O Nacional Trabalhismo hoje
Em março de 1993, em plena efervescência do neoliberalismo entre os brasileiros, o gênio Darcy Ribeiro escreveu:
“o problema político reside em que grande parcela do povo é suscetível de ter a cabeça feita pelas elites, com uso abusivo da mídia e da corrupção eleitoral” (Darcy Ribeiro, “Udenismo e Parlamentarismo”, Carta’ 6, Senado Federal, Brasília, 1993).
Inventar o passado, com as farsas das narrativas da história, justifica e explica o presente, garantindo o futuro. Mas quem pode realizar este feito senão os que detêm os instrumentos do poder?
Os estadunidenses jamais encontrarão que, em 4 de março de 1861, Abraham Lincoln transigiu com a escravidão e desrespeitou a Constituição para garantir sua vitória.
O Brasil vive desde 1980 o processo de desfazimento do Estado e da própria Nação. E, na base desta alienação, está a invasão ideológica do neoliberalismo.
O nacional trabalhismo tem sua origem nos positivistas gaúchos, muitos deles militares, que foi se consolidando, aprofundando, ampliando com as contribuições de pensadores e políticos brasileiros, e chega ao poder com Getúlio Vargas, na vitoriosa Revolução de 1930.
A mais característica das iniciativas do nacional trabalhismo foi colocar, tão logo ocupa o governo, a obrigação do Estado com a educação e a saúde, até então inteiramente privatizadas no Brasil.
O que vemos hoje é o retrocesso do Brasil ao tempo da 1ª República, talvez do Império, ou mesmo do Reino Unido a Portugal e Algarve. O Brasil privado nas atribuições que, para atingirem todos brasileiros, sem qualquer exclusão ou discriminação, devem ser públicas. Só podem ser efetivas se forem públicas.
A saúde para existir, a educação para se comunicar.
É preciso então que o Estado Brasileiro tenha recursos para desempenhar suas funções.
E ter recursos é controlar e saber usar, para nosso País, as riquezas brasileiras, cuidando, principalmente, da fonte produtora de todas as riquezas que é a energia.
O que as mídias, sob controle estrangeiro, com mínimas exceções, omitem hoje é que não há sistema autônomo numa sociedade, há um conjunto de subsistemas, integrados, formando o todo único, que distingue a sociedade brasileira, da argentina, da angolana, da estadunidense, francesa, chinesa e de todas demais.
Que também não existe sistema que atenda a todas sociedades, não existe qualquer tipo de globalização sem que haja subordinação. A autonomia é o encontro da condição única com a vontade específica, ou seja, da particularidade do território com a cultura nacional, a que foi nele formada.
Impor a baixa estima é condição de dominação, e um país que só teve seu Estado Nacional há menos de um século, sempre foi uma colônia de países e ideologias estrangeiras, precisa se conhecer e se valorizar.
Estas são as premissas que antecedem forma e modelos de governos. E se formou aqui no primeiro estado realmente nacional que existiu entre nós: o Governo Provisório da Revolução de 1930, sob a condução de Getúlio Dornelles Vargas. E ele se constituiu como um Estado Nacional, ou seja, não era um estado colonial, seja pela direção de outro país ou pela aplicação de ideologia importada.
Suas bases seriam a defesa na soberania nacional e o trabalho, e não a propriedade, a especulação, como fonte de produção de sua riqueza.
Tínhamos então o Estado Nacional Trabalhista, um Estado com ideologia própria.
Este Estado num mundo de impérios, de colônias, de disputas ideológicas, foi desde logo atacado. Uns por ignorância, não entenderam ser brasileiros e as vantagens e responsabilidades desta condição; outros por terem assimilado a pedagogia colonial, tantos anos o Brasil fora colônia, de Portugal, da Inglaterra, que eles não imaginavam poder atingir a maioridade.
Mas outros, não poucos, eram, efetivamente, gestores no Brasil de interesses estrangeiros, eram servidores das vantagens para alienígenas ou, na expressão magnífica de Darcy Ribeiro, queriam que os brasileiros fossem o “proletariado do mundo”, trabalhassem pelo mínimo para transferir o máximo do obtido para o exterior.
Estes últimos, agregando os ignorantes, imaturos e covardes, coordenaram a volta do Brasil à Colônia. E eles venceram a partir de 1980. Desde então, com os cuidados para evitar perdas, dando passos cuidadosos, ora mais arrojados ora apenas para manter o já conquistado, o Brasil vem retrocedendo até a despersonificação em que se encontra atualmente.
Quem é capaz de explicar o sentido do nacional trabalhismo, hoje?
Trabalhismo é construção nacional brasileira.
Getúlio Vargas, no mesmo mês em que é empossado Presidente do Governo Provisório, cria o Ministério da Educação e Saúde e o Ministério do Trabalho, Indústria e do Comércio — as condições básicas para cidadania.
