juros para investir na urbanização, saneamento básico e construção imobiliária, não só dinamizaria a economia e geraria emprego, como melhoraria o nível de vida dos brasileiros.

Michael Roberts conclui o artigo citado com a seguinte consideração: “O tamanho e a influência crescentes do setor capitalista na China estão enfraquecendo o desempenho da economia e aumentando as desigualdades. Na minha opinião, a economia chinesa agora é forte o suficiente para não depender de investimento estrangeiro ou de setores capitalistas improdutivos para crescer. Aumentar o papel do planejamento e do investimento liderado pelo Estado, a principal base do sucesso econômico da China ao longo dos 70 anos da República Popular, nunca foi tão atraente”.

É também um excelente conselho para o Brasil.

Pedro Augusto Pinho, administrador aposentado.

Fonte: Brasil Popular

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