demonstrando compreensão bem limitada sobre as ações das populações americanas pré-colombianas e de outras contribuições à formação das sociedades americanas, afirma que “a única população da América que teve significação foi a de origem europeia. As instituições que caracterizam o Novo Mundo são fundamentalmente aquelas da Europa” (European Background of American History, 1300-1600, Prefácio do Autor, Harper & Brothers, New York e Londres, 1904) .
O continente, colonizado por europeus, absorveu a influência da metrópole, quer no sentido de acolher vícios e conhecimentos, quer no sentido de se lhes opor. Mas é importante saber quem eram estes europeus.
Os colonizadores estavam recém saídos da Idade Média; a colonização das Américas tem início no século XV. Muitos dos costumes e valores medievais persistiam naquelas sociedades de onde eles vieram. É fundamental, para que não nos iludamos, conhecer o que Charles Ralph Boxer, pesquisador historiador da expansão portuguesa, ressaltou:
“A Europa medieval era uma escola cruel e dura, e as delicadezas da civilização não eram cultivadas em Portugal nem em qualquer outro país. Uma alta e pequena nobreza turbulenta e traiçoeira; um clero ignorante e desleixado; camponeses e pescadores embrutecidos e uma população urbana do tipo da população lisboeta, descrita por Eça de Queiroz, cinco séculos mais tarde, como “plebe beata, suja e feroz”. Tais eram as classes de que saíram os pioneiros, os descobridores e os colonizadores” (O Império Marítimo Português, Edições 70, Lisboa, 2ª edição, 1991).
Os Estados americanos, ao norte, ao centro e ao sul, foram definindo seus espaços políticos com as populações originárias e as migrações. Estes tiveram a enorme influência dos africanos, de diversas origens étnicas, trazidos como escravos. Ficará difícil estudar os poderes, os governos e as oposições, que se instalaram pelas Américas, sem a visão realista de suas populações, e assim refletir sobre os movimentos políticos.
Dito isso, vamos cuidar do que verdadeiramente nos interessa, o Brasil.
A compreensão de “Estado do Brasil” tem início em 1549, com a chegada a Salvador (Bahia) do Governador Geral Tomé de Souza, e do ouvidor-geral, do provedor-geral, do capitão-mor da costa e do alcaide-mor. Ou seja, da estrutura de Governo.
Tínhamos definidos um Governo e o Poder, que o mantinha e dele se valia - o Império Português, e também a população para arcar com todos os ônus. Naqueles dias, apenas a população originária, que se recusava ao trabalho escravo, podia ser chamada “oposição”. E como veremos em muitos momentos de nossa história, sem a consciência do Poder que determinava o sistema escravagista, isto é, qual o Poder a enfrentar.
Se toda história é a narrativa dos vencedores, a do Brasil, até muito recentemente, mais do que esta fraude, foi uma propaganda dos Poderes que sucessivamente nos dominaram. Temos que caminhar com cuidado nesta busca pelas oposições.
Dividiremos esta procura em dois momentos. O período do Poder Português, entre 1550 e 1800, em datas aproximadas, onde a independência formal e a construção de uma cidadania nacional serão os objetivos mais importantes.
O segundo momento é mais sutil, pois, tendo a formal independência, éramos submetidos aos interesses estrangeiros do Poder Inglês, todo século XIX até 1930, do Poder Estadunidense, entre 1930 e 1990, e a partir daí até nossos dias pelo Poder do Sistema Financeiro Internacional, que abrevio denominando Banca.
Sob o Poder Português
As distinções das classes sociais, naquele início do Brasil, são apresentadas por Décio Freitas (Palmares A Guerra dos Escravos, Graal, RJ, 2ª edição, 1978), e nos ajudam a entender nosso País e a maior oposição que já conhecemos.
Não poderia generalizar para todas as colônias, nem todos colonizadores, mas no Brasil temos observado que há uma classe, fora do governo, que representará o interesse do Poder, e nem sempre é a classe que mais se enriquece com o sistema implantado. Mas esta posição de classe articuladora dos ganhos do Poder lhe dá autoridade para agir ao arrepio das leis e com absoluta impunidade.
Vimos que os colonizadores estavam recém saídos do feudalismo, onde a propriedade fundiária foi a mais expressiva forma de poder.
O modelo econômico que sustentou esta fase foi o agrário exportador, ainda hoje muito significativo no Brasil. Os senhores de terras (engenhos) formavam, assim, uma verdadeira aristocracia sem corte. Constituíam, com o governo dos portugueses (militares e funcionários civis) no Brasil e do clero, o alto da estratificação da população livre. Seguiam-se os “lavradores de partido”, arrendatários dos senhores de engenhos, e os ricos mercadores, traficantes de escravos, importadores e exportadores, que, não gozando situação social semelhante a dos senhores de terra, eram, no entanto, seus credores e de toda a alta cúpula.
Na base da pirâmide dos homens livres estavam os artesãos, os “oficiais mecânicos”, os “industriais”. Os pobres livres só se distinguiam dos escravos por não poderem ser comprados e vendidos. Décio Freitas usa a palavra que será consagrada pelo arguto sociólogo Jessé Souza: ralé (Jessé Souza, A Ralé brasileira Quem é e como vive).