A percepção do trabalhismo já vinha sendo construída por pensadores gaúchos, no qual se destaca o jovem Alberto Pasqualini. Não era simples intermediação entre patrões e operários, mas a base moral e ideológica que promovesse a cooperação entre as classes para o bem-estar de toda população tendo por base o trabalho.
Este trabalhismo dá fundamentação política ao partido que Vargas criaria: Partido Trabalhista Brasileiro, ou seja, o trabalhismo de raízes e dirigido aos brasileiros. E, desde logo, sofre a pressão antagônica dos capitalistas e dos comunistas; os primeiros por questões econômicas e de poder, os comunistas por verem uma ideologia nacional, não materialista, disputando a mente, a opção política dos operários brasileiros.
É importante esclarecer que o trabalhismo não cuidava apenas do trabalho e dos trabalhadores, ele impulsionava a geração de emprego, o estudo, o desenvolvimento pessoal e da sociedade. Também cuidava do desemprego, da assistência aos diversos tipos de desvalidos, ao amparo à velhice, à infância e à juventude desprotegidas, com aposentadoria, pensões, orfanatos e asilos. Sempre como função do Estado.
É importante enfatizar que trabalhismo significa que não é o rentismo, não é o financismo, não é a especulação financeira, não é a propriedade fundiária que irá definir o rumo do País, é o trabalho em todas as esferas, do comerciante em sua loja, do taxista em seu carro, dos operários nas fábricas, dos profissionais em seus consultórios e escritórios, os gerentes e os contínuos, enfim de todos que tem seu rendimento pelos trabalhos que executam, sejam inclusive de natureza artística, esportiva e lúdica.
Obviamente não exclui o verdadeiro empreendedor, não a fuga aos encargos trabalhistas dos MEI, mas o que coloca seu dinheiro para desenvolver um projeto produtivo, para comprar e vender, para arriscar ganhar e perder.
Consequentemente o modo de vida da sociedade, que está retratada na estrutura organizacional do Estado, deve espelhar esta prevalência do trabalho nas definições da vida nacional.
Hoje o que se vê é a humilhação do trabalho e a glorificação da especulação e do ganho sem risco do capital financeiro.
Façamos rápido resumo do que inclui o NACIONAL TRABALHISMO na gestão do Estado.
As receitas do Estado destinam-se primordial e fundamentalmente para suas duas áreas de atuação: a Preservação da Soberania e a Construção da Cidadania. O Nacional Trabalhismo está em ambas.
Na Preservação da Soberania pela Defesa Nacional, trabalho de diplomatas, militares, pesquisadores, tecnólogos e industriais que desenvolvem e produzem equipamentos e materiais para a Defesa Nacional. Também na Soberania, o desenvolvimento dos potenciais do território para a produção de riqueza, primeiramente para o uso e consumo do povo brasileiro, e depois para exportação e geração de divisas para as trocas internacionais. E na Soberania estão igualmente serviços, sendo muito importante o transporte nacional, desenvolvendo todas as opções ou modais, fluviais, lacustres, marítimos, ferroviários e rodoviários, buscando a máxima eficiência e menores custos.
Na Construção da Cidadania pelo trabalho de pedagogos, professores, e todos os auxiliares para o ensino, a pesquisa e o desenvolvimento de habilidades de toda natureza, o que constitui a Educação. A Saúde, com os profissionais para prevenção e tratamento de todos os males, físicos e psicológicos, incluindo a engenharia médica e a produção farmacêutica. Na Habitação com os projetos urbanísticos, a proteção ambiental, as construções de vias urbanas, e imóveis para todos os destinos que a sociedade necessita. É importante salientar que a mobilidade urbana é responsabilidade dos estados em quase todo mundo dito desenvolvido. Na Segurança que preferimos a designação de Garantia dos Direitos, onde atuam as atividades de justiça e de polícia.
E, também na área da Construção da Cidadania, a comunicação em todos os níveis e para integração de todos, para informação e sugestão, para queixas e reclamações, todas garantidas pelo Estado a fim de que se evite a doutrinação ideológica e a censura privada que se observa hoje no Brasil.
Há um absurdo rondando o Brasil, além de todas estas ameaças à Soberania e à Cidadania, ou melhor, que atinge simultaneamente a ambas: a privatização dos Correios, da Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos (ECT). É uma empresa que detém um dos maiores patrimônios da União: aviões, navios, trens, imóveis em todo território nacional e um serviço fundamental para a própria defesa nacional. Defender a atuação do Estado, nas áreas de Soberania e de Cidadania, é um projeto Nacional Trabalhista.
Os inimigos do Brasil, rentistas, financistas especuladores, neoliberais e comunistas, dirão que este democrático projeto é totalitário, que é estatizante, que não permite a liberdade de colocar seus ganhos especulativos nas contas em paraísos fiscais, fraudando a tributação e empobrecendo o País. Mas não é para eles, é para o povo trabalhador que se dirige o Nacional Trabalhismo.
Pedro Augusto Pinho, administrador aposentado, presidente da AEPET
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