Na última quinta-feira (24), a CPI da Petrobrás, em andamento na Assembleia Legislativa do RJ (Alerj), recebeu a advogada da FNP, Raquel Sousa, cujo depoimento foi extremamente rico e fundamentado sobre as ações que vem promovendo contra o desmonte da Petrobrás. Segundo a advogada, a FNP já ajuizou dez ações populares, cada uma questionando um ativo que está sendo colocado à venda. "Conseguimos oito liminares, uma foi negada e tem uma que ainda está em análise. A última liminar que obtivemos foi suspendendo a venda da TermoBahia à empresa francesa Total, que tem condenações em três países por corrupção", afirmou.
Segundo ela, o Tribunal de Contas da União (TCU) também está questionando a venda desses ativos. Diz a doutora Raquel: “O presidente da Petrobrás lançou um plano de desinvestimento através do qual pretende arrecadar US$ 15 bilhões. Mas esse plano sofre de problemas que o tornam imensamente lesivo ao patrimônio público brasileiro”, alertou a jurista, que tem conseguido impedir legalmente algumas iniciativas entreguistas da atual diretoria da empresa.
Como primeiro exemplo, ela frisou que todas as operações estão sendo realizadas sem licitação, através de convites a compradores escolhidos a dedo e de forma obscura, fulminando a competitividade que é legalmente exigível e sem observar os preceitos da lei 9.401, de 1997.
“As reservas do campo de Tartaruga Verde, por exemplo, iriam ser vendidas por valores irrisórios. O campo de Baúna também muito valioso, estava sendo vendido por valores também irrisórios. O campo de Carcará, um dos melhores da Bacia de Santos, por ter uma pressão maior que as demais, tem uma produção muito mais barata porque retarda a recuperação secundária (injeção de água ou gás). Esse campo tem uma reserva de 2 bilhões de barris na área sul - segundo o geólogo Luciano Chagas, consultor da Barra Energia, uma das sócias de Carcará, o campo tem possibilidade de mais um bilhão de barris na sua área norte. Parente vendeu para a Statoil, empresa norueguesa, 66% do campo, que equivale aproximadamente a 2 bilhões de barris por US$ 2,5 bilhões, ou seja, US$ 1,25 por barril”.
Raquel disse ainda que foram vendidos 35% do campo de Lapa e 22,5% de Iara para a Total por menos de US$ 2 o barril. “Parente dizia que iria vender os ativos menos importantes para financiar a produção dos melhores campos do pré-sal, como se explica vender Carcará, Iara e Lapa, que são os melhores campos do pré-sal?”, pergunta Raquel.
A venda desses últimos foi para a empresa Total, que é uma junção da Total francesa, da Fina belga e da Elf francesa. Analistas dizem que este conglomerado foi comprado pelo dono do cartel, família Rotschild. O argumento do senhor Parente é que não se trata de uma venda, mas sim uma parceria estratégica.
“O que significa parceria estratégica? A Petrobrás ganhou três prêmios internacionais como a melhor empresa em tecnologia de águas profundas. E a Total? Não temos notícia de que tenha ganho algum prêmio. O que sabemos é que a Total é uma empresa mundialmente condenada por corrupção de políticos para aquisição de campos e reservas de petróleo por preço vil”.
A afirmação foi feita com base em fatos ocorridos no exterior. Nos Estados Unidos, a Total subscreveu acordo de leniência reconhecendo a prática de crimes de corrupção por seus executivo, pagando multas que somaram US$ 398,5 milhões, segundo o Departamento de Justiça americano.
A empresa foi também processada na França, que solicitou que a Total, seu presidente e diretor executivo respondam ao tribunal penal por violação das leis francesas, entre as quais a de atividades de suborno no exterior.
A Justiça italiana também decretou a prisão de executivos da Total e políticos locais envolvidos na aquisição do campo de Basilicata, o maior campo terrestre da Europa.
A Total também foi condenada pela Justiça francesa pela corrupção de funcionários do governo Sadam Housen no Iraque. “Portanto, a parceria Total-Parente merece uma car wash, ou seja, uma operação lava jato internacional”, comenta o vice-presidente da AEPET, Fernando Siqueira.
Raquel também criticou a venda do complexo petroquímico do Suape, na qual a Petrobrás gastou R$ 9 bilhões e agora Parente a vendeu por US$ 385 milhões, justamente no momento em que a empresa começa a dar lucro. Ela mostrou ainda um conjunto de ações judiciais impetradas por ela em nome da FNP, entre as quais teve sucesso interrupção da venda de Bauna e Tartaruga Verde, foi cancelada, bem como a venda da BR Distribuidora. Outras ações estão a caminho do STJ.
A advogada considera absurdo o fato de o Tribunal de Contas da União (TCU), que liberou o processo de venda de ativos após o ter condenado explicitamente. “É como se a polícia constatasse que bandidos arrombaram um caixa eletrônico e dissesse para os ladrões, já que arrombaram o caixa, podem levar o dinheiro”, comparou, lembrando parecer do próprio TCU sobre a forma como os ativos estão sendo vendidos: “... pode implicar conseqüências indesejadas ao processo de desinvestimento, macular as diretrizes fundamentais do procedimento licitatório, além de potencializar os riscos de ocorrência de atos ilícitos, como o direcionamento e o ajuste de preços das vendas, de modo similar às práticas desvendadas pela operação lava jato”
Raquel observou que o procurador Carlos Fernando dos Santos Lima, da força tarefa da lava jato, admitiu que mesmo com as investigações em curso é possível haver esquemas de corrupção em funcionamento na Petrobrás. Diz ele: “Fica claro que há muito trabalho ainda a ser feito (pela lava jato) na própria Petrobrás. Nada garante que tenhamos hoje uma empresa totalmente limpa de corrupção”.
No fim, ela questionou a ausência de Pedro Parente, que não acatou o convite da CPI para prestar esclarecimentos e apresentar documentos, podendo agora ser intimado a fazê-lo. “O esvaziamento do diretor João Elek e seu posterior afastamento podem levar a crer que estava descobrindo fatos inconvenientes. Também a recusa do senhor Pedro Parente em comparecer à CPI da Alerj como convidado e a negativa de fornecer documentos dos processos de venda como o da NTS evidenciam que o procurador da lava jato está correto no seu raciocínio”.