Os índios estavam sobre tutela da Igreja Católica, o que também não lhes conferia cidadania. Eram escravos, como os negros. Dentre estes últimos, havia a distinção de “ladinos”, que tinham alguma aptidão: barqueiros, oleiros, vaqueiros, ferreiros etc, e os nascidos no Brasil, os “crioulos”.
Escreve Décio Freitas: “as Ordenações Filipinas regulavam casuisticamente os castigos, mas os amos brasileiros criaram formas novas e mais refinadas” para as penalidades.
A região dos Palmares estende-se em terras altas ao sul de Pernambuco, pelo atual Estado de Alagoas. Era uma região de terras férteis, clima ameno, mas de difícil acesso. Os primeiros fugitivos chegaram ainda no século XVI, pois, em 1597, eram relatados pelo padre Pero Lopes, jesuíta, como “inimigos” que “dão muito trabalho”. Em 1797, mais de dois séculos após seu surgimento, descendentes palmarinos eram descritos por funcionários da coroa como acolhedores de “pessoas indigentes e criminosas que escapavam das penas se escondendo nas matas”, pois abrigavam os perseguidos e lhes forneciam meio de subsistência.
Nosso objetivo é de buscar as oposições. Neste aspecto não houve movimento mais longo e profundo em nossa história. Transcrevo o final do estudo magnífico de Décio Freitas: “a luta palmariana permite uma compreensão desmistificadora da história brasileira, discernindo claramente as classes e seus interesses. Desmascara falsos heróis e descortina os verdadeiros heróis. Ao mercenarismo e ao oportunismo de Henrique Dias, contrapõem-se a honradez e a valentia de Zumbi. Na historiografia dos dominadores, Palmares perpassa como episódio marginal escassamente significativo; na dos dominados, brilha como um dos momentos de maior grandeza. Os palmarianos vivem na consciência e no coração dos oprimidos e, como mensageiros de uma sociedade nova, conclamam do fundo da história: Prossigam!”.
Neste período iremos encontrar oposições em Minas Gerais - 1720, com Felipe dos Santos; 1736, com Pedro Cardoso e sua mãe, Maria da Cruz; e em 1789, com a Inconfidência Mineira. Todos três episódios tendo como motivação a rejeição aos tributos cobrados por Portugal. Cada um apresentando uma alternativa de eliminá-los, muito mais do que a constituição de um novo País, livre e sem escravos, ou seja, de homens livres.
Já a Conjuração Baiana ou Revolta dos Alfaiates ou dos Búzios (1798) houve o projeto de País, inspirado nos ideais que aqui chegaram da Revolução Francesa (1789). Esta oposição congregou escravos e libertos, mulatos, trabalhadores, médicos e religiosos. Propunha a abolição da escravatura, a proclamação da república, a abertura dos portos, fim de preconceitos e melhores salários e menores impostos. Foi um movimento oposicionista.
Outros movimentos registrados na história poderiam ser denominados, simplesmente, de reivindicativos de melhorias materiais ou sociais: dos Irmãos Beckman (1684), no Maranhão; dos Emboabas (1709), em Minas Gerais; e dos Mascates (1711), em Pernambuco.
Mas todos, dos Palmares ao da Conjuração Carioca (1794) - adiante descrito -, foram sempre combatidos ferozmente, com prisões, torturas e mortes, com ódio e a mais forte e ampla repressão.
Foi-me impossível, vendo convocações da “oposição de 2018” para “watch parties” não relembrar a Conjuração Carioca. Um grupo de intelectuais, reunidos na Sociedade Literária do Rio de Janeiro, para exibirem, uns para os outros, suas sutis produções de “ideias avançadas”, tipo civilização contra barbárie, liberdade sexual contra homofobia, sem que dali nascesse qualquer projeto de luta social ou de incentivo às necessárias e profundas transformações nacionais e políticas.
Mas, nem por isso, escaparam de uma temporada pouco estimulante “au frais du roi”.
As empreitadas de Napoleão Bonaparte modificaram, ou melhor diria, aceleraram as modificações no Poder Europeu. Praticamente por todo século XIX, até 1930, o poder dominante no Brasil será do Império Inglês e seu modelo mercantil-financeiro. Analisaremos em outros artigos a oposição no Brasil formalmente independente.
Pedro Augusto Pinho, avô, administrador aposentado
Comentários
Ainda que alguns comentários demonstrem que há indivíduos que pensam(???) diferente, creio que seus autores não sejam dignos de crédito.
Parabéns Pedro Pinho. Continue sempre com essa garra. A verdade sempre faz bem e liberta.
Agora vem dar uma de santa do pau oco.
Cambada de petistas trapalhões e sugadores do sangue do povo brasileiro.
Fora aepet.
Pretende, de forma desonrosa, atacar os portugueses, e esquecem das elites africanas que entregavam seus conterrâneos.
Zumbi é mais uma invenção da esquerda!
Era déspota, tinha seus próprios escravos e ainda mandada executar os negros que tentavam fugir do quilombo. Muito longe de ser honrado.
Era o Maduro daquela época!
COM SUAS AULAS ENTENDEMOS COMO FOMOS PARAR NA SITUAÇÃO ATUAL.
Conhecer a história é necessário